Alessandra da Costa, diretora de RH da Natura: empresa tem dificuldade para encontrar profissionais especialistas em cosméticos e em sustentabilidade (Omar Paixão)
Da Redação
Publicado em 28 de novembro de 2013 às 12h40.
São Paulo - O Brasil deve crescer a uma taxa média de 5,9% por ano até 2014, segundo previsão do Ministério da Fazenda. Esse crescimento, se confirmado, deverá se traduzir em mais empregos e na necessidade cada vez maior de mão de obra qualificada. Hoje, muitas empresas já enfrentam dificuldades para contratar especialistas — profissionais com formação específica e vários anos de experiência, que dificilmente podem ser repostos da noite para o dia. Segundo pesquisa da Right Management, consultoria especializada em gestão de talentos e carreira, 64% das companhias no Brasil encontram problemas para preencher cargos.
A carência de especialistas não se deve apenas à expansão da economia. Essa situação ocorre também pelas características dos jovens profissionais de hoje — da chamada Geração Y —, que têm pressa de fazer carreira e não hesitam em mudar de emprego quando encontram outra oportunidade de ascensão mais rápida. Com isso, as empresas não têm tempo de formar os especialistas de que necessitam.
“Hoje, é mais difícil segurar o profissional com esse perfil por muito tempo”, diz Elaine Saad, presidente para a América Latina da Right Management. “Não é só salário que segura esses jovens. Clima organizacional, oportunidade de carreira e uma boa relação com a chefia direta são fatores muito importantes para mantê-los na empresa.”
Para suprir a necessidade de especialistas, as companhias precisam investir no treinamento dos profissionais. “Não adianta achar que basta pegar gente formada em boas universidades. Esses já têm emprego garantido”, diz Elaine. Para ela, o investimento deve ser anterior à faculdade, recrutando futuros funcionários nas escolas de Ensino Médio e ajudando a bancar a formação dos jovens. É o que tem feito a Stefanini IT Solutions, empresa de produtos e serviços em tecnologia.
Com 9 000 profissionais em 19 países onde atua, a companhia precisa ampliar o número de funcionários conforme a demanda de novos projetos por parte dos clientes. Para preencher essas vagas, criou, há três anos, o Programa de Formação de Talentos, que capacita alunos de escolas técnicas e de cursos de graduação. “Calculamos uma base de três pessoas em treinamento por vaga, porque, mesmo durante o programa e logo após ele, antes de contratar os meninos, perdemos muitos deles para concorrentes, que veem uma boa oportunidade em atrair jovens já treinados”, diz Ana Carla Botelho, gerente corporativa da Stefanini.
Formando aprendizes
Na indústria farmacêutica EMS, a principal fonte de profissionais é o programa de aprendiz. Atualmente, são 100 jovens de 16 a 18 anos que trabalham em diferentes áreas da companhia. “Os estagiários que chegam aqui já têm uma condição social melhor e muitos enxergam a empresa como apenas um emprego.
Os aprendizes, diferentemente, reconhecem uma chance efetiva de melhorar de vida, pois a maioria vem de uma família com subemprego, com pais que não tiveram oportunidade de estudar”, diz Marta Misina, diretora de recursos humanos da EMS. Os jovens ficam no programa por dois anos. A empresa ajuda a custear os estudos, inclusive de idiomas. Quando completam 18 anos, eles são contratados em cargos de assistente. “A adesão desses funcionários é de quase 100%”, afirma Marta.
Um exemplo é Edson Ribeiro de Souza, que entrou na EMS há 20 anos no programa de aprendiz como office boy. Hoje, é gerente de planejamento de produtos. Souza recebeu auxílio da EMS para se formar em administração de empresas. “A ajuda da EMS foi fundamental para eu concluir os estudos”, afirma o executivo.
A fabricante de cosméticos Natura também enfrenta problemas para contratar profissionais especialistas em algumas áreas. “São poucas as empresas do setor de cosméticos no Brasil”, diz Alessandra da Costa, diretora de RH da companhia. Por isso, a Natura tem como estratégia preencher ao menos 80% das vagas internamente. Para os outros 20%, acaba buscando no mercado ou na concorrência.
Em algumas áreas, como sustentabilidade, não há profissionais prontos no mercado, já que eles precisam ser bons em relacionamento e conhecer muito do negócio. Pensando em formar esses profissionais, a Natura lançou, no fim de 2009, a chamada para seu programa de trainees nas redes sociais, sem identificar seu nome, mas destacando seus princípios de responsabilidade social e ambiental. “Decidimos não nos importar com a qualidade da universidade do candidato, se falava ou não outro idioma. Escolhemos os trainees por identificação com nossos valores, pois acreditamos que isso fará com que eles permaneçam aqui”, diz Alessandra.
Carreira em Y
Em algumas empresas, o desenvolvimento da carreira em Y, também chamada de gestão de carreiras paralelas, foi a alternativa encontrada para manter especialistas. Se antes somente quem seguisse a trajetória administrativa conseguia ascender, hoje as companhias preveem plano de carreira equivalente ao pessoal da área técnica. Na Duas Rodas Industrial, produtora de matéria-prima para a indústria alimentícia, o plano de carreira em Y foi implantado há três anos. “Temos dificuldade de conseguir p
essoas prontas para as áreas de processos industriais e de pesquisa e desenvolvimento. Por isso, optamos por treinar internamente o pessoal”, diz Antonio Clodoaldo de Azevedo, gerente de RH da Duas Rodas. “Agora, nutricionistas, engenheiros químicos, químicos, engenheiros de alimentos e outros profissionais técnicos poderão chegar ao cargo de pesquisador sênior, que corresponde a um gerente sênior, o maior status aqui dentro.”
A Duas Rodas tem 1 068 colaboradores na matriz, em Jaraguá do Sul (SC). Na área de pesquisa e desenvolvimento, são 116, dos quais 15 optaram pela carreira em Y. “Em média, eles têm 16 anos de experiência e, para optar pela carreira em Y, precisam cumprir requisitos de formação, desenvolvimento e performance”, diz Azevedo.
Em alguns casos, a manutenção de bons especialistas depende fundamentalmente do bom relacionamento entre a chefia e a equipe. Recentemente, um concorrente tentou atrair os oito médicos de uma mesma equipe do laboratório paulistano de análises clínicas Salomão & Zoppi. “Foi a gestão individual por parte do líder dessa equipe que conseguiu segurar sete deles”, diz o médico Luís Salomão, sócio do laboratório.
No Salomão & Zoppi, cada divisão conta com seu próprio líder de gestão de pessoas — um médico sênior —, que tem participação nos lucros e autonomia em sua área para negociar salários. “Cada uma das seis áreas tem um líder, que é um médico de notório saber, respeitado por seu grupo e pela comunidade médica brasileira. Por isso, ele consegue agregar sua equipe e atender à demanda individual de seu pessoal”, diz Salomão.