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Como o jiu-jitsu da família Valente virou referência mundial nos EUA

Com sede em Miami, a Valente Brothers atrai alunos como Gisele Bündchen e Ivanka Trump com uma proposta sem foco em competição

Guilherme, Pedro e Joaquim Valente, da Valente Brothers: referência mundial em artes marciais  (Divulgação/Divulgação)

Guilherme, Pedro e Joaquim Valente, da Valente Brothers: referência mundial em artes marciais (Divulgação/Divulgação)

Leo Branco
Leo Branco

Editor de Negócios e Carreira

Publicado em 7 de novembro de 2025 às 07h42.

Última atualização em 7 de novembro de 2025 às 07h43.

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A trajetória de Pedro Valente reúne os ingredientes clássicos de tantas histórias brasileiras que cruzam fronteiras: herança familiar, disciplina, coragem para romper padrões e a decisão de seguir a intuição mesmo quando isso significa abrir mão da estabilidade financeira.

O que torna sua jornada única é a escolha do caminho. Pedro não ficou famoso por empreender em tecnologia, abrir uma rede de restaurantes ou virar influenciador. Sua ferramenta de trabalho é o kimono.

Com ele, fundou nos Estados Unidos uma das academias de jiu-jitsu mais respeitadas do mundo, a Valente Brothers, com sede em Miami, alunos em vários países e nomes conhecidos na lista de frequentadores — entre eles, Gisele Bündchen, Ivanka Trump, filha do presidente americano Donald Trump, e membros das forças armadas americanas.

Como tudo começou

A história começou no Rio de Janeiro. Pedro nasceu em uma família em que a arte marcial fazia parte da rotina. O pai, Pedro Valente Sr., foi aluno direto de Hélio Gracie, referência máxima do jiu-jitsu brasileiro.

O avô paterno, médico formado no Rio, levou o filho adolescente para treinar depois que ele sofreu bullying por causa do sobrenome. O treino virou estilo de vida e, com o tempo, a amizade da família com os Gracie se consolidou.

“A gente cresceu no tatame, mas também dentro da filosofia deles, que envolve alimentação natural, disciplina e cuidado com o corpo”, diz.

Segundo ele, o convívio com Hélio Gracie foi intenso. “Nos últimos 30 anos de vida do mestre, ninguém passou mais tempo com ele do que eu e meus irmãos.”

Em vida, Hélio concedeu apenas 27 diplomas de professor. Quatro foram para a família Valente — um para o pai e um para cada um dos três filhos: Pedro, Guilherme e Joaquim.

Mesmo com essa ligação direta com as raízes do jiu-jitsu, Pedro não imaginava que a arte seria seu meio de vida.

Ele estudou em uma escola americana no Rio e, aos 18 anos, mudou-se para os Estados Unidos para cursar Administração com ênfase em finanças e marketing na Universidade de Miami.

A escolha por Miami foi prática: clima semelhante ao do Rio e proximidade com o mar.

“A filosofia naturalista do jiu-jitsu valoriza o contato com a natureza e o bem-estar. Miami fazia mais sentido do que Nova York ou Boston.”

A guinada veio rápido. Três meses após sua chegada aos Estados Unidos, aconteceu o primeiro evento do UFC, vencido por Royce Gracie, também da família.

A luta chamou atenção dos colegas da universidade, especialmente do time de futebol americano.

Pedro foi desafiado a mostrar se aquela técnica funcionava mesmo. Funcionava. Com facilidade, ele imobilizou atletas bem mais fortes.

A repercussão foi imediata. Ele criou o primeiro clube de jiu-jitsu dentro de uma universidade americana, começou a dar aulas e nunca mais parou.

“No início era uma atividade paralela para ajudar a pagar os estudos, mas a demanda cresceu rápido. No MBA, já dava aula para grupos grandes em um galpão. Quando terminei, precisei escolher entre uma proposta no mercado financeiro ou seguir no jiu-jitsu”, conta.

A decisão veio de uma reflexão pessoal.

