Carreira

Quem o Itaú procura dentre 523 mil currículos que recebe ao ano

Em entrevista exclusiva, diretor executivo de RH do banco Itaú, Sergio Fajerman, fala de que tipo de profissional o banco precisa agora e no futuro

Itaú: 100 mil funcionários e  mais de meio milhão de currículos recebidos por ano (ITACI/Divulgação)

Itaú: 100 mil funcionários e mais de meio milhão de currículos recebidos por ano (ITACI/Divulgação)

Camila Pati

Camila Pati

Publicado em 6 de março de 2018 às 15h00.

Última atualização em 20 de janeiro de 2020 às 12h06.

São Paulo – No ano passado, mais de 523 mil pessoas enviaram currículos para tentar uma vaga de emprego no Itaú. Para se ter uma ideia do poder de atração do banco, uma nota publicada pelo Site EXAME, em dezembro do ano passado, falando sobre um programa do banco para contratar gerentes teve mais de 420 mil acessos.

Maior banco do país em ativos totais (1,425 trilhão de reais), o Itaú tem 100 mil funcionários e 50 milhões de clientes e seu principal desafio, segundo o diretor executivo de RH, Sergio Fajerman, é ser ágil dentro dessa grandiosidade.

Ao receber o Site EXAME, na sede do banco, o executivo falou sobre o perfil profissional mais procurado, carreiras do agora e do futuro. “A gente vai ter por um bom tempo profissionais diferentes convivendo no banco”, diz. Para ele, a transformação digital ainda tem um longo caminho.

Fajerman também falou sobre as vantagens de trabalhar numa empresa desse tamanho e disse que procura desmistificar, na medida do que é possível, ideias preconcebidas sobre o tema.

Passando por grandes mudanças na maneira de trabalhar, o banco adotou, por exemplo, modelos de trabalho comuns em startups e fintechs baseados em times multifuncionais e autônomos, os chamados squads, em algumas áreas. O RH é uma delas.

No entanto, ele diz que não quer “vender sonhos”. “Trabalhar numa startup não é a mesma coisa do que trabalhar num banco de 90 anos. A regulação não é a mesma”, diz ele.

A seguir, confira trechos da conversa:

Site EXAME: A tecnologia tem mudado a demanda profissional dentro do sistema bancário, funções antes ocupadas exclusivamente por humanos hoje podem ser desempenhadas por robôs e computadores. Como você enxerga essa transformação em termos de demanda profissional?

Sergio Fajerman: A transformação que está ocorrendo é menos disruptiva ou impactante em termos de tempo. O Itaú tem cerca de 50 milhões de clientes. Ainda tem uma fase que a gente vai conviver com esse sistema tradicional e esse sistema novo, ainda vai ter um período de convivência grande. A gente vai ter por um bom tempo profissionais diferentes também convivendo aqui. Não tem melhor ou pior, são diferentes profissionais que atendem a necessidades especificas. O perfil do nosso cliente ainda é muito diferente. Pode ser que num futuro, já na próxima geração, a gente tenha 100% de consumidores ou de clientes digitalizados. Mas por enquanto vai ter uma mistura. Seja por questões de regulação e seja por questões de clientes, a gente tem aí um longo caminho para percorrer.

Tendo em vista este cenário, que tipo de carreiras são mais demandadas? E se você tivesse que fazer uma projeção para 5cinco e para 10 anos o que diria sobre a necessidade do banco?

Sergio Fajerman: nos próximos anos a gente vai ter que ter habilidade de navegar bem por esses dois mundos. Se a gente não se preocupar com o novo, dizendo que vai demorar, o bonde passa e a gente fica para trás. Mas por um bom tempo eu vou precisar lá do backoffice, vou precisar do caixa, das agências. É difícil precisar quanto tempo e qual a quantidade, é algo que a gente vai ter que ficar acompanhando de forma muito cuidadosa. Tem as atividades mais tradicionais, mas cada vez mais vou precisar descobrir o novo.

Que profissionais, então, são essenciais para descobrir o novo?
Sergio Fajerman: por exemplo, cientistas de dados. A gente tem uma quantidade de dados absurda que passa pelo banco. A tecnologia hoje faz com que o armazenamento desses dados seja muito barato. Agora tem que saber usar. Aí tem uma legião nessa carreira meio nova que são os cientistas de dados, os engenheiros de dados. Sem dúvida, nós vamos ter que trazer. A gente sempre teve muito estatístico, matemático para fazer modelagens de forma geral. Mas cientista de dados vai além, entra no campo de machine learning, inteligência artificial, são profissionais robustos nesse campo, tem escopo maior, tem profundidade maior.

