Telma Rodrigues, diretora de gestão de pessoas do Magazie Luiza: a stratégia minuciosa do Magazine Luiza na sua transferência de Franca para São Paulo fez com que a rede perdesse apenas dois profissionais entre os 200 movimentados (Fabiano Accorsi)
Da Redação
Publicado em 29 de novembro de 2013 às 17h52.
São Paulo - Pense na seguinte situação: um adolescente do interior acaba de ser aprovado no vestibular da capital. Feliz com a mudança de status, passa a procurar nova casa, meios de transporte e embarca na aventura de migrar para a cidade grande.
Agora imagine isso acontecendo ao mesmo tempo com 200 pessoas da mesma família. Eles não são estudantes, mas profissionais — muitos são casados e têm filhos. Qual a chance de algum deles desistir da vida na capital e optar por um curso ali mesmo na cidade de origem? A resposta é 2%.
Apenas dois dos 200 profissionais do Magazine Luiza,rede de comércio varejista, não deixaram Franca — cidade natal da empresa — para acompanhar a rede à capital paulista. A mudança, feita há pouco mais de um ano, fazia parte dos planos de expansão, que incluiu em 2010 a compra de 140 unidades das Lojas Maia, no Nordeste.
Era também preciso aumentar a sinergia entre as coligadas Luiza Cred e Luiza Seg e estar mais próximo do centro de tomada de decisões, onde estão fornecedores, consultorias e instituições financeiras. “Além disso, precisávamos facilitar a questão logística para que nossos executivos pudessem circular com mais agilidade por todo o Brasil”, diz Telma Rodrigues, diretora de gestão de pessoas.
Embora cientes da necessidade de iniciar uma vida na capital, a mudança do Magazine deveria causar o menor impacto possível na vida dos profissionais. A meta era conquistar a adesão de 80% dos funcionários, permitindo um turnover de até 10%. Difícil missão quando se trata de transferir 410 pessoas (profissionais e seus familiares) para uma cidade distante — nada menos que 400 quilômetros.
“Quando se fala em mudar a vida de centenas de pessoas, é crítico que se faça um planejamento detalhado, com uma abordagem correta e, sobretudo, que haja mecanismos de motivação para que elas o acompanhem”, explica Manuel Martins, diretor da Mesa RBL, consultoria de liderança e recursos humanos.
A operação foi dividida em duas frentes. De um lado, um comitê multidisciplinar lidou com a reforma do controle do orçamento e a logística da mudança. Do outro, a área de gestão de pessoas ficou encarregada de cuidar de tudo que impactaria na transferência dos funcionários: comunicação interna, remuneração e benefícios, apoio emocional aos empregados, clima e engajamento da equipe.
“O RH tem o papel fundamental de assegurar que, durante o processo da mudança, todos tenham o nível de conforto suficiente para que não haja sobressalto nem efeito colateral negativo no negócio”, diz Manuel Martins. “É como se fosse colocar a sede em cima de rodinhas e, com uma precisão suíça, trazê-la ao novo local.” Para alcançar esse resultado no tempo adequado, a rede pautou sua estratégia em nove pilares:
Mapeamento
Num primeiro momento, a empresa fez um levantamento socioeconômico de todos os colaboradores que seriam transferidos para definir a quantidade de cônjuges impactados que precisariam de ajuda para recolocação no mercado de trabalho; as escolas, as creches e as faculdades para seus filhos; os tipos de residência e melhores bairros para morar.
Comunicação
Na fase chamada Preparação da Mudança, o foco voltou-se para a comunicação. Era preciso esclarecer o que e como iria acontecer e tirar todas as dúvidas dos empregados, desde o suporte que teriam na mudança até o novo pacote de benefícios. O assunto ganhou um hotsite na intranet para que os funcionários pudessem acompanhar o andamento da mudança.
A partir de agosto de 2010, as equipes começaram a se preparar para o mês seguinte, quando o primeiro grupo seria transferido. “Realizamos o dia da faxina, em que todos fizeram uma verdadeira limpeza em seus arquivos e documentos”, diz Telma.
Incremento do pacote de benefícios
Os funcionários transferidos receberam 25% a mais de salário. A rede garantiu também fiança de todos os imóveis que precisaram ser alugados por funcionários na capital.
Suporte imediato
A empresa alugou um hotel em São Paulo para acolher o grupo no período em que alguns funcionários passaram dias na capital para conhecer a cidade e fazer um reconhecimento melhor.
O hotel foi a moradia das famílias durante 30 dias até que fizessem sua mudança definitiva. Os empregados mais jovens, que em Franca moravam com os pais e precisariam montar suas casas do zero, ganharam o kit lar — peças como fogão, geladeira, cama etc. Parte do valor foi subsidiado pela rede.
Mais conforto
A nova sede também prometia ser mais bonita e confortável. Para manter os laços com a cidade de origem, a empresa reestruturou o site de Franca, num ambiente mais moderno, e batizou alguns corredores com nomes de logradouros famosos da cidade, como Praça Nossa Senhora da Conceição. Além disso, o escritório paulistano oferece uma academia de ginástica com professores e treinamento de corrida, serviços de manicure, cabeleireiro e cadeira shiatsu para os funcionários.
Transporte
O trânsito na capital é bem diferente do de Franca. Pensando nisso, a rede investiu em dois pontos para facilitar a locomoção de seu pessoal. O primeiro foi a oferta de vans entre a sede — localizada na Marginal Tietê — e o metrô mais próximo, nos horários de chegada, saída e durante o almoço. O segundo foi a criação do programa Carona Amiga, com um sistema na intranet que permite que as pessoas combinem de ir juntas para Franca no fim de semana para visitar a família ou para ir e vir do trabalho.
Apoio emocional
Uma psicóloga foi contratada e colocada à disposição das pessoas — funcionários e seus familiares — que tiveram dificuldade de lidar com a transição.
Transição
A transferência foi dividida em três etapas e só chegou ao fim quando o último caminhão de mudança deixou o depósito do novo escritório em São Paulo. Durante seis meses foi realizado o Período de Transição, que durou até julho de 2011 e contou com o acompanhamento da diretoria de gestão de pessoas.
Nessa fase, diversas reuniões foram realizadas com os funcionários-conselheiros, que trabalham junto às lideranças com o objetivo de cuidar do clima e levantar necessidades da equipe, para que fossem feitos avaliações do processo e levantamento de novas necessidades.
Sustentação
Quase um ano depois de o último grupo chegar ao novo local de trabalho, algumas ações ainda estão em prática, no período que eles chamam de sustentação, antes de dar o projeto por encerrado.
“Agora, estamos na fase de mostrar aos nossos funcionários todas as vantagens de morar em São Paulo, fazendo parcerias culturais e distribuindo ingressos de teatro e shows, estimulando que eles saiam e descubram coisas novas”, diz Telma. “A meta é que a inserção na cidade seja a melhor possível e eles tenham aqui as oportunidades que não tinham no interior.”