Para se adaptar à nova exigência legal — e ir além dela — empresas podem apostar em práticas de gestão mais humanas, treinamentos contínuos, escuta ativa e canais de denúncia efetivos (mathisworks/Getty Images)
Repórter
Publicado em 16 de abril de 2025 às 11h52.
Última atualização em 16 de abril de 2025 às 12h04.
A saúde mental no ambiente corporativo ganhou mais força com a nova redação da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), publicada pela Portaria MTE nº 1.419/2024. A partir de 25 de maio de 2025, empresas de todos os portes precisarão tratar com o mesmo rigor os riscos psicossociais — como assédio, sobrecarga de trabalho e pressão excessiva — que já aplicam aos riscos físicos, químicos, biológicos e ergonômicos.
Essa mudança amplia o escopo do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e exige que os empregadores identifiquem, avaliem e adotem medidas preventivas concretas contra riscos que impactam a saúde mental dos funcionários. Além disso, a norma prevê que os trabalhadores devem participar ativamente do processo, sendo ouvidos sobre suas percepções de risco e podendo solicitar revisões no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).
Essa é uma evolução que reconhece que estilos de liderança, cultura organizacional e relações interpessoais impactam diretamente a saúde no trabalho, segundo Joaquim Santini, pesquisador internacional. “O estresse ocupacional e o burnout passam a ser tratados como riscos organizacionais reais e passíveis de sanção se não forem devidamente gerenciados”, afirma Santini.
Para se adaptar à nova exigência legal — e ir além dela — empresas podem apostar em práticas de gestão mais humanas, treinamentos contínuos, escuta ativa e canais de denúncia efetivos. Abaixo, especialistas indicam caminhos práticos:
Para Adriano Lima, palestrante e coach executivo, a liderança precisa estar envolvida diretamente no gerenciamento dos riscos.
“Líder que não conhece os riscos da sua área não tem o direito de liderar. Ponto”, afirma. Em vez de apenas criar cartazes ou cursos genéricos, Lima recomenda a construção de rituais de conversa e escuta, com participação ativa da gestão e uso de tecnologia para antecipar riscos, não apenas registrá-los.
Na visão de Cristina Cogo, que atua há quase 20 anos com segurança do trabalho e é psicóloga clínica, o primeiro passo é fazer um diagnóstico realista da saúde mental da equipe.
“É preciso realizar diagnósticos internos, criar programas de apoio psicológico, incentivar hábitos saudáveis e treinar líderes para lidar com questões de bem-estar no time”, afirma.
Ela também destaca a importância de práticas simples como ginástica laboral e rodas de conversa periódicas do líder com a sua equipe. “A prevenção começa pela escuta e pela presença ativa dos gestores”, diz.
Para Roberta Rosenburg, CEO da consultoria F.Lead, o RH deve assumir um papel ainda mais estratégico com as mudanças da NR-1.
“Não se trata apenas de cumprir uma norma, mas de garantir que a empresa esteja realmente comprometida com a saúde e segurança dos funcionários”, afirma.
Ela lembra que, além do cuidado mental, a proteção física continuará sendo uma das métricas da NR-1. O uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), por exemplo, deve ser reforçado com treinamento prático e exemplos vindos dos líderes, diz Rosenburg.
“O RH vai ter que garantir que os equipamentos estejam disponíveis, adequados para o risco da função daquele funcionário e daquela área. O líder, por sua vez, vai precisar dar o exemplo, e é importante que o RH ajude a integrar esse cuidado com os rituais de cultura da empresa em diferentes níveis”.
A nova NR-1 também está alinhada à Lei 14.457/2022, que exige mecanismos efetivos de denúncia para casos de assédio e outros riscos psicossociais. As empresas devem garantir anonimato e segurança a quem fizer denúncias, além de assegurar que os relatos sejam tratados com ética e imparcialidade, afirma Santini.
“A medida, além de proteger os trabalhadores, contribui para uma cultura organizacional mais transparente e respeitosa”, diz.
Outro ponto que merece atenção é o planejamento estruturado para emergências. Empresas devem realizar simulações periódicas para preparar os funcionários diante de situações críticas e revisar constantemente seus planos de ação, afirma Santini.
“A análise de ‘quase acidentes’ também é uma novidade que ajuda a antecipar problemas antes que se tornem reais”, diz o pesquisador internacional.
O descumprimento da norma pode gerar sanções que vão de multas à interdição de operações, passando pela exclusão de licitações públicas.
“Ignorar as novas diretrizes é colocar em risco não apenas a integridade dos trabalhadores, mas a sustentabilidade jurídica e reputacional da própria organização. Por isso, investir em saúde mental é uma necessidade estratégica e não mais uma escolha opcional”, afirma Santini.
De acordo com a NR-28, que trata das fiscalizações e penalidades relacionadas às normas regulamentadoras, Santini reforça que as principais penalidades por descumprimento da NR-1 revisada podem incluir:
Em vez de enxergar a nova NR-1 como uma ameaça, Lima afirma que empresas podem encará-la como uma oportunidade de reforçar boas práticas e melhorar a reputação institucional.
“Empresa que cuida da sua gente não faz isso por obrigação legal. Faz porque sabe que isso dá resultado”, diz.
Diante de todas as exigências, as empresas precisam se preparar para a data-limite de maio de 2025.
“Em resumo, isso significa revisar o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), mapear os fatores psicossociais no ambiente de trabalho e implantar ações concretas de promoção de saúde mental e bem-estar”, afirma Santin. “Treinamentos sobre gestão de tempo, programas de apoio psicológico e revisão do Código de Ética são algumas das recomendações sugeridas”.