Amanda Mendes Siqueira, supervisora regional de vendas da Covidien: Passou a anotar pendências e dúvidas que ela, os clientes e os médicos tinham sobre algum determinado produto. (Raul Junior / VOCÊ S/A)
Da Redação
Publicado em 19 de março de 2013 às 19h28.
São Paulo - A psicóloga mineira Amanda Mendes Siqueira, de 37 anos, supervisora regional de vendas da Covidien, multinacional de produtos de saúde, deixou há oito anos uma carreira na área de recursos humanos para tornar-se vendedora técnica de equipamentos e produtos hospitalares. Sua experiência na área comercial era zero.
Em hospitais, ela só havia entrado duas vezes na vida. Mesmo assim, apostou que aprenderia na prática a vender bisturis, cateteres, máquinas e suturas fabricados pela Covidien. "Sempre mostrei humildade e vontade de aprender", diz Amanda.
Quando tinha alguma dúvida, perguntava. A chefe explicava, os médicos mais próximos davam uma força. O resultado foi que Amanda aprendeu o trabalho no dia a dia. Com o tempo, foi premiada duas vezes e promovida a supervisora regional.
Como Amanda, todo mundo aprende coisas importantes durante o trabalho. Na verdade, a prática é a maior fonte de conhecimento a que um profissional pode ter acesso e a mais rica delas. Essa é a opinião do professor Michael Eraut, da Universidade de Sussex, no Reino Unido, um dos maiores especialistas do mundo em aprendizado no trabalho.
Segundo o cientista, o que determina o desenvolvimento de um profissional são as atividades que ele pratica em seu cotidiano: as tarefas desafiadoras, as tentativas e erros, a participação em equipes e a observação de um chefe inspirador. São essas interações, aparentemente banais, que aumentam a bagagem profissional e habilitam a pessoa a progredir na carreira.
Em seus estudos, patrocinados pelo governo britânico, Michael e sua equipe observaram e entrevistaram cerca de 450 profissionais de 12 áreas, como saúde, engenharia, auditoria e contabilidade, em início e meio de carreira. A conclusão foi de que as pessoas adquirem saber de duas maneiras. De um lado, estão cursos, conferências e coachings, atividades em que o profissional tem de parar o que está fazendo para aprender.
De outro ficam as coisas que se aprendem durante o trabalho: fazer parte de uma equipe, relacionar-se com clientes e enfrentar problemas. Essas ações, apesar de não terem o aprendizado como objetivo principal, representam algo entre 70% e 90% das competências de uma pessoa.
"No trabalho, você lida com problemas complexos e, para solucioná-los, é necessário muitas vezes recorrer a diferentes tipos de conhecimento e experiências, reuni-los e aplicá-los", disse Michael em entrevista à VOCÊ S/A.
Ao participar de um grupo ou assistir atentamente aos outros trabalhando, você está absorvendo novos conhecimentos e maneiras de fazer as coisas. "Como isso acontece naturalmente, as pessoas não percebem que estão aprendendo, mas estão", diz o professor.
Essas situações cotidianas são fundamentais para o aperfeiçoamento profissional. Nelas, o funcionário desenvolve o chamado conhecimento tácito, que é basicamente experiência. Por ser absorvido e usado de forma implícita, acaba sendo subestimado. No entanto, segundo Michael, ele está presente em tudo o que fazemos e tem um papel fundamental em processos como análise de cenários, tomada de decisão e até nas relações interpessoais.
Em geral, quanto mais complexa e incerta é uma situação, maior é a importância do conhecimento tácito. Por exemplo, todos nós sabemos mais sobre um colega, chefe ou cliente do que podemos explicar. Essa sabedoria é formada por lembranças de episódios passados, guardadas de alguma forma, ainda que instintivamente. Durante o trabalho, levamos tudo isso em consideração de maneira automática.
Basta pensar numa reunião de negócios. Mais do que a análise objetiva, a intuição e a experiência são fundamentais para interpretar o que está em jogo e o papel dos participantes. Outro exemplo é o momento de tomar uma decisão, em que muitas vezes não há tempo para reunir dados e analisar todos os argumentos. Também nesse caso, só resta comparar a situação atual com cenários anteriores para identificar semelhanças e escolher o melhor caminho a seguir.
"As pessoas sabem fazer muitas coisas sem que tenham que parar para pensar como sabem fazê-las. Se elas conseguem ou não anotar aquilo num papel, não faz diferença", diz Michael. Resumindo, trata-se de uma boa notícia: quanto mais você trabalha, mais aprende aquilo que realmente precisa para crescer. A questão, portanto, é como adquirir a experiência de uma maneira mais organizada.
A andragogia, ciência que estuda a educação de adultos, mostra como funciona a aquisição de conhecimento entre profissionais. Diferentemente de uma criança, um adulto tem um repertório específico de sabedoria acumulada e muita opinião formada. Por ser crítico, ele avalia se aquele novo conhecimento trará algum benefício para sua vida (ou profissão) antes de aceitá-lo.
Se aquilo fizer sentido, ele absorve o conhecimento. Se não fizer, descarta. No trabalho, uma pessoa realiza essa triagem continuamente e, na maioria das vezes, de maneira inconsciente.
"Os adultos precisam perceber uma aplicação prática do que estão aprendendo e entender, rapidamente, como aquilo melhora o seu desempenho", diz Paulo Campos, consultor associado da consultoria LabSSJ e professor do Insper, escola de administração de São Paulo.
