Dá para comprar a Fidelidade do Cliente?
A fidelidade do seu cliente se compra? Se sua resposta for Sim, a que preço? Ou será que a fidelidade se conquista?
Leonardo Barci
Publicado em 8 de julho de 2019 às 04h00.
Última atualização em 8 de julho de 2019 às 09h03.
Na minha última passagem pelo aeroporto me lembrei que tinha pontos na loja de chocolate de marca. Me lembrava mais ou menos minha pontuação no programa da marca e a referência para um possível resgate. Como no dia seguinte eu tinha um par de reuniões coladas, resolvi juntar duas coisas: um estoque de energia extra somado a uma barra grátis promovida pelo programa.
Fiz a compra (que foi um pouco mais do que eu esperava gastar, diga-se de passagem), pedi para que a pessoa pontuasse no programa e pimba: “Ah, o Sr. já tem pontos para resgatar no programa.” Qual não foi minha surpresa quando ao pedir o prêmio, a moça me disse: “Hum, o Sr. tem 150 pontos, eu só tenho produtos hoje para resgate de 300.”
Por conta da profissão, mas também pela diversão em si, estou inscrito em um número infindável de programas de milhagem e fidelidade. Da cia aérea ao café ao lado da empresa, meus dados circulam muito além da minha capacidade de rastreamento.
Principalmente por conta da tecnologia (leia-se internet e aplicativos celular) qualquer empresa pode oferecer hoje o acúmulo de pontos. Acúmulo, entretanto, não significa um programa estruturado de pontos, de fidelidade ou mesmo de relacionamento. Sim, no jargão do mercado todos podem significar a mesma coisa, mas um olhar mais atento mostra que não necessariamente.
Já tratamos em vários posts aqui no blog sobre estes programas, mas hoje fico com a parte final, o momento onde um programa de pontos realmente se concretiza: o resgate.
Embora eu tenha participado da criação de vários destes programas, hoje tenho algumas restrições sobre a real validade deles para uma empresa que quer entrar nessa ‘avenida’. Calma, não que eu tenha me arrependido do que fiz (bem, em alguns casos, talvez sim), mas a verdade é que virou uma arma de destruição em massa que raramente mata um pernilongo.
Para que você leitor/a possa tenha uma rápida referência, historicamente o primeiro programa de pontos foi criado pela United Airlines em 1972. Eles nasceram com o conceito de Frequenty Flyer. A ideia na época era bastante simples: haviam cadeiras vazias nos voos, haviam clientes que viajavam muito, havia uma busca mútua de reconhecimento (entre empresa e cliente) e essa era aparentemente a forma mais barata de chegar a alguma conta positiva para ambos. Viu-se que esses programas eram um negócio em si, e decidiu-se separar o programa da cia aérea. O mesmo movimento se deu no Brasil em épocas distintas com os programas das extintas Varig-Rio Sul e Tam, tornando-se, respectivamente, Smiles e Multiplus.
Esse mercado cresceu, floresceu um bocado, e o tão falado ponto passou a ter o valor de moeda. No Brasil isso se tornou tão claro que o fisco nacional tem pressionado para caracterizar as empresas, os pontos e sua circulação, encaixando-os dentro do mercado financeiro. A associação de classe das empresas destes programas vem, naturalmente, tentando evitar que isso aconteça, mas quando a empresa transforma o relacionamento com seus clientes em uma simples conta financeira, o cliente também o fará.
Bem, e o resgate?
Muito deste mercado se tornou como um novo mercado financeiro onde o que vale é dar pontos. O que se fará com ele é uma outra história. Em média um bom programa tem entre 30% a 35% de resgate, o restante simplesmente desaparece no fim da validade das milhas. É por isso que é tão atrativo vender milhas e até a reativação de milhas. É praticamente uma conta infinita de receita sem despesa.
O programa de pontos só se concretiza no momento do resgate. Só nesse momento. O resto é pirotecnia de comunicação e tecnologia. E eventualmente uma máquina de gerar dinheiro.
Voltando à experiência que contei no início do texto, acompanho este programa praticamente desde os seus primeiros movimentos. A empresa tem mexido muito nas regras de acúmulo e principalmente na validade de pontos. Uma prática ruim que mostra um programa mal planejado. Não quero dizer com isso que um programa não deva evoluir, muito pelo contrário, mas quando se mexe no chamado economics seria o equivalente a mudar a taxa de câmbio de uma moeda: uma pequena atitude que muda todas as regras do jogo.
Utilizando minha própria experiência como exemplo, sim, acredito que é possível comprar a fidelidade do cliente. Só tomei a decisão de efetuar a compra, pois sabia que faltavam alguns poucos pontos e uma barra extra de chocolate iria cair bem naquele momento.
O grande ponto (desculpe o trocadilho) é que a empresa se estruturou bastante para creditar pontos, mas não levou tão a sério a questão de pagar os prêmios. Em uma visão financeira, seria o equivalente a você ir ao banco e pedir um resgate e o caixa lhe dizer algo como: “Olhe, eu estou sem dinheiro em caixa, você pode voltar outro dia ou ir em uma outra agência?”
Se sua empresa ainda não tem um programa ou você está pensando em reestruturar algum que já esteja em curso, vale lembrar algumas referências básicas:
- O que queremos com esse programa
- Quem paga a conta – marketing, vendas, produto, cliente
- Para quem o programa é destinado – todos os clientes, clientes acima de uma determinada faixa de gasto
- Quais as regras de pontuação
- Quais as regras de resgate – usando o exemplo que dei: teremos a mesma seriedade com os resgates que temos com nossos produtos e serviços
- Quem e como fará a gestão de tudo isso
- Se tudo der errado, como terminamos o programa
A despeito de todas estas questões, o principal para mim ainda permanece na última milha. Se você, como empresa, pretende comprar a fidelidade do seu cliente, saiba que ele irá esperar algo em troca.
