Nas redes sociais, filtros e Inteligência Artificial criam versões idealizadas de nós mesmos, borrando a fronteira entre identidade e imagem (SolStock/Getty Images)
Redação Exame
Publicado em 20 de novembro de 2025 às 14h11.
Última atualização em 20 de novembro de 2025 às 14h12.
Por Renata Vegha, Estrategista de Carreira e Marca Pessoal e Fundadora da Farol RV
Todo mundo quer ser autêntico, mas será que estamos mesmo preparados para bancar a nossa autenticidade? Em um mundo que celebra a originalidade, nunca houve tanta gente parecida. A procura pela autenticidade está nos discursos, nos manuais de gestão e até nas entrevistas de emprego. Mas basta um olhar mais atento para perceber que a busca por ser “diferente” está produzindo pessoas cada vez mais iguais.
Nas redes sociais, esse paradoxo ganha forma: filtros e Inteligência Artificial criam versões idealizadas de nós mesmos, borrando a fronteira entre identidade e imagem. Segundo a Academia Americana de Cirurgia Facial, Plástica e Reconstrutiva, 55% dos cirurgiões faciais atenderam pacientes que queriam melhorar a aparência para aparecer em selfies. No Brasil, os dados ganham uma dimensão maior, uma vez que somos o país que mais realiza cirurgias plásticas no mundo. Vivemos, ouso dizer, uma era em que a distorção de imagem virou uma tentativa de solução para um problema de identidade.
Há uma dissonância entre o que se é, o que se acredita ser e o que os outros percebem. É justamente aí que entra o branding pessoal, uma prática que ajuda a reduzir essa distância e a responder a questão: qual é a sua marca no mundo?
Em um processo de personal branding, são aplicadas pesquisas para avaliar a percepção sobre sua imagem e reputação. Ferramentas como o Brand You 360 e formulários específicos permitem comparar identidade e imagem, por meio de questionários respondidos por pessoas do seu convívio (colegas, lideranças e parceiros) que registram suas percepções sobre você. O alinhamento entre seus objetivos e a redução da dissonância entre quem você é e como é percebido é o que torna sua marca pessoal mais assertiva.
Talvez o baixo engajamento nas suas publicações nas redes sociais ou ver pessoas menos qualificadas que você estão sendo entrevistadas pelos jornais, leve você a culpar o algoritmo ou a mídia, como se fossem tiranos. Mas antes de apontar para fora, vale olhar estrategicamente para dentro, e trabalhar seu posicionamento de marca pessoal, para que ele reflita com precisão quem você é e como deseja ser percebido.
Sabe aquela sensação de que você tinha tudo para ter sido promovido e, no fim, o seu colega de trabalho é quem conseguiu o cargo? Muitas vezes, a gente acredita estar fazendo tudo certo, mas sente que “o universo não está ajudando”, quando, na verdade, o que existe é uma dissonância entre essência e posicionamento. Às vezes, o que falta não é visibilidade, mas estratégia: alguém que ajude a se posicionar de forma coerente e a sustentar essa coerência no longo prazo, inclusive quando vierem as críticas. E críticas sempre virão.
Em tempos de cultura do cancelamento, há quem fuja do confronto para manter uma imagem “chapa branca”. Mas qual é o sentido de só falar o que é consenso, de, com o perdão da expressão, “chutar cachorro morto”? A unanimidade é inimiga do posicionamento.
Às vezes, um hater é o melhor indicador de coerência, porque mostra que você está se colocando, assumindo um território, representando um grupo ou uma ideia. O papel da marca pessoal não é agradar a todos, mas ser fiel à própria verdade. Só é criticado quem desafia o status quo.
As pessoas mais interessantes que conheço têm em comum a capacidade de transformar críticas em aprendizado. Elas recebem feedbacks e fazem florescer algo novo, sem confundir o que fazem com o que são. Elas sabem que o valor está em quem você é, e não apenas no que entrega.
Ao mesmo tempo, autenticidade não é o velho “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. Não é rebeldia sem causa, nem coragem de vitrine. É integridade, é agir de acordo com o que se acredita, mesmo quando ninguém aplaude. Em uma era em que parece que todo mundo está colocando melancia na cabeça para parecer diferente, ser autêntico, de verdade, é ter a coragem de bancar suas convicções ainda que isso incomode.
O personal branding, quando bem feito, cria um espelho mais nítido entre o que você é e o que o mundo vê, diminuindo a distância entre intenção e percepção. Porque, no fundo, somos animais sociais, e o produto entre o que somos e como somos percebidos é o que realmente define como o outro se relaciona conosco.
Ao longo da minha trajetória, percebi que os líderes mais admirados e eficazes costumam ser também os mais polarizadores. Não porque buscam conflito, mas porque sabem exatamente o que defendem. E há algo em comum entre eles: a habilidade de resolver problemas. Segundo a pesquisa Global Talent Trends, do LinkedIn, a “capacidade de resolver problemas” segue entre as soft skills mais valorizadas no meio corporativo. Não é coincidência.
Resolver problemas exige coragem, qualidade que só existe em quem age com autenticidade. É o oposto da postura ensaiada: enquanto muitos gastam energia para parecer, o autêntico canaliza energia para fazer. E talvez seja por isso que os profissionais mais respeitados são aqueles que unem coerência e ação – gente que não apenas fala sobre propósito, mas o coloca para trabalhar.
Autenticidade não é uma performance, é uma competência. A resolução de problemas está no ponto de encontro entre o que se pensa, se diz e se faz. Em um mercado que recompensa quem se adapta, o diferencial real está em quem sustenta sua essência mesmo sob pressão, e entrega resultado a partir dela.