Carreira

Os 17 segredos de Abílio Diniz, do Pão de Açúcar

Abilio Diniz está dedicando mais tempo de sua agenda para compartilhar suas experiências como empreendedor e executivo. Conheça suas lições essenciais de liderança

Ilustração - Abilio Diniz em frente a vitrais (Marcos Müller/EXAME.com)

Ilustração - Abilio Diniz em frente a vitrais (Marcos Müller/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 21 de março de 2013 às 14h05.

São Paulo - Desde que deixou o dia a dia do Grupo Pão de Açúcar, o empresário Abilio Diniz, de 75 anos, decidiu dedicar parte de seu tempo para ensinar o que aprendeu — erros e acertos — em 52 anos de carreira. Como presidente do conselho de administração desde 2003, ele ainda dá expediente no escritório da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, no centro de São Paulo, mas tem atendido mais convites de universidades para falar aos estudantes.

Há pouco mais de um ano, Abilio também voltou para a sala de aula, na Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP), onde se formou, para ensinar conceitos de liderança aos jovens líderes e aspirantes a gestor.

O curso de 60 horas tem aulas teóricas de negociação, finanças e empreendedorismo. Os alunos estudam casos reais e aprendem a lidar com imprevistos, a motivar a equipe, a superar crises e a identificar e antecipar tendências. 

Nos últimos tempos, Abilio vem se tornando uma referência para os jovens profissionais. Pode parecer estranho que aos 75 anos ele figure na lista dos líderes mais admirados do país.

Todos os anos, o Grupo DMRH, consultoria de recursos humanos de São Paulo, faz uma pesquisa com trainees e profissionais que estão dando os primeiros passos no mercado de trabalho para saber qual é a empresa dos sonhos deles e inclui a pergunta sobre quem é o líder com quem mais eles se identificam.

Abilio apareceu na pesquisa pela primeira vez há dois anos. Na última edição ficou na oitava posição. O empresário, aponta a pesquisa, representa tudo o que os jovens gostariam de poder fazer: ser dono do seu destino. “Ele faz aquilo que quer da vida”, diz Sofia Esteves, presidente do Grupo DMRH.

O empresário também é admirado porque, após décadas de trabalho, não dá sinais de que quer parar. “Sou casado com uma mulher de 39 anos, sou pai de seis filhos [o caçula tem 2 anos]. Nesta altura da vida, eu só posso pensar em continuar fazendo planos”, diz. Com um comportamento arrojado no mundo dos negócios, Abilio tem a admiração dos jovens também na esfera virtual.

Ele dedica parte de seu tempo para compartilhar com seus seguidores nas redes sociais e no seu blog o que pensa sobre temas diversos como liderança, equilíbrio entre vida pessoal e profissional e, claro, esportes. O empresário é obcecado por atividades físicas, é triatleta e adora falar sobre futebol.

Na rede de microblogs Twitter, mantém 133 450 seguidores, possui um canal no YouTube e desde dezembro do ano passado tem uma fanpage no Facebook (facebook.com/abiliodiniz), onde havia 1 600 fãs até o fim de janeiro.  

O Grupo Pão de Açúcar foi fundado em 1948 por Valentim Diniz, pai de Abilio. No fim da década de 1980, ele assumiu o comando das operações. Com o Plano Collor, a rede de supermercados quase foi à falência. As duas últimas décadas foram de reconstrução.

O grupo passou por um processo de profissionalização da gestão e reconstrução da imagem, que estava bastante desgastada. A partir de 2008, o foco na gestão de pessoas ficou mais intenso.

“O varejo é um setor que busca resultados agressivos e é difícil conciliar o cumprimento das metas com a satisfação das pessoas”, diz Joel Dutra, professor da Fundação Instituto de Administração, de São Paulo. Depois de fusões com Casas Bahia e Ponto Frio, a rede se tornou a maior empregadora privada do país, com 160 000 funcionários.


