Culturas que são só de fachada não resistem ao tempo, às crises, aos desafios do mundo contemporâneo. Elas precisam ser verdadeiramente praticadas pela liderança. Mais do que isso, precisam ser disseminadas por esse grupo (Thinkstock/Thinkstock)
Fundadora e Presidente do Conselho Cia de Talentos/Bettha.com
Publicado em 17 de junho de 2023 às 08h09.
Quem é da minha época, se lembra de uma propaganda lançada nos anos 80 por uma marca de biscoito que propunha uma pergunta até hoje sem resposta definitiva: Tostines vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?
Esse é um dilema de causalidade. Trata-se de uma relação na qual é difícil definir o que é a causa e o que é a consequência, como na famosa questão do ovo e da galinha — afinal, o que veio primeiro?
Outro exemplo que me vem à mente quando penso nessas "dúvidas cruéis" é um relacionado à cultura organizacional: é ela que molda a liderança ou é a liderança que determina a cultura? Qual das duas tem mais influência sobre a outra? Qual veio primeiro?
Para resolver esse impasse, podemos começar recordando duas premissas básicas sobre a cultura organizacional:
Isso significa que, quando uma empresa nasce, ela costuma refletir os valores e as crenças de quem a fundou. As normas, rituais e práticas vão nascendo a partir dessas influências iniciais. Contudo, é natural também que ocorram transformações culturais, como a impulsionada pela digitalização dos negócios. E estas, são conduzidas pela liderança vigente.
O que tudo isso quer dizer? Bem, que existe uma relação de interdependência grande entre os dois elementos. Cultura e liderança andam — ou deveriam andar — juntas.
Apesar da cultura organizacional "estar lá" desde o princípio, dela ser a base para uma empresa, a sua constituição e perpetuação dependem da liderança. E, por isso, talvez seja mais importante compreender a consequência que uma gera na outra do que solucionar essa versão corporativa do dilema do ovo e da galinha.
Quando uma cultura não é sólida, líderes destoantes podem causar grandes problemas tanto internos quanto externos. Do lado de dentro, a equipe começa a, por exemplo, receber instruções conflitantes com os valores da companhia, gerando receio, insegurança e instabilidade.
Do lado de fora, uma liderança destoante da cultura organizacional pode abalar a marca empregadora. A percepção de quem é fornecedor, cliente, freelancer, enfim, de quem se relaciona com a marca é de incoerência.
Culturas que são só de fachada não resistem ao tempo, às crises, aos desafios do mundo contemporâneo. Elas precisam ser verdadeiramente praticadas pela liderança. Mais do que isso, precisam ser disseminadas por esse grupo.
Só que para levar essa “palavra” adiante, tais líderes também precisam estar fortes. Afinal, não são raras as vezes em que vimos casos de lideranças adoecidas contaminando a cultura. É quando são criados ambientes de grande pressão e estresse.
Em momentos assim, sobem os índices de absenteísmo e de turnover, enquanto cai o comprometimento com os valores e o engajamento. E, pode ter certeza, a estratégia e o resultado financeiro não passam incólumes a essa bola de neve.
Acho que um grande empecilho para a resolução dos dilemas da marca de biscoitos e do ovo e da galinha é a dificuldade de enxergar os eventos separadamente. Uma comida fresca e uma venda alta parecem estar diretamente conectadas. O ovo e a galinha, de alguma forma, são um só.
Da mesma forma, a cultura organizacional e a liderança deveriam ser indivisíveis: uma relação mútua, uma permuta constante entre as duas partes.
No fim do dia, uma empresa sustentável é aquela que tem uma cultura forte influenciando a liderança, e uma liderança fortalecida perpetuando uma cultura organizacional.