Lei de igualdade salarial não considera apenas discriminação por sexo, mas também raça, etnia, origem ou idade (Olivier Le Moal/Divulgação)
Redação Exame
Publicado em 6 de julho de 2023 às 12h42.
Última atualização em 6 de julho de 2023 às 12h49.
Recentemente, em 03/07/2023, foi sancionada a Lei 14.611, que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens. A igualdade salarial entre diferentes gêneros já era uma garantia prevista na Constituição Federal e também na CLT, mas a prática das relações de trabalho e dados estatísticos de diversas fontes, como a PNAD do IBGE, apontam para uma discrepância entre a remuneração de homens e mulheres.
Atenta a essa realidade a nova lei cria mecanismos adicionais de promoção da igualdade salarial e de critérios de remuneração entre homens e mulheres. Nesse sentido, ela define cinco frentes de atuação. São elas:
Parte dessas medidas será regulamentada por norma do Poder Executivo e parte já é contemplada em algum grau pela própria lei, ainda que também nesse último caso seja necessária complementação mediante outra norma.
Entre as medidas já adotadas pela nova lei destaca-se a exigência criada por ela a que as empresas de direito privado com 100 ou mais empregados publiquem semestralmente relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios. Neles, deverão constar informações que permitam a comparação entre salários e a proporção de ocupação de cargos de direção, gerência e chefia preenchidos por mulheres e homens, preservado o anonimato dos trabalhadores.
Além disso, também devem ser fornecidos dados estatísticos sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade, também respeitado o anonimato.
Caso a empresa não cumpra com a obrigação de apresentar o relatório será devida multa no valor de até 3% da folha de salários do empregador, limitado a 100 salários-mínimos.
Se for verificada desigualdade salarial ou de critérios remuneratórios a empresa deverá apresentar e implementar plano de ação para mitigar a desigualdade, com metas e prazos, garantida a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho.
Tratam-se de novas obrigações direcionadas ao empregador com significativo ônus econômico no caso de descumprimento. A aplicabilidade da medida, contudo, ainda parece carecer de regulamentação que defina diversos aspectos sobre o referido relatório, como a quem se destina, o período a ser levado em conta, quais verbas devem ser consideradas, entre outras.
Dentre todos os aspectos a serem regulamentados um merece especial atenção. Imprescindível que os dados que alimentam o relatório possam permitir avaliar se eventual diferença salarial ocorre por motivo discriminatório ou por razão autorizada por lei. Ou caso o relatório não seja suficiente para tanto, que ao menos o empregador tenha a oportunidade de se manifestar a respeito. Caso isso não ocorra, há o risco de situações de diferença salarial consideradas legais sejam entendidas como discriminatórias. Explica-se.
O artigo 461 da CLT prevê a igualdade salarial entre empregados de um mesmo empregador e no mesmo estabelecimento empresarial quando cumpridas certas condições. Para que a igualdade seja devida é necessário que esses empregados:
Além disso, não deve existir quadro de carreira ou plano de cargos e salários, mediante norma interna ou negociação coletiva, na empresa.
Existem, assim, hipóteses que permitem a diferença salarial entre empregados na mesma função. Algumas delas podem ser facilmente verificáveis em relatório, como o tempo de serviço na função e na empresa. Outras, contudo, necessitariam de análise mais detalhada. É o caso da discrepância salarial justificada pelo fato de existir diferença de valor no trabalho realizado pelos empregados na mesma função. É considerado trabalho de igual valor aquele feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica.
A prática do contencioso trabalhista demonstra que mesmo em ações judiciais há dificuldade para definir se dois empregados possuem ou não igual produtividade ou mesma perfeição técnica no trabalho. São diversas as situações que permitem concluir por tais diferenças e seria salutar que isso fosse considerado na regulamentação desse relatório.
O alerta se faz mais vigoroso ainda diante do fato de a nova lei ter estipulado à empresa multa correspondente a 10 vezes o valor do novo salário devido ao empregado discriminado, elevada ao dobro, no caso de reincidência, quando verificada diferença salarial injustificada, não apenas por motivo de sexo, mas também raça, etnia, origem ou idade.