Gestão de riscos e sucessão lideram o ranking de desafios nos conselhos no Brasil (FlamingoImages/Getty Images)
Repórter
Publicado em 22 de julho de 2025 às 15h19.
O maior desafio dos conselhos das companhias brasileiras são gestão de riscos (57,9%) e sucessão e desenvolvimento de liderança (57,9%). É o que aponta a pesquisa “Board Trends Brazil”, conduzida pelo Evermonte Institute, empresa especializada em estudos, pesquisas e insumos na área de governança, liderança e mercado de conselhos (boardrooms) no Brasil). O estudo ouviu 133 conselheiros entre os meses de março e abril de 2025.
“Essa é uma realidade que ultrapassa os limites nacionais. Muitas companhias mantêm uma lógica de atuação reativa, priorizando demandas imediatas e postergando discussões estruturantes, como sucessão e gestão de riscos, principalmente por serem tratadas como complexas, abstratas ou distantes de resultados diretos e rapidamente tangíveis”, afirma Felipe Ribeiro, sócio e headhunter da Evermonte Executive Search.
Essa é a primeira edição do estudo que, segundo Ribeiro, busca trazer uma abordagem mais aprofundada e alinhada à realidade dos conselhos brasileiros.
No ranking dos desafios apontados pelos membros dos boards das empresas brasileiras, a transformação digital e a inovação (57,1%), seguidas de pressões externas (crises econômicas ou geopolíticas), com 47,4% das menções; gestão de expectativa dos acionistas, citadas por 42,1% dos entrevistados; e governança de dados e cibersegurança, apontada por 32,3% dos conselheiros.
“Muitos destes temas não se limitam a mudanças táticas e operacionais, mas envolvem, também, uma transformação estratégica no modelo de negócios das companhias. Por isso, exigem uma discussão mais profunda dentro dos conselhos”, diz Ribeiro.
Elaborada para mapear e analisar os conselhos das companhias brasileiras, a Board Trends Brazil revelou que o perfil predominante ainda é o de conselheiros homens com trajetória em Finanças e idade entre 51 e 60 anos.
O levantamento também aponta uma forte concentração geográfica: Sudeste (65,4%) e Sul (53,4%) predominam em termos de mercado de atuação, o que reflete a concentração de conselhos nas regiões com maior poder econômico, enquanto o Nordeste (13,5%) e o Centro-Oeste (10,5%) figuram em terceiro e quarto lugar, respectivamente (o mesmo conselheiro pode atuar em diferentes regiões e, portanto, os resultados referentes às regiões de atuação ultrapassam 100%).
Outro dado relevante diz respeito a criação de mais conselhos. Entre 2011 e 2020, 39,1% dos conselheiros da amostra ingressaram em seus primeiros boards; após 2020, esse número se manteve elevado, em 34,6%, com crescimento da presença de perfis ligados a tecnologia, sustentabilidade e transformação digital.
“Com mais conselhos no Brasil, o estudo também mostra um crescimento no interesse de executivos pela carreira de conselheiro, impulsionado pela maior visibilidade do tema e pela evolução da governança como ativo estratégico no ecossistema empresarial”, diz Ribeiro.
Apesar desse avanço, os conselhos seguem marcados por fortes assimetrias estruturais, como a baixa diversidade de gênero. A pesquisa revelou que 27,1% dos conselhos analisados ainda não contam com nenhuma mulher, e apenas 12% possuem entre três e cinco conselheiras.
Apesar do crescimento recente (afinal, o número de mulheres ingressando em conselhos aumentou 44,4% após 2020), a igualdade de oportunidades ainda está longe de ser alcançada.
“No ritmo atual, a projeção é de que a equidade de gênero nos conselhos só seja atingida por volta de 2038”, afirma Ribeiro. “É um avanço ainda aquém da urgência que o tema exige e distante das metas já assumidas por diversas organizações e mercados”.
Para que a diversidade de gênero avance de forma consistente nos conselhos de administração, Ribeiro afirma que o primeiro passo é reavaliar os critérios de nomeação, priorizando competências e experiências relevantes.
“A composição dos conselhos ainda depende fortemente de relações pessoais. Processos estruturados, com critérios claros, objetivos e transparentes, ainda são exceção”, afirma.
Fortalecer a transparência nos processos de sucessão, assegurando que mulheres com potencial e trajetória compatível sejam de fato consideradas, pode ser uma saída para melhorar os dados de diversidade nos conselhos no Brasil.
“A renovação nos conselhos vem ocorrendo, mas de forma gradual e ainda concentrada em perfis com trajetória consolidada”, diz Ribeiro.
O desafio da diversidade, como os outros, podem ser resolvidos com avaliação anual de desempenho dos conselhos, afirma Ribeiro – mas essa solução também é outro desafio para esse grupo. Enquanto quase 98% dos boards internacionais realizam avaliações anuais de desempenho, no Brasil 39,8% ainda não adotam nenhum mecanismo formal de avaliação, diz o executivo.
“Sem autoavaliação, os conselhos correm o risco de serem o maior obstáculo à mudança que deveriam liderar.”
Embora não exista um modelo formal de “mentoria para conselhos”, Ribeiro afirma que há caminhos para promover o aprimoramento contínuo da governança.
“Podemos pensar em comitês específicos dentro do próprio conselho, voltados a temáticas relevantes para a companhia e que, por vezes, exigem uma profundidade técnica que o board como um todo pode não ter”, afirma o executivo. "Outra possibilidade é a presença de conselheiros independentes, que trazem uma visão externa qualificada e podem ajudar a reduzir vieses nas discussões, assim como a busca por aconselhamento externo de forma pontual também pode ser um outro caminho".