Transtornos mentais: OMS tem destacado que transtornos psiquiátricos devem ser considerados uma preocupação mundial durante a pandemia (Dumitru Ochievschi/Getty Images)
Victor Sena
Publicado em 5 de agosto de 2021 às 15h08.
Última atualização em 5 de agosto de 2021 às 15h43.
Apesar da pandemia, a covid-19 não foi o maior motivo de afastamento de saúde no ambiente de trabalho no último ano. Um levantamento realizado pela B2P, consultoria especializada no acompanhamento e gestão de funcionários afastados por razões médicas, da It'sSeg Company, mostra que a doença infecciosa ficou em quarto lugar em um ranking que vai de zero a dez.
O levantamento da consultoria inclui um recorte de 331 mil colaboradores em 18 empresas brasileiras. Os dados consideraram os afastamentos entre março de 2020 e março de 2021.
Em primeiro lugar estão as doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo, em segundo os transtornos mentais e em terceiro lesões.
Apesar de se encaixar em uma categoria separada, o aumento dos transtornos mentais e comportamentais podem ter uma relação com a pandemia, já que o isolamento social e o risco de se contaminar são considerados fatores estressores para a saúde mental.
A OMS tem destacado que transtornos psiquiátricos devem ser considerados uma preocupação mundial durante a pandemia da covid-19 em uma série de publicações.
Dados da Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar) mostram que as vendas de antidepressivos e benzodiazepínicos (os populares calmantes vendidos com receita) aumentaram em média 24% em 2020.
O tema também veio à tona dentro do contexto da Olimpíadas de Tóquio. Uma das principais ginastas da atualidade, a americana Simone Biles desistiu de disputar a final individual de ginástica artística na última semana.
A ginasta de 24 anos era favorita ao ouro, mas saiu da disputa alegando a necessidade de preservar a saúde mental.
Diversas pesquisas têm mostrado que empresas têm relatado maior preocupação dos funcionários com seu lado emocional. Uma pesquisa da Kenoby mostra, porém, que os investimentos ainda não chegaram a ocorrer.
A mesma pesquisa mostra que 67% dos RHs disseram que a empresa já teve afastamento de funcionários por problemas emocionais.
Segundo a B2P, o número de afastamentos por transtornos mentais e comportamentais aumentou 23,3% entre 2020 e 2019.
Para a psicóloga e CEO da consultoria em saúde Bee.Touch Ana Carolina Peuker, as empresas que quiserem melhorar os níveis de saúde mental dos profissionais têm que encarar a saúde com uma perspectiva integral, em que as conexões entre as doenças físicas e psicológicas são levantadas.
"É importante que a gente tenha um olhar sistêmico para a questão do adoecimento mental não só fazendo um rastreio de adoecimento porque essa é uma medida reativa. Só vai pegar aquelas pessoas que já estão doentes e tu não sabe de fato qual é a razão que motivou esse adoecimento. Claro que é importante esse trabalho, porque tá revelando que existe um impacto do adoecimento mental na produtividade. Mas o que eu quero dizer é que a gente precisa ter uma abordagem menos reativa, mais proativa."
A Bee.Touch oferece diagnóstico de riscos de saúde, com foco nos riscos psicológicos, a empresas. A empresa tem um método para verificar com base em pesquisa o que precisa ser melhorado e desenvolve um plano de ação para o cliente. Para traçar esse plano de ação, o primeiro ponto é entender qual é o estado de saúde emocional das equipes e os riscos associados.
Entre os riscos psicológicos no ambiente de trabalho que são mais comuns, citados por Ana Carolina, estão carga de trabalho excessiva, falta de inclusão do trabalho na tomada de decisão, má gestão de mudanças e comunicação ineficaz.
A consultora concorda que a pandemia pode ter contribuído para o crescimento de transtornos mentais por que há um impacto "multidirecional" na vida das pessoas.
"A pandemia não é só uma crise sanitária, mas uma crise humanitária. Os impactos são em muitos aspectos: sociais, econômicos, etc. Nós Achamos que ela iria durar um mês, mas está durando dois anos."
Com a pandemia e o trabalho remoto, novos riscos surgiram. Ana Carolina Peuker cita também a hiperconectividade e a falta de fronteiras entre vida privada e laboral como fatores que fazem da pandemia um contexto pior para a saúde mental.