O ‘coffee badging’ representa uma adaptação à nova lógica do trabalho (AzmanL/Getty Images)
Repórter
Publicado em 24 de abril de 2025 às 15h51.
Passar no escritório só para tomar um café, bater um papo com o time e seguir o expediente de casa. A prática, apelidada de “coffee badging”, tem ganhado força no mundo corporativo com o avanço do modelo híbrido — e está longe de ser apenas um modismo.
Para uns, é sinônimo de descompromisso. Para outros, uma maneira estratégica de manter vínculos com a empresa sem perder produtividade. Afinal, o que esse fenômeno realmente revela sobre quem o pratica?
Segundo a psicóloga Milena Brentan, consultora para Alta Liderança, o ‘coffee badging’ representa uma adaptação à nova lógica do trabalho. "Se tudo pode ser feito remotamente e, ainda assim, as pessoas escolhem ir até o escritório, é porque a interação social importa — e importa mesmo", afirma.
Ela lembra que a cultura organizacional se fortalece nas conversas informais, nos encontros espontâneos e nos momentos que não estão na pauta da reunião. “Tanto que muitas empresas 100% remotas organizam encontros presenciais semestrais ou anuais para manter essa conexão”, diz.
Mas o fenômeno também reflete algo mais profundo: a busca por produtividade com autonomia. “Tem agenda que pede concentração, silêncio, privacidade — e isso nem sempre o escritório oferece. O coffee badging não é sobre fugir do trabalho, é sobre adaptar a rotina ao que faz mais sentido.”
A percepção varia conforme a cultura da empresa. “Em lugares com uma cultura ainda muito centrada na presença física, o coffee badging pode ser interpretado como falta de engajamento”, diz Brentan. Já em ambientes mais maduros, a prática pode ser vista como gestão inteligente do tempo.
A especialista em carreira e neurociência Andrea Deis, professora em instituições como FGV e Dom Cabral, afirma que a forma como o comportamento é recebido depende diretamente da cultura organizacional e da liderança imediata. “Se o líder ainda valoriza o ‘bater ponto’ como sinônimo de produtividade, a prática será mal vista. Mas se há foco em entregas, o coffee badging pode até reforçar a imagem de um funcionário autônomo e bem resolvido.”
O fenômeno ainda divide opiniões — e não pode ser encarado como regra. “Estamos vivendo uma tensão entre modelos: o presencial, o híbrido e o remoto. O coffee badging surge como uma resposta adaptativa a essa nova realidade”, afirma Brentan.
Em empresas que já abraçaram o trabalho híbrido com mais naturalidade, pode ser até uma vantagem. “É uma forma de manter conexão com o time, sem abrir mão da produtividade individual”, diz. Por outro lado, em culturas mais tradicionais, pode gerar ruídos sobre o comprometimento do funcionário.
Para ambas as especialistas, o ponto central não está em controlar a presença física, mas em criar experiências que tornem o ambiente de trabalho atrativo o suficiente para que os funcionários queiram estar por perto.
“Não adianta obrigar a ida ao escritório se o que se encontra lá é um ambiente frio, desconectado e sem propósito”, afirma Deis. “O funcionário precisa sentir que faz sentido estar ali.”