Precisa ter gente que entenda de programação, de como fazer isso. Também tem todo um novo campo, de reconhecimento facial, reconhecimento de voz. Precisa ter pessoas muito bem preparadas para esse tipo de situação. Quanto mais você lida com informação, mais a segurança da informação passa a ser importante também. Vai ter toda uma gama de profissões ligadas a dados seja análise, seja programação, seja inteligência artificial, machine learning. Temos bilhões de informações aqui dentro nós precisamos saber usar isso melhor para melhorar a performance do banco. Também há um terceiro campo que a gente está investindo também que tem um lado que vem das startups, das fintechs, das bigtechs, que é a questão da experiência do usuário. Colocar o cliente no centro é mudar para atender a real necessidade do cliente. Esse é um exemplo dessas carreiras, precisa de especialistas no cliente.

Entre as fintechs que surgiram, o Nubank chama bancos tradicionais de dinossauros. Como você enxerga essa imagem que banco tradicional tem na cabeça do jovem?
Sergio Fajerman: estamos muito atentos ao que está acontecendo, sem abrir mão do legado. Esse vai ser nosso desafio. No nosso Centro Tecnológico (CT), há o mesmo modelo de layout que o Nubank ou de uma empresa de tecnologia. Espaço aberto, pessoas trabalhando em comunidade, você tem os squads (pequenos times multifuncionais). A área de recursos humanos hoje trabalha em squad. Ninguém mais tem lugar marcado. É claro que não quero vender sonhos. Trabalhar numa startup não é a mesma coisa do que trabalhar num banco de 90 anos. A regulação não é a mesma. Tem uma questão de escala. Você ter 100 mil pessoas e um legado, uma história de aquisição de outras empresas que vêm com sistemas diferentes, não é a mesma coisa, naturalmente é diferente. A arte está é manter os valores que nos trouxeram até aqui sem ficar para trás em relação às novidades, esse é o maior desafio. Sermos grandes e ágeis.

Quais as vantagens de trabalhar em uma empresa com 100 mil funcionários e 50 milhões de clientes?
Sergio Fajerman: Outro dia, eu estava conversando com um jovem que tinha vindo de uma startup e está trabalhando na área de tecnologia aqui do banco, ele estava encantado. Me disse que quando você tem uma startup e lança um produto você quer que as pessoas testem e fica lá esperando isso acontecer, quando você não tem nome e não tem dinheiro. Não tem insumo. Você lança e quer feedback para poder melhorar. E aqui no Itaú você lança um aplicativo e o piloto é com 2 milhões de pessoas. É muito legal também esse impacto que você pode ter na vida das pessoas.

Que imagem vocês buscam combater ou desmistificar na cabeça do jovem que quer saber como é trabalhar aqui?
Sergio Fajerman: uma pessoa em começo de carreira pode se perguntar se não é uma empresa muito hierárquica, ou muito burocrática. Ela pode se perguntar se será ouvida. Isso que a gente busca combater. A gente tem na nossa cultura um termo que a gente valoriza muito que é: "o melhor argumento é o que vale". O que estamos querendo dizer é que: não importa o teu nível, se tiver o melhor argumento é o que vai valer.

O que pode ser visto como desvantagem de trabalhar em um banco tão grande?
Sergio Fajerman: tem uma questão importante que é que o sistema financeiro brasileiro é muito regulado, e tem que ser assim. Hoje as fintechs estão entrando mais no segmento de menor risco e a gente é um banco universal, estamos em todos os lugares, em todos esses segmentos. Fintechs ainda são monoproduto, ou têm dois ou três produtos. É lógico que tudo isso pode mudar, mas por ora é assim. Isso também é uma característica que tem prós e contras. Estamos sujeitos a milhares de regras, regulações e leis, temos que cumprir todas elas, obviamente, isso traz uma complexidade para o negócio que é maior do que se você está num nicho específico.

Qual o perfil comportamental que dá mais chance de sucesso dentro do Itaú?
Sergio Fajerman: tem um dos nossos valores na nossa cultura que ser fanático por performance. Para trabalhar aqui tem que ter essa motivação por resultado, querer se superar todo dia, tem que ter uma atenção grande aos detalhes. Lidamos com o dinheiro das pessoas, é um ambiente muito regulado. Tem que ter muita atenção a todos os detalhes em todo processo, seja do produto, das questões legais ou de regulação. Tem que ter muita atenção aos riscos envolvidos.

 E a ambição?
Sergio Fajerman: Acho que sim, mas tão grande quanto a ambição a gente tem um valor da nossa cultura que é ética inegociável. Tem que ser ambicioso, mas uma ambição do bem, de querer se superar de querer o melhor para o banco, querer o melhor para o cliente. A ambição colocada fora de contexto pode parecer uma coisa agressiva e não é. Acho que todo mundo, empresa e as pessoas, deveria ambicionar se superar todo dia, mas numa boa.

Numa entrevista de emprego, o que você observa num candidato?
Sergio Fajerman: O que eu observo num candidato é se a pessoa está antenada com as questões do mundo, se ela tem as competências técnicas para aquela posição e se é uma pessoa bem articulada. Acho que essa combinação é muito forte. Cultura geral e raciocínio lógico acabam sendo uma boa referência para saber se a pessoa vai ter sucesso. Porque mal ou bem o que a gente faz aqui o tempo todo é resolver desafio, então raciocínio lógico é uma coisa muito importante.

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