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Como nossa linguagem muda quando tentamos ser persuasivos

Um estudo de análises de produtos mostra a mudança nas palavras que escolhemos usar quando estamos tentando influenciar as pessoas

Convencimento: acadêmicos conhecem relativamente pouco sobre como a linguagem que as pessoas usam muda quando estão tentando ser persuasivas (Thinkstock/Purestock/Thinkstock)

Convencimento: acadêmicos conhecem relativamente pouco sobre como a linguagem que as pessoas usam muda quando estão tentando ser persuasivas (Thinkstock/Purestock/Thinkstock)

CU

Carolina Unzelte

Publicado em 24 de abril de 2018 às 16h07.

Última atualização em 24 de abril de 2018 às 20h53.

Ao dar uma opinião on-line sobre um par de meias, você pode descrevê-las como "quentes" e "bem fabricadas". Mas, e se houvesse algo mais em jogo na resenha? E se, digamos, o fabricante oferecesse um par de meias grátis se você persuadisse alguém a também comprar um par? Será que nesse caso você escreveria que as meias eram "maravilhosas" e "incríveis"?

Surpreendentemente, os acadêmicos conhecem relativamente pouco sobre como a linguagem que as pessoas usam muda quando estão tentando ser persuasivas. 

Há um “buraco teórico na literatura”, diz Loran Nordgren, professor associado de administração e organizações da Kellogg. “Conhecemos muito pouco sobre como as pessoas tentam naturalmente persuadir outras pessoas". 

Sendo assim, Nordgren e dois colegas da Kellogg, o professor de marketing Derek Rucke e o pesquisador de pós-doutorado Matthew Rocklage, abordaram essa questão. Descobriram que a linguagem dos participantes tende a se tornar mais emocional quando são motivados a persuadir os demais a comprar um produto. 

Esse padrão continua mesmo quando as pessoas sabem que o público-alvo é muito racional e, portanto, provavelmente não serão persuadidos com argumentos emocionais. 

"É difícil escapar da força da gravidade da linguagem emocional, mesmo quando se sabe que o público quer ouvir um apelo mais cognitivo", diz Rucker. 

Os resultados sugerem um dilema potencialmente interessante. Ao receber incentivos para escrever resenhas positivas e persuasivas sobre produtos, pode-se usar apelos mais emocionais, mesmo não ideais. Para algumas categorias de produtos, como torradeiras, na maioria das vezes, talvez os usuários queiram ouvir argumentos racionais. Afinal, quando foi a última vez que você se empolgou em torrar um pão? 

Se uma resenha descrever uma torradeira de “incrível”, em vez de “perfeita”, “talvez você fique menos persuadido pela mensagem”, diz Rucker. “A emoção pode servir como obstáculo”. 

Uma impressora encantadora? 

Os pesquisadores usaram uma ferramenta que Rocklage havia desenvolvido em pesquisas anteriores. O léxico avaliativo Evaluative Lexicon - EL) classifica as palavras em três características: valência (seja a palavra positiva ou negativa), extremidade e emocionalidade. Por exemplo, “perfeito” é mais extremo que “maravilhoso”, mas “maravilhoso” evoca mais emoção do que “perfeito”.

Para estudar como as pessoas usam a linguagem na persuasão, Rocklage, Rucker e Nordgren primeiramente recrutaram 1.285 pessoas no Amazon Mechanical Turk para participar de um experimento on-line. Os pesquisadores escolheram 20 produtos que receberam um grande número de resenhas positivas na Amazon, em categorias como eletrodomésticos, brinquedos e eletrônicos.

Cada pessoa leu uma descrição neutra de um produto e foi solicitada a escrever uma resenha 5 estrelas. No entanto, um grupo foi instruído a descrever as características positivas do produto, enquanto outro grupo foi instruído a persuadir outros consumidores a comprá-lo. Em seguida, os pesquisadores analisaram as palavras nas resenhas, bem como as de 840 resenhas reais da Amazon referentes a esses produtos.

A equipe descobriu que as pessoas instruídas a escrever uma resenha positiva usaram palavras com uma média de emocionalidade de 5,38 de 9 na escala EL. Os níveis foram semelhantes nas resenhas reais da Amazon. No entanto, os participantes que foram orientados a persuadir os demais apresentaram uma leve mudança em sua linguagem, de tal forma que expressaram maior emoção, com uma média de 5,48 de 9 na escala EL. Por exemplo, uma pessoa do primeiro grupo escreveu que a impressora era “útil”, enquanto alguém do grupo persuasivo a chamou de “encantadora”. 

“Observamos que as pessoas expressam mais emoção mesmo em categorias nas quais isso pode ser estranho e possivelmente menos eficaz”, diz Rucker. 

Rucker reconhece que a diferença é pequena, mas observa que o objetivo do estudo era verificar se haveria alguma correlação. “No início da pesquisa, muitas vezes prevemos que a dimensão dos efeitos será pequena", disse ele. “No entanto, agora que há evidência que este vínculo existe, futuras pesquisas podem explorar se e quando esses pequenos efeitos se traduzem em diferenças importantes no mundo real". 

Um vínculo direto com a linguagem emocional 

A equipe também analisou se essa tendência resultava de um esforço consciente ou se isso acontecia de forma mais automática. Como poderiam fornecer perspectivas sobre essa questão? 