Recentemente, o empresário tentou fazer uma união atrapalhada com o concorrente Carrefour e irritou seus sócios franceses, do Grupo Casino. Depois de uma intensa briga jurídica, o negócio não se concretizou. “Se algo dá errado, o líder pode olhar pela janela e procurar o responsável ou olhar no espelho e assumir o erro. Nessa hora, é preciso ter honestidade e sinceridade”, diz Abilio. 

Há quem questione e critique o modelo de gestão do executivo. Profissionais que já trabalharam com o empresário afirmam que ele comandava o Pão de Açúcar com mão de ferro e que é duro e exigente com seus funcionários — em especial com os executivos.

Porém, há também relatos de colaboradores, em todos os níveis, que garantem que a humildade é uma de suas características mais marcantes e que, em geral, as pessoas trabalham felizes na companhia.

Abilio é um executivo pragmático e com uma visão bem objetiva do mundo. Para ele, fazer o funcionário feliz não é papel somente da empresa. “Só quem consegue equilibrar vida pessoal e profissional e desempenha bem seus papéis na sociedade é feliz”, diz.

Ao mesmo tempo, tem uma preocupação legítima em criar um ambiente de trabalho saudável, com confiança e cooperação. Esses e outros ensinamentos de gestão ele passa aos jovens profissionais nas aulas que ministra na FGV.    

O programa ministrado por Abilio já formou três turmas e tem sido bem avaliado pelos ex-alunos. “Vejo Abilio Diniz como um exemplo de empresário. Depois do curso, consegui equilibrar minha vida pessoal e profissional e até emagreci 10 quilos”, diz Celso Mouta, de 31 anos, diretor operacional do Grupo Singulare, fabricante de estruturas de concreto, em São Paulo. Celso participou do programa para aprender e trocar experiências na gestão de equipe com outros jovens gestores.

Há dois anos, ele era o gerente responsável pelas obras do Rodoanel, projeto que interliga as principais rodovias de São Paulo, e comandava 31 pessoas. “Meu maior desafio era fazer com que elas acreditassem em minhas determinações. Era difícil porque algumas tinham até 20 anos mais do que eu”, diz. A estratégia de Celso foi mostrar que entendia do negócio e que nunca era superficial nas demandas — uma das lições de Abilio.

O jovem executivo conseguiu bons resultados e foi convidado para ocupar o cargo de diretor operacional do Singulare. Hoje, ele comanda uma equipe de 15 pessoas e enfrenta um novo desafio: “Tenho de ajudar a definir os rumos da companhia e gerenciar uma equipe que ainda é imatura e tem poucas referências de líderes”, afirma Celso Mouta.

Jovens líderes

O curso da FGV, assim como programas similares de outras escolas, foi criado para atender a uma demanda de mercado decorrente da velocidade com que as empresas estão renovando seus postos de chefia. Depois de anos praticamente estagnadas, as companhias começaram a crescer amparadas pelo consumo interno e pelos processos de internacionalização, que facilitam a instalação de fábricas fora do Brasil.


Esse ciclo de expansão se acelerou na última década e se mantém em alta. Para preencher os novos cargos de liderança, as organizações passaram a promover profissionais muito bem formados, mas cada vez mais jovens. Foi o que aconteceu com o engenheiro mecânico Gustavo Gotelip, mineiro, de 27 anos.

Quando assumiu o primeiro cargo de liderança, aos 23 anos, ele enfrentou a delicada situação de gerenciar dois profissionais que já estavam na empresa há 22 anos. O tempo de trabalho dos colaboradores quase equivalia à idade dele.

Para driblar a saia justa, Gustavo, que trabalhava em uma fábrica da Ambev, indústria de bebidas, em João Pessoa e liderava outros 90 funcionários, optou por ouvir a opinião dos subordinados mais experientes, pedir conselhos se estivesse em dúvida sobre determinados assuntos e, quando possível, tomar decisões conjuntas. 

