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O assédio moral deve ser considerado acidente de trabalho?

Cinco executivos de recursos humanos contam o que acham da proposta de lei que tramita na Câmara

O assédio moral deve  ser considerado um acidente de trabalho? (Ilustração: Nik Neves)

O assédio moral deve ser considerado um acidente de trabalho? (Ilustração: Nik Neves)

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Da Redação

Publicado em 28 de novembro de 2013 às 12h22.

São Paulo - Quando uma pessoa intencionalmente ofende outra no ambiente de trabalho, ela está provocando um acidente de trabalho.  Pelo menos é o que propõem Ricardo Berzoini e outros quatro deputados autores do Projeto de Lei no 7 202, de 2010, que tramita na Câmara, em Brasília.

Eles pretendem transformar o assédio moral, inclusive de terceiros, em acidente de trabalho, independentemente de a discussão estar ou não relacionada ao emprego. Para a advogada trabalhista Maria Lúcia Benhame, do escritório Benhame Sociedade de Advogados, o projeto de lei é mal escrito e deve gerar confusão.

Afinal, assédio moral é qualquer conduta frequente que tenha o objetivo de ferir a dignidade física ou psíquica de uma pessoa, prejudicando seus afazeres e o clima no emprego. “O assédio gera doenças, como depressão, problemas gástricos e cardíacos, mas não gera um acidente”, diz a advogada.

Para discutir o tema, convidamos Ana Lucia Aguiar Zacariotto, diretora de RH da Plascar; Emilio Creto, diretor de RH da Schahin;  Jorge da Silva Mendes, gerente de departamento de gestão de pessoas da Eletrosul; Luciana Campos Machado, gerente de RH da Sorocaba Refrescos; e Mauricio Alves da Silva, superintendente de RH do Hospital A.C. Camargo.

Luciana Campos Machado, Gerente de RH da Sorocaba Refrescos:

É complicado considerar assédio moral como acidente de trabalho porque as consequências do assédio moral, que são as doenças psicológicas, podem ter várias vertentes. E, no momento de afastar o profissional, o médico do trabalho é incapaz de analisar se a doença apresentada tem relação com a empresa ou com algum fator externo. O assédio moral é subjetivo, é diferente de uma contusão ou de um dano físico, cuja causa é fácil identificar. Quando um funcionário se afasta pelo INSS sob o código de acidente de trabalho, ele tem de 15 dias a um ano de licença, com estabilidade no emprego. Nesse período, a corporação continua recolhendo o INSS, o que aumenta o custo. Nós já tivemos uma denúncia de assédio moral. Foi o caso de um chefe que tinha uma postura mais dura com a equipe, mas o assédio moral não foi comprovado. Para evitar essas situações, os líderes seguem um código de conduta, recebem treinamento e são avaliados pelos superiores quanto à gestão de pessoas. E os empregados têm um canal direto com o presidente e com o RH se quiserem denunciar alguém.


Emilio Creto, Diretor de RH da Schahin:

Para ser acidente de trabalho, é preciso haver um fato, um nexo e um dano. Por exemplo: alguém caiu de algum lugar (fato) porque não estava preso (nexo) e quebrou o tpé (dano). Se o assédio moral virar acidente de trabalho, será difícil comprovar o fato e o nexo. Além disso, para configurar assédio moral, o fato precisa se repetir várias vezes. Aí começa uma discussão sem fim, que dará espaço a advogados ou exploradores da Previdência que desejam a estabilidade do INSS para ganhar sem trabalhar. Aliás, já existe empresa vendendo seguro contra assédio moral para as corporações. Mas há casos e casos. Pode ser que uma pessoa seja tão assediada, há tanto tempo, que ela esteja doente e nem perceba. Acho que o governo está fazendo isso para obrigar as empresas a se prevenirem, assim como se previnem dos acidentes de trabalho distribuindo equipamentos de proteção. Afinal, as empresas pagam de 1% a 3% de Seguro de Acidente de Trabalho conforme o risco em seu ambiente de trabalho. O problema é que a maioria já trabalha para ter um bom clima.”

Ana Lucia Aguiar Zacariotto, Diretora de RH da Plascar:

Primeiro, é complicado provar qual o dano que um suposto assédio moral causou na saúde do trabalhador. Segundo, se for provado, o acidente dá ao trabalhador a estabilidade no emprego de até um ano. Mas o funcionário vai querer continuar na empresa em que ele se sente ofendido? Pelo projeto de lei, quem identifica o dano do acidente de trabalho são os peritos do INSS. E, a meu ver, nem todos estão preparados para analisar a doença por assédio moral. Acredito que o assédio moral deve ser discutido na Justiça do Trabalho, onde há espaço para as duas partes se manifestarem. No caso de acidente de trabalho, a empresa pode até recorrer da decisão, mas o assunto é pouco discutido. Além disso, se a companhia tiver caso de assédio moral comprovado, vai aumentar a tributação sobre o Seguro de Acidente de Trabalho (SAT). O problema é que o SAT reflete também os números do setor. Então, mesmo que a nossa corporação tenha um bom trabalho, poderemos pagar a mais por causa das outras empresas do setor.”

Mauricio Alves da Silva, Superintendente de RH do Hospital A.C. Camargo:

A dificuldade começa por identificar o que é ou não assédio moral. Para provar que foi vítima, o funcionário pode buscar testemunhas na empresa, mas raramente alguém irá testemunhar contra o empregador. Outro ponto é que a maioria das empresas já se esforça para ter um bom clima organizacional, como é o nosso caso. E, se o governo transformar assédio moral em acidente de trabalho, ele destruirá um esforço que vem sendo feito há muito tempo — se acontecer injustiças nos processos. Pois tem o caso do empregado que realmente sofre a ofensa moral, mas também pode existir a história da pessoa que diz que foi assediada e é mentira. Se alguém alega assédio moral num tribunal e a empresa é obrigada a pagar por isso, ela se desmotiva a desenvolver um programa de gestão de clima, principalmente as pequenas e médias que estão começando isso agora.

Jorge da Silva Mendes, Gerente de departamento de gestão de pessoas da Eletrosul:

Se o assédio moral for tratado co­mo acidente de trabalho, o funcionário será encaminhado para o INSS, que terá um gasto decorrente de um ato de desrespeito a uma pessoa. O assédio moral deve ser tratado como um direito civil ou judicial, não securitário. Qualquer coisa diferente da agressão física é agressão moral, como uma situação que gere medo, constrangimento e, assim, cause problema psicológico. Mas a doença psicológica, principalmente a depressão, é o mal do século. A pessoa fica doente por causa da criminalidade, das drogas, da escola ruim, do trânsito. E isso não é problema de seguridade social — é como a empresa ou o funcionário lidam com isso. Às vezes, a companhia faz todos trabalharem sob pressão e buscarem resultado a qualquer custo, e os empregados ficam doentes. Se o assédio moral acontece muito na empresa, ele é um problema sistêmico. Por isso, é bom trabalhar a prevenção. Na Eletrosul, fazemos palestras sobre o tema e temos um comitê de ética que analisa qualquer situação que fira nosso código de conduta.

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