Atitudes que desenvolvem
Uma série de pequenas atividades é capaz de impulsionar o aprendizado no trabalho. A grande maioria delas depende da atitude e da iniciativa de cada pessoa. Profissionais que fazem perguntas, pedem e dão feedback com frequência tendem a aprender mais. Quem tem o hábito de ouvir e observar pares e superiores também aumenta bastante as chances de ampliar seus conhecimentos.
Portanto, para quem quer aprender coisas novas, o home office não é uma boa opção. Melhor é trabalhar em equipe ou ao lado de um colega, o que lhe permite trocar experiências sobre eventos no momento em que acontecem e entender como os outros analisam situações, tomam decisões e as monitoram.
Também é importante assumir tarefas desafiadoras e, quando possível, se engajar em projetos que envolvam profissionais de outras áreas. "Quando os colegas de trabalho têm competências diferentes das suas, você é forçado a entender o novo e a avaliar de que forma aquilo pode ajudar em suas tarefas", diz Michael.
Não desanime se tiver um chefe ou colega que tem pouco a ensinar. Profissionais fora do grupo de trabalho também podem ser uma fonte rica de conhecimento. Mas, nesse caso, cabe a você estender sua rede de contatos para além da baia ao lado. Ouça o que os outros têm a dizer, mostre interesse pelos projetos e tarefas da área que o atrai, elogie, ofereça seu apoio.
"O aprendizado informal depende muito das relações que a pessoa consegue construir na organização", diz Paulo Campos.
Independentemente da empresa ou do ambiente, a responsabilidade de buscar novos conhecimentos é do profissional. "A atitude de quem quer aprender é diferente da de quem quer ser ensinado, e essa diferença é muito importante", diz Luiz Carlos Cabrera, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp) e diretor da Amrop Panelli Motta Cabrera, firma de recrutamento executivo. "Se uma atitude passiva é um defeito, ser curioso é uma competência a ser praticada", diz Cabrera.
Integrar equipes multidisciplinares, participar de projetos simultâneos à sua rotina ou cooperar com atividades fora de seu departamento podem gerar bons resultados futuros. Com mais aprendizado prático, um profissional adquire novas competências sem perceber e ainda incrementa o currículo.
Em seus processos seletivos, a headhunter Adriana Prates, presidente da Dasein Executive Search, leva muito em consideração a experiência prática do candidato. "Nunca as empresas me pediram para contratar um profissional com MBA em uma área específica. O perfil desejado normalmente está relacionado à vivência dele na área em que vai atuar", afirma Adriana.
Aprenda errando
Uma das maneiras mais importantes de consolidar um novo conhecimento é aprender com os erros. Apesar de ser um processo rico e cheio de lições, muitas vezes ele é interrompido precocemente, já que o fracasso ainda tem um componente negativo forte na cultura corporativa.
"A maioria das pessoas não sabe lidar com o fracasso", diz Amy Edmondson, professora da Harvard Business School. "Elas ficam frustradas, perdem tempo pensando no que significa o fracasso, e não no que podem aprender com a experiência." Parte do problema é que os profissionais estão mais preocupados com o que irão dizer a respeito deles.
Muitas vezes, ficam muito apreensivos com a reação do chefe e com as fofocas sobre seu mau desempenho. De acordo com Amy, isso gera um círculo vicioso: o profissional falha, evita entender o porquê do erro e não aprende nada com o episódio. Muito provavelmente vai acabar cometendo o mesmo erro. "Você não pode criar nada novo sem antes tentar", diz Amy. "Além disso, é preciso aceitar que muitas dessas tentativas irão fracassar."
Lições do fracasso
Uma dica importante é não transformar o erro em tragédia. "É apenas um lembrete de que você é um ser inacabado", diz a professora Carol Dweck, PhD em psicologia da Universidade Stanford. "O erro contém a pista para a melhor maneira de agir da próxima vez", escreve Carol no livro Por Que Algumas Pessoas Fazem Sucesso e Outras Não (Editora Fontanar).
Quando as pessoas deixam de pensar em termos de sucesso ou fracasso, uma dualidade que deriva do código mental fixo, tornam-se muito mais capazes de aprender estratégias para superar os problemas, admitir os erros e encará-los como um momento de superação e também de aprendizagem.
Um fator importante é reconhecer a forma como você aprende. Não existe uma maneira única, cada pessoa tem a sua e é essencial conhecê-la para não insistir na maneira errada.
"Para reconhecer seu estilo, resgate os momentos na vida em que aprendeu bem e rápido", diz Luiz Carlos Cabrera. A metodologia chamada Learning Style Inventory (LSI), ou "inventário de estilos de aprendizado", utilizada no Brasil pela consultoria LabSSJ, mostra quatro perfis pessoais: o divergente, o assimilador, o convergente e o acomodador (veja o quadro Entenda Seu Estilo).
Uma pessoa pode ter facilidade de aprender diante de dados quantitativos e outra pode preferir questões abstratas. Não existe melhor nem pior, apenas o que rende mais para cada um. Mas, qualquer que seja seu estilo, é preciso lembrar que aprendizado exige persistência.
Só coisas muito simples são compreendidas plenamente num primeiro momento. Por isso, nada de deixar que uma dificuldade passageira se transforme numa desistência. Tente outra vez, até aprender fazendo.