“Meu bisavô, meu avô e meu pai eram médicos. Todos se vestiam de branco para curar as pessoas. Eu pensei: posso me vestir de branco para ajudar as pessoas a não adoecerem.”

Em 1998, Pedro alugou um espaço e formalizou a academia. Em 1999, o irmão Guilherme se mudou para os Estados Unidos para se juntar a ele. Em 2007, Joaquim completou o trio.

Juntos, fundaram a Valente Brothers, com uma proposta diferente do modelo que se popularizou no Brasil nos anos 90, focado em competições e performance esportiva.

Valente Brothers, em Miami: empresa tem cursos online, seminários e um programa internacional de formação (Divulgação/Divulgação)

Qual é a filosofia de trabalho

A partir de 2004, os irmãos tomaram uma decisão incomum: deixaram de competir e passaram a ensinar 100% defesa pessoal.

“Quando você separa a técnica da filosofia, o jiu-jitsu pode ser perigoso. A gente viu isso acontecer no Rio nos anos 90, quando começaram a usar a arte como ferramenta de agressão. Nosso trabalho é o oposto: ensinar a evitar conflitos, controlar a emoção, antecipar riscos e, se necessário, saber se defender de ataques comuns de rua”, explica.

Essa proposta atraiu alunos que buscavam mais do que um esporte. A academia cresceu, ganhou corpo e, mais tarde, uma sede própria construída do zero em North Miami Beach, que Pedro descreve como uma “fortaleza do jiu-jitsu”.

O espaço recebe crianças, adultos, militares, policiais e grupos de elite das Forças Armadas americanas.

Além da sede, a Valente Brothers tem filiais em outras cidades da Flórida e uma rede de instrutores licenciados em outros países. Há também cursos online, seminários e um programa internacional de formação.

O método inclui uma estrutura de ensino própria, o Código 753, que resume a filosofia de vida da academia.

São sete palavras para a saúde espiritual (retidão, coragem, benevolência, respeito, honestidade, honra e lealdade), cinco para a saúde do corpo (exercício, alimentação, sono, higiene e positividade) e três para a saúde mental (atenção plena, equilíbrio emocional e fluidez).

Os alunos precisam entender e aplicar esses conceitos no dia a dia. “Isso aqui não é só uma aula de luta. É uma formação pessoal. Muita gente vem atrás disso”, diz Pedro.

Os alunos famosos

Entre os alunos, estão figuras públicas que buscavam justamente esse tipo de transformação.

“Essas pessoas já têm sucesso, dinheiro, conforto. O que falta, muitas vezes, é segurança interna. O jiu-jitsu preenche uma necessidade psicológica de autopreservação. Quando você sabe se defender, fica mais calmo, evita confusão, se sente inteiro”, explica.

Gisele Bündchen chegou à academia por indicação de um aluno entusiasmado. O mesmo aconteceu com Ivanka Trump e Jared Kushner, marido de Ivanka, depois que a filha do casal pediu para aprender defesa pessoal.

Ivanka falou publicamente da experiência em entrevistas. “Ela dedicou sete minutos a falar da nossa academia em um podcast internacional”, conta.

Apesar da visibilidade, Pedro reforça que o ambiente da Valente Brothers é simples e acessível.

“No tatame, todo mundo é igual. Está todo mundo de kimono. Não importa se é filho de presidente ou trabalha em posto de gasolina. A prática é para todos.”

Hoje, os filhos de Pedro e dos irmãos já representam a quarta geração da família Valente no jiu-jitsu.

A história da Valente Brothers também se tornou um modelo de negócio de sucesso nos Estados Unidos, embora Pedro insista que não era esse o objetivo.

“O alcance veio como consequência. A gente nunca mirou o número de matrículas. Sempre foi sobre preservar a essência do jiu-jitsu como ferramenta de autoconhecimento e qualidade de vida.”

Para Pedro, a função da academia é clara: criar um ambiente onde a técnica é apenas um dos pilares.

“A arte marcial é o barco, mas a bússola é a filosofia. E o mapa é o código 753. É isso que faz o aluno sair daqui mais preparado para a vida, e não apenas para uma luta.”

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