Executivo: CDO (Chief Data Officer) é uma espécie de "embaixador" do big data numa empresa (Thinkstock/from2015)
Claudia Gasparini
Publicado em 5 de agosto de 2016 às 16h47.
São Paulo — Numa tarde preguiçosa de domingo, enquanto você interage nas redes sociais, brinca com o seu smartphone ou assiste à sua série favorita na Netflix, pode até parecer que você não está fazendo nada. Mas você está produzindo — e muito.
Conectados à rede, todos nós estamos gerando quantidades gigantescas de dados sobre nossas preferências, necessidades e hábitos de consumo. O resultado disso, conhecido como big data, vale ouro para as empresas.
O uso inteligente desse oceano de informações é explica o sucesso estrondoso de empresas como Uber e Airbnb. Mas o fenômeno não se limita às startups “moderninhas”: a necessidade de gerir estrategicamente o big data está criando um mercado de trabalho pujante nos mais variados contextos e setores.
A carreira de CDO (Chief Data Officer) é uma das mais promissoras desse universo. O cargo pertence ao grupo “C-level”, que inclui posições mais conhecidas como CFO (Chief Financial Officer), CTO (Chief Technology Officer) e CEO (Chief Executive Officer).
Profissionais com esse termo no cartão de visitas ainda são raros. No Brasil, estima-se que haja entre 15 e 20 pessoas com o título, segundo uma pesquisa da Gartner, empresa de pesquisa do mercado de tecnologia da informação.
O cientista da computação Mário Faria foi o primeiro CDO da América Latina e um dos primeiros do mundo, segundo o MIT. Ele foi nomeado para o cargo em 2011, quando trabalhava na Boa Vista Serviços. Hoje, é vice-presidente de uma equipe da Gartner que apoia o trabalho de CDOs em diversas frentes.
A carreira surgiu em meados de 2004, e tem crescido exponencialmente nos últimos anos. Segundo Faria, em dezembro de 2014, havia 400 profissionais com o título; no mesmo mês de 2015, o número passou para 900. Em julho de 2016, já se registravam cerca de 1.500 pessoas com o cargo em todo o mundo.
“A grande mudança foi transformar uma área tradicionalmente subordinada ao departamento de tecnologia em uma diretoria independente e de enorme valor estratégico para o negócio”, explica Jaime de Paula, CEO da Neoway, empresa especializada na criação de soluções de inteligência de mercado.
Segundo ele, a ascensão dos CDOs mostra que as empresas têm percebido que a gestão do big data não pode ser desconectada da estratégia. “Elas precisam de uma figura menos técnica, que faça a ponte entre a área de TI e os objetivos do negócio”, diz.
Formado em sistemas da informação, Michel Ávila é CDO da Neoway desde junho de 2015. Seu papel é cuidar da qualidade dos dados e da criação de novos produtos, serviços e modelos de negócio a partir da análise dos dados.
“Para trabalhar como Chief Data Officer, você não precisa ter experiências passadas na área, mas é fundamental que tenha consciência da importância dos dados para a estratégia dos negócios", explica. "Você precisará ser um evangelizador desse princípio dentro da organização”.
Uma das competências comportamentais mais relevantes, segundo Ávila, é justamente a capacidade de comunicação e persuasão. Como a área ainda é recente e pouco conhecida, o CDO precisa fazer um trabalho de convencimento sobre a dimensão estratégica dos dados. Ele deve ser uma espécie de embaixador dessa ideia.
O executivo menciona a prudência como outra característica essencial. “É preciso ser cauteloso, porque um dos pilares do trabalho com dados é cuidar da segurança, da privacidade e da governança dos dados”, explica.
A proatividade é a terceira competência comportamental lembrada por Ávila, já que uma das missões mais importantes é “caçar” oportunidades de negócios a partir do big data.
Do lado técnico, há menos requisitos do que se poderia imaginar. Segundo um relatório de maio de 2016 divulgado pela Gartner, apenas 9% dos CDOs vieram do departamento de TI. “Basta que você tenha certas noções de estatística, especialmente para a criação de modelos preditivos, e tenha familiaridade com inteligência artificial”, afirma Ávila.
Para Mário Faria, o primeiro CDO da América Latina, qualquer executivo pode ser alçado ao cargo, desde que atenda à principal exigência: ser capaz de conduzir a área de forma estratégica.
“A função que ele desempenha é a de um líder, não de um técnico”, explica. “É importante que você compreenda o ferramental de TI, mas seu foco será influenciar outros líderes para usar o big data nas decisões estratégicas do negócio".
É claro que ajuda já ter trabalhado direta ou indiretamente com análise de dados. De acordo com a Gartner, 63% dos CDOs trazem essa experiência no currículo.
Embora o big data seja um ativo relevante para empresas de praticamente todos os segmentos, alguns empregadores têm demanda mais intensa por diretores da área.
É o caso de seguradoras, bancos e empresas de TI, varejo, bens de consumo e telecomunicações, que tipicamente trabalham com grandes volumes de informações. Governos de cidades, estados e países e até exércitos também oferecem cada vez mais vagas para CDOs e outros cargos correlatos.
A contrapartida financeira pode variar muito. Segundo Faria, a depender do porte do empregador, a remuneração total de um Chief Data Officer, no mundo, pode ir de 350 mil a 2 milhões de dólares por ano.
A valorização salarial desse profissional tem a ver com a percepção de seu impacto para o negócio. “Além de melhorar a gestão de riscos da empresa, o CDO ajuda na redução de custos e na busca por receitas adicionais, graças à otimização de campanhas e ao mapeamento de novos produtos e mercados”, explica o VP da Gartner.