Na minha última passagem pelo aeroporto me lembrei que tinha pontos na loja de chocolate de marca. Me lembrava mais ou menos minha pontuação no programa da marca e a referência para um possível resgate. Como no dia seguinte eu tinha um par de reuniões coladas, resolvi juntar duas coisas: um estoque de energia extra somado a uma barra grátis promovida pelo programa.
Fiz a compra (que foi um pouco mais do que eu esperava gastar, diga-se de passagem), pedi para que a pessoa pontuasse no programa e pimba: “Ah, o Sr. já tem pontos para resgatar no programa.” Qual não foi minha surpresa quando ao pedir o prêmio, a moça me disse: “Hum, o Sr. tem 150 pontos, eu só tenho produtos hoje para resgate de 300.”
Por conta da profissão, mas também pela diversão em si, estou inscrito em um número infindável de programas de milhagem e fidelidade. Da cia aérea ao café ao lado da empresa, meus dados circulam muito além da minha capacidade de rastreamento.
Principalmente por conta da tecnologia (leia-se internet e aplicativos celular) qualquer empresa pode oferecer hoje o acúmulo de pontos. Acúmulo, entretanto, não significa um programa estruturado de pontos, de fidelidade ou mesmo de relacionamento. Sim, no jargão do mercado todos podem significar a mesma coisa, mas um olhar mais atento mostra que não necessariamente.
Já tratamos em vários posts aqui no blog sobre estes programas, mas hoje fico com a parte final, o momento onde um programa de pontos realmente se concretiza: o resgate.
Embora eu tenha participado da criação de vários destes programas, hoje tenho algumas restrições sobre a real validade deles para uma empresa que quer entrar nessa ‘avenida’. Calma, não que eu tenha me arrependido do que fiz (bem, em alguns casos, talvez sim), mas a verdade é que virou uma arma de destruição em massa que raramente mata um pernilongo.
Para que você leitor/a possa tenha uma rápida referência, historicamente o primeiro programa de pontos foi criado pela United Airlines em 1972. Eles nasceram com o conceito de Frequenty Flyer. A ideia na época era bastante simples: haviam cadeiras vazias nos voos, haviam clientes que viajavam muito, havia uma busca mútua de reconhecimento (entre empresa e cliente) e essa era aparentemente a forma mais barata de chegar a alguma conta positiva para ambos. Viu-se que esses programas eram um negócio em si, e decidiu-se separar o programa da cia aérea. O mesmo movimento se deu no Brasil em épocas distintas com os programas das extintas Varig-Rio Sul e Tam, tornando-se, respectivamente, Smiles e Multiplus.
Esse mercado cresceu, floresceu um bocado, e o tão falado ponto passou a ter o valor de moeda. No Brasil isso se tornou tão claro que o fisco nacional tem pressionado para caracterizar as empresas, os pontos e sua circulação, encaixando-os dentro do mercado financeiro. A associação de classe das empresas destes programas vem, naturalmente, tentando evitar que isso aconteça, mas quando a empresa transforma o relacionamento com seus clientes em uma simples conta financeira, o cliente também o fará.
Bem, e o resgate?
Muito deste mercado se tornou como um novo mercado financeiro onde o que vale é dar pontos. O que se fará com ele é uma outra história. Em média um bom programa tem entre 30% a 35% de resgate, o restante simplesmente desaparece no fim da validade das milhas. É por isso que é tão atrativo vender milhas e até a reativação de milhas. É praticamente uma conta infinita de receita sem despesa.
O programa de pontos só se concretiza no momento do resgate. Só nesse momento. O resto é pirotecnia de comunicação e tecnologia. E eventualmente uma máquina de gerar dinheiro.
Voltando à experiência que contei no início do texto, acompanho este programa praticamente desde os seus primeiros movimentos. A empresa tem mexido muito nas regras de acúmulo e principalmente na validade de pontos. Uma prática ruim que mostra um programa mal planejado. Não quero dizer com isso que um programa não deva evoluir, muito pelo contrário, mas quando se mexe no chamado economics seria o equivalente a mudar a taxa de câmbio de uma moeda: uma pequena atitude que muda todas as regras do jogo.
Utilizando minha própria experiência como exemplo, sim, acredito que é possível comprar a fidelidade do cliente. Só tomei a decisão de efetuar a compra, pois sabia que faltavam alguns poucos pontos e uma barra extra de chocolate iria cair bem naquele momento.
O grande ponto (desculpe o trocadilho) é que a empresa se estruturou bastante para creditar pontos, mas não levou tão a sério a questão de pagar os prêmios. Em uma visão financeira, seria o equivalente a você ir ao banco e pedir um resgate e o caixa lhe dizer algo como: “Olhe, eu estou sem dinheiro em caixa, você pode voltar outro dia ou ir em uma outra agência?”
Se sua empresa ainda não tem um programa ou você está pensando em reestruturar algum que já esteja em curso, vale lembrar algumas referências básicas:
- O que queremos com esse programa
- Quem paga a conta – marketing, vendas, produto, cliente
- Para quem o programa é destinado – todos os clientes, clientes acima de uma determinada faixa de gasto
- Quais as regras de pontuação
- Quais as regras de resgate – usando o exemplo que dei: teremos a mesma seriedade com os resgates que temos com nossos produtos e serviços
- Quem e como fará a gestão de tudo isso
- Se tudo der errado, como terminamos o programa
A despeito de todas estas questões, o principal para mim ainda permanece na última milha. Se você, como empresa, pretende comprar a fidelidade do seu cliente, saiba que ele irá esperar algo em troca.