Além disso, para conseguir o respeito de toda a equipe, o engenheiro explicava em detalhes todos os processos aplicados na fábrica e os motivos de determinadas decisões. Foi assim que ele conseguiu mobilizar a turma por dois anos e obter bons resultados para o negócio. O sucesso fez o jovem líder ser promovido a gerente de engenharia em outra fábrica da empresa, em Jundiaí, no interior de São Paulo, e administrar uma equipe de 160 pessoas.

Seu talento lhe garantiu mais uma promoção em menos de dois anos — agora ele é gerente de uma fábrica da Ambev no Rio e gerencia 400 colaboradores. “Esse é meu maior desafio profissional. Minha meta é diminuir a rotatividade de funcionários na fábrica. Acredito que assumi esse cargo porque tenho uma boa capacidade de engajar as pessoas”, diz.

Gustavo foi perspicaz em perceber rapidamente seus pontos fortes e fracos, algo que Abilio reputa como uma qualidade do líder. “É importante se conhecer e saber seus pontos positivos e aqueles em que precisa melhorar”, afirma Abilio.

A rapidez com que Gustavo e Celso mudaram de cargo é um reflexo da aceleração das promoções que estão ocorrendo nas principais empresas do país. Se de um lado estão as companhias tentando criar bons chefes, de outro estão os profissionais com pouca experiência que são desafiados a liderar uma equipe e trazer bons resultados para os negócios.

Diante dessa situação, você pode estar se perguntando se as companhias não projetaram que iriam precisar de mais chefes ao longo dos anos e por que não decidiram treiná-los com antecedência. “As crises nas décadas de 1990 e 2000 geraram uma redução de cargos nas organizações e não havia motivos para investir em liderança.

O resultado é que agora faltam líderes”, diz Anderson Sant’Anna, professor e coordenador do núcleo de desenvolvimento de lideranças da Fundação Dom Cabral, em Minas Gerais. Como a expectativa dos analistas econômicos é de que o país continuará crescendo nos próximos anos, prepare-se. 

Para acelerar o desenvolvimento e a maturidade de seus jovens talentos, as empresas estão recorrendo ao mentor. Ele é um profissional mais experiente que pode estar na organização, ou não, e vai orientar o profissional. Os programas de mentoria não são novidade nas grandes companhias. Mas agora eles se tornaram essenciais. Além deles, as empresas investem pesado em treinamento.


Em 2010, a Ambev destinou 26 milhões de reais para capacitar 41 000 funcionários do total de 45 000 colaboradores. O valor investido foi 19% maior do que no ano anterior. “Nossa estratégia é criar um ambiente em que cada pessoa possa se desenvolver e amadurecer”, diz Daniel Cocenzo, gerente corporativo de desenvolvimento de gente da Ambev.

O programa de trainees existe há mais de 20 anos, mas foi só nos últimos três que a prática de mentoria foi incluída definitivamente no treinamento.

Um mentor para chamar de seu 

Ter um mentor foi essencial na vida da administradora de empresas e mestre em economia Roberta Donato, de 27 anos, gerente de logística da Whirlpool, em São Paulo, líder no mercado latino-americano de eletrodomésticos. Seu primeiro cargo de gerência foi aos 23 anos.

“Eu tive de me esforçar para ganhar credibilidade, mostrar que não era uma ameaça aos mais antigos porque era jovem e ainda conseguir bons resultados para a empresa”, diz. Com a ajuda de um mentor, ela ganhou confiança. Em 2010, Roberta assumiu o cargo de gerente de logística da Whirlpool e hoje coordena uma equipe de 75 pessoas.

A preocupação das companhias com treinamento de lideranças é justificada, porque ser líder não é tarefa fácil. No ano passado, uma pesquisa feita em São Paulo com 100 pessoas com idade entre 19 e 44 anos e que trabalhavam em organizações que têm entre 50 e 20 000 empregados mostrou que elas esperam que o chefe seja o profissional que saiba engajar toda a equipe.

Fernando Jucá, doutor em comportamento organizacional pela Fundação Getulio Vargas e sócio da Atingire, firma de treinamento e pesquisas, em São Paulo, acrescenta: “O líder é reconhecido como uma pessoa que sabe engajar pessoas com perfis diferentes para fazer um projeto comum”. A pesquisa verificou, por meio de respostas múltiplas, qual é o papel do líder.