Os autores raciocinaram que, se o uso de argumentos emocionais resultava de reflexão deliberada, isso diminuiria quando a mente das pessoas fosse colocada à prova. 

Como teste, pediram a 288 participantes on-line para escreverem várias palavras positivas para descrever um romance de que gostavam. Alguns participantes foram informados que ganhariam US$ 1 toda vez que um participante de um estudo futuro escolhesse esse livro com base em sua descrição. Os demais não receberam este incentivo. Este recuso foi usado para influenciar a motivação das pessoas para serem persuasivas. 

Todos também tiveram que memorizar um código e relembrá-lo depois. Alguns receberam um código de dois dígitos, outros de oito dígitos. Os pesquisadores postularam que, se o vínculo entre persuasão e emoção fosse mais automático, então os níveis emocionais na linguagem não deveriam diferir muito entre os dois grupos.

De fato, o tamanho do código não fez diferença, sugerindo que as pessoas estavam mudando sua linguagem sem ter que fazer muito esforço consciente. 

"Essa foi nossa primeira evidência de que se trata de uma associação mais automática", diz Rucker. 

Outro experimento proporcionou mais evidências de uma associação automática. Os pesquisadores mostraram várias palavras às pessoas e pediram que pressionassem uma tecla quando a palavra estivesse ligada à persuasão. Quando a palavra era mais emocional, os participantes tendiam a pressionar a tecla mais rapidamente, o que sugere uma associação natural entre emoção e persuasão. 

Combinando a mensagem com o público 

E se as pessoas soubessem que seu público-alvo era altamente racional e que dificilmente seria influenciado pela emoção? Elas poderiam desligar sua tendência automática de usar a emoção e empregar argumentos mais cognitivos? 

Os pesquisadores pediram a 781 pessoas on-line para escreverem descrições positivas de um restaurante onde jantaram recentemente. Para incentivar as pessoas a persuadir os leitores, um grupo foi informado que ganharia US$ 1 para cada futuro participante do estudo que escolhesse aquele restaurante. 

Em seguida, alguns participantes foram informados a respeito de quem eles estavam tentando convencer. Em uma dica não tão sutil, o público-alvo de um grupo foi descrito como pessoas da área artística que se autodenominavam “Os emocionalistas”. Para outro grupo, o público-alvo era "A sociedade da racionalidade aplicada e matemática", composta de cientistas e analistas. Um terceiro grupo não recebeu informação nenhuma a respeito de quem estavam tentando persuadir. 

Os participantes que foram incentivados a serem persuasivos, mas não receberam informações sobre o público-alvo, usaram palavras com uma emotividade média de 4,17.

Em contrapartida, as pessoas que estavam abordando os emocionalistas intensificaram sua linguagem emocional, chegando a uma média de 4,26. Talvez tenham sentido que, dada a natureza de seu público-alvo, eles teriam permissão para focar mais o lado da emoção, especula Rocklage. 

Porém, os participantes que abordaram a sociedade da racionalidade não atenuaram sua emoção, permanecendo em torno de 4,18. Os resultados sugerem que as pessoas mantêm os argumentos emocionais mesmo quando deveria estar claro que elas provavelmente não atingirão o ideal. 

"Agora estou dizendo a você que o segredo para os persuadir é usar argumentos racionais", diz Rucker. “Você deve adaptar sua retórica para ser mais cognitivo, mas parece que isso não acontece naturalmente nas pessoas. Isso vai contra essas associações diretas”. 

Persuasão pela razão X emoção 

Muitas empresas já usam a análise de sentimentos para coletar informações a partir de mensagens de redes sociais. Essas descobertas indicam que, em vez de apenas buscar palavras positivas ou negativas, também pode ser útil avaliar o nível emocional do texto, diz Rucker. 

Por exemplo: digamos que uma empresa planeje oferecer novos produtos a blogueiros para que experimentem gratuitamente e tornem a sua opinião pública. Um blogueiro que geralmente usa uma linguagem mais emocional nas redes sociais pode estar mais interessado em persuadir um determinado público. Assim, talvez seja melhor para a empresa escolher aquele blogueiro em vez de um redator igualmente positivo, mas menos emotivo, diz Rucker. 

Por outro lado, as empresas precisam entender se seus clientes estão mais propensos a serem persuadidos pela emoção ou pela razão. Se pela razão, incentivar os clientes a escreverem críticas positivas pode ser contraproducente se isso significar uma elevação do seu nível de emoção. 

"Eles se tornam agentes de persuasão menos eficazes, mesmo se realmente gostem do produto", diz Rucker. 

São necessárias mais pesquisas para determinar se os padrões vistos nos experimentos on-line se refletem no mundo real. Os pesquisadores gostariam de trabalhar com uma empresa para investigar como os incentivos à persuasão afetam a linguagem e, consequentemente, as vendas, diz Rucker. 

Eles suspeitam que o vínculo da emoção à persuasão começa na infância. Afinal de contas, as crianças costumam usar a emoção como forma de argumentação. 

Quando se trata de influenciar, “a emoção é, indiscutivelmente, a forma mais antiga que temos de comunicação”, diz ele.

Texto originalmente publicado no site da Kellogg School of Management.

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