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Por que CEOs devem se preocupar com o futuro do jornalismo?

Durante o SXSW London, líderes da mídia alertaram CEOs: enfraquecer o jornalismo ético ameaça não só a democracia, mas também a estabilidade dos negócios em uma era de desinformação e inteligência artificial

Jornalismo; jornalista (Xavier Lorenzo/Getty Images)

Jornalismo; jornalista (Xavier Lorenzo/Getty Images)

Oficina Consultoria
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Autor colaborador

Publicado em 20 de junho de 2025 às 10h04.

Na última semana, durante o SXSW London, uma das discussões mais relevantes para o mundo corporativo não partiu de painéis sobre inovação tecnológica ou inteligência artificial, mas de uma conversa sobre confiança, transparência e liberdade de imprensa. Executivas que lideram veículos como NPR, The Guardian e The News Movement alertaram sobre um cenário que deveria estar no radar de todo CEO: o enfraquecimento do jornalismo ético e imparcial ameaça não apenas a democracia, mas também o ambiente de negócios.

Katherine Maher, CEO da NPR, lembrou que metade da audiência da emissora hoje vem do digital, com um público mais jovem e politicamente diverso. Esse movimento demanda novas formas de narrar, informar e, principalmente, ouvir. Anna Bateson, do Guardian, destacou a responsabilidade dos veículos em cobrir temas que transcendem fronteiras, como clima e justiça social, com clareza e credibilidade. Já Rebecca Hutson, da The News Movement, lembrou que sua audiência, majoritariamente entre 18 e 35 anos, é nativa digital e exige total transparência sobre a origem e os interesses por trás de cada informação.

Essas lideranças concordam que imparcialidade não significa neutralidade apática, mas sim pluralidade com responsabilidade editorial. O jornalismo ético não deve mascarar os conflitos, e sim expô-los com método, fontes claras e explicações sobre por que determinadas vozes foram ouvidas. A ideia de imparcialidade evolui para algo mais sofisticado: criar espaços seguros onde o leitor reconhece que pode confiar na integridade da curadoria, mesmo que discorde do conteúdo.

O impacto desse cenário para o setor privado é direto. Democracias sólidas geram mercados estáveis. Sociedades bem-informadas consomem com mais consciência, exigem mais das marcas e se engajam com maior profundidade. Onde a imprensa é forte, há menos polarização, mais participação cívica e maior confiança em instituições. Onde a imprensa é deslegitimada, cresce o ruído, a radicalização e a imprevisibilidade. CEOs que operam em contextos assim perdem mais que reputação. Perdem previsibilidade e licença social para operar.

Além disso, há o avanço da inteligência artificial e seus efeitos no ecossistema da informação. A discussão sobre o uso de IA generativa nas redações esbarra em um problema central: os dados utilizados para treinar os modelos trazem vieses históricos, invisibilidades e lacunas culturais profundas.

Maher mencionou que, quando liderava a Wikipédia, apenas 20% dos artigos sobre pessoas eram sobre mulheres, e menos de 5% dos textos sobre a África haviam sido escritos por africanos. A tecnologia, sozinha, não corrige desigualdades. Reproduz. Por isso, empresas de mídia que prezam por diversidade e transparência precisam ter protagonismo nesse debate. E empresas de outros setores precisam reconhecer que são parte interessada em garantir que a IA se desenvolva a partir de bases informativas sólidas.

A confiança na mídia tradicional vem sendo substituída por relações construídas de forma horizontal, entre pessoas que se identificam e validam umas às outras nas redes sociais. O desafio para as marcas e veículos será reconstruir essa confiança com base em coerência, clareza e engajamento real. A nova geração não quer apenas receber notícias. Quer entender como as decisões editoriais são tomadas, como as fontes são escolhidas e por que determinadas narrativas ganham mais espaço que outras. Mostrar esse processo é hoje uma forma de prestar contas e reforçar a legitimidade.

O futuro do jornalismo e o futuro dos negócios estão interligados. Em um mundo onde a desinformação circula com velocidade e a confiança se fragmenta, apoiar o jornalismo imparcial, transparente e responsável não é um ato de caridade ou posicionamento institucional. É uma decisão estratégica que molda o ambiente em que sua empresa vai operar nos próximos anos.

*Este artigo foi escrito por Patrícia Marins, gestora de crises de alto risco reputacional, fundadora da Oficina Consultoria (www.oficina.ci), cofundadora do WOB (Women on Board) e autora do livro “Muito além do media training, o porta-voz na era da hiperconexão”.

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