A segunda opção mais votada foi foco em resultados. “De fato, o papel do gestor é estimular sua equipe e extrair o melhor resultado de cada um”, afirma Abilio Diniz.

Mais oportunidades

Para ser uma gestora mais eficiente, a carioca Samantha Pittzer, de 31 anos, diretora de CRM, que faz a gestão do relacionamento com os clientes, da vice-presidência comercial de varejo da Cielo, empresa de meios eletrônicos de pagamento, decidiu fazer um curso de antroposofia, que estuda a natureza humana sob a óptica da moral e é baseada nos conceitos do filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925).

A engenheira de produção assumiu o primeiro cargo de liderança aos 24 anos e passou a gerenciar 60 funcionários. “Eu percebi que o caminho certo não era escolher quem iria trabalhar comigo, mas sim entender melhor esse pessoal. Passei a ouvir quem tinha mais experiência do que eu e incluí-los na construção dos projetos”, conta.

Hoje, seu maior desafio é consolidar sua maturidade profissional e identificar o que é melhor para a companhia. Samantha gerencia 100 pessoas e sabe que toda vez que tem de tomar uma decisão está assumindo um grande risco. “Nem sempre quem toma uma decisão arriscada acerta”, diz a executiva.


A jovem executiva é um exemplo da diversidade de profissionais que fazem parte da Cielo. A organização tem três gerações de colaboradores em seu quadro de funcionários e, para formar suas lideranças, investe pesado em treinamento. No ano passado, foram gastos 3 500 reais com cada colaborador em programas de desenvolvimento profissional.

“Hoje, nosso maior desafio é desenvolver a maturidade e a inteligência emocional dos jovens líderes”, diz Roberto Dumani, vice-presidente de desenvolvimento organizacional da Cielo.

Pessoas maduras são aquelas que se conhecem bem, sabem de seus pontos fortes e fracos e estão dispostas a melhorar sempre. “Apostar no jovem só porque ele é jovem é preconceituoso. As empresas querem profissionais que sejam criativos, inovadores e que tenham energia”, diz Roberto. 

A tendência de lideranças cada vez mais jovens é irreversível. Desde os anos 1990, a progressão na carreira ganhou mais velocidade. Além disso, os ciclos profissionais estão mais curtos. Se na década de 1970 os profissionais ficavam a vida toda em uma única empresa, nos anos 1980 eles passavam 18 anos, em média, na mesma companhia. Hoje, a carreira se encerra em um período entre 12 e 15 anos.

“Por isso, as organizações estão investindo em programas de mentoria para acelerar a carreira dos profissionais e fazer com que eles aprendam a lidar com as situações mais complexas de um jeito mais rápido. É um caminho sem volta”, afirma o professor Joel Dutra, da Fundação Instituto de Administração.

Entretanto, o modelo de liderança tradicional pode mudar. A tendência é haver uma complementaridade de competências de vários profissionais em uma liderança compartilhada. 

No futuro, haverá mais oportunidades de crescimento  profissional por meio de promoções laterais ou participação em projetos — práticas que já acontecem nas empresas de gestão mais madura. “O papel do novo líder será criar ambientes em que as competências múltiplas possam florescer”, diz o professor Anderson Sant’Anna, da Fundação Dom Cabral.

Para encarar esse novo cenário, os jovens gestores terão de estar cada vez mais bem preparados. A contribuição de Abilio vem em boa hora.

O curso em parceria com a FGV formou somente 160 jovens — ainda é pouco. Mas sua iniciativa de compartilhar suas experiências com os gestores mais novos é extremamente importante.

Quem sabe, daqui para a frente, mais executivos se encorajem a seguir o exemplo do empresário dentro das universidades ou nas salas de treinamento das empresas. Os líderes mais jovens, as organizações e o país só têm a ganhar com essa iniciativa. 

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