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Quatro executivos brasileiros contam qual o caminho para chegar a um cargo global na área de RH e quais os desafios dessa posição

Juliano Pereira, vice-presidente mundial de RH da Stora Enso: 5.000 funcionários e fábricas na Suécia, na Finlândia, na Ásia e no Brasil sob sua responsabilidade (Omar Paixão / VOCÊ RH)

Juliano Pereira, vice-presidente mundial de RH da Stora Enso: 5.000 funcionários e fábricas na Suécia, na Finlândia, na Ásia e no Brasil sob sua responsabilidade (Omar Paixão / VOCÊ RH)

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Da Redação

Publicado em 2 de julho de 2014 às 08h56.

São Paulo - A paulista Marilia Maya entrou na Western Union há três anos para fazer a gestão de pessoas na América Latina e no Caribe da companhia americana de serviços financeiros. Em 2012, após uma reestruturação organizacional, o time da região (incluindo Marilia) assumiu o comando de todo o continente americano, e o escritório central, até então localizado em São Paulo, foi transferido para Miami, nos Estados Unidos.

A mexida rendeu a promoção do presidente, Odilon Almeida, que de número 1 das Américas passou a responder também pela União Europeia, e da própria Marilia, que assumiu a vice-presidência de recursos humanos para essas duas regiões. Hoje, a executiva cuida de uma área que representa 60% dos negócios, sendo responsável pela gestão de 200 países e territórios, mais de 500 000 pontos de atendimento e 4 000 funcionários.

Até pouco tempo atrás, escaladas como a de Marilia eram bastante raras entre os executivos de RH. O mais comum — e provável — era a nomea­ção de um executivo de mesma nacionalidade da matriz para assumir um cargo com essa abrangência na área de pessoas. No máximo, a oportunidade era dada a outros profissionais latinos.

“Mexicanos, argentinos, chilenos e peruanos já experimentaram essa função”, diz Dominique Einhorn, sócio da Heidrick & Struggles, uma das principais consultorias de busca de executivos do mundo. “Para os brasileiros, no entanto, esse movimento é recente.”

Recente, mas promissor. Marilia não é a única brasileira a ocupar um cargo global em RH. Em abril de 2013, o gaúcho Paulo Amorim se tornou diretor mundial de RH para operações e serviços ao cliente da fabricante americana de computadores Dell.

Um pouco antes, em 2012, Ursula Angeli tinha ocupado a posição de vice-presidente global de recursos humanos da Embraco, fabricante brasileira de produtos para refrigeração, pertencente ao grupo Whirlpool, com operações na China, na Eslováquia, na Rússia, na Itália, no México, nos Estados Unidos e no Brasil.

No fim de 2011, Juliano Pereira já ocupa­va a cadeira de vice-presidente mundial de RH para a unidade de biomateriais da finlandesa Stora Enso, fabricante de produtos à base de celulose e madeira.

Esse movimento não deve parar e não é apenas porque o Brasil está na moda. Além de promover maior diversidade em suas lideranças, as empresas estão percebendo que alçar um brasileiro a esse cargo traz vantagens para o negócio. “Os estrangeiros notam que brasileiros são mais abertos e se adaptam rapidamente às mudanças”, diz Juliano Pereira, da Stora Enso.

Um RH brasileiro também costuma trabalhar de um jeito diferente do americano ou do europeu, e para a área de gestão de pessoas isso pode ser uma vantagem. “É comum um executivo da área no Brasil circular pelas fábricas para conversar com os operários — algo improvável para um finlandês.”

Em busca de visibilidade

Para ser cotado como um profissional apto a assumir uma posição global, o executivo deve, basicamente, investir em dois pilares: educação (e aqui entram, claro, os cursos de idiomas) e relacionamento, este último um ponto estratégico para quem quer crescer.

Ao conhecer mais gente — e gente poderosa —, vai ser possível mostrar suas habilidades, competências e também deixar claro seu interesse em atravessar fronteiras. “Dificilmente uma empresa vai ao mercado buscar um candidato global. Eles são escolhidos a dedo dentro de casa”, diz Magui Castro, sócia da CT Partners, consultoria global de recrutamento de executivos. “Por isso, se o executivo deseja esse cargo, ele tem de aparecer e mostrar que é um profissional capaz.”

Quando ainda era gestor de RH para a América Latina, Pereira fez com que a matriz repensasse a forma como avaliava a região, de “centro produtivo” para “centro gerador de receita”. “Fiz parte de um grupo de trabalho, junto ao CEO mundial, cujo objetivo era traçar a missão da corporação para os próximos 15 anos”, diz o executivo.

Isso lhe rendeu visibilidade e a vice-presidência global de gestão de pessoas. Hoje, ele cuida de 5 000 funcionários diretos e indiretos, fábricas na Suécia, na Finlândia, na Ásia e no Brasil, além de escritórios de vendas espalhados pelo mundo.

Assim como Pereira, os outros três executivos desta reportagem aproveitaram o tempo em que já lideravam a área de pessoas na América Latina ou na América do Sul para estudar culturas e se expor no cenário global.

Ao assumir a gestão de pessoas da Dell para a América Latina, em 2009, e cuidar de 12 países e 16 operações, Paulo Amorim procurou conhecer as tradições locais para criar uma conexão melhor com as pessoas. As conexões foram tão proveitosas que, quatro anos depois, veio a promoção.

A vida global

O desafio do executivo global de RH não é apenas a diversidade cultural — comum a todos os outros profissionais que assumem um cargo com esse escopo. No caso específico do gestor de pessoas, há particularidades na rotina e nos processos que, se ignoradas, podem trazer sérios danos ao negócio.

No Laos, na Ásia, por exemplo, a situação econômica e de trabalho é tão precária que faz com que o RH assuma um papel quase social, segundo Pereira. Na Europa, quase não há rotatividade, ao contrário do Brasil. E, se por aqui o gestor investe num bom pacote de remuneração para reter os trabalhadores, na Europa o desafio é criar planos motivacionais não vinculados a dinheiro.

“Na Europa, você não faz uma reestruturação organizacional sem ter o aval do sindicato, enquanto no Brasil as negociações sindicais se resumem a acordos coletivos”, diz Pereira.

Ao assumir essa posição, o executivo também tem de lidar com uma rotina bem diferente. A começar pelo controle do fuso horário — especialmente quando você lidera operações distantes umas das outras, como Brasil, Singapura e Polônia —, caso de Amorim, da Dell.

Por causa das grandes diferenças de horário, ele adotou uma tática: cada ano é a vez de uma região sacrificar seu horário (e o sono) em prol da comunicação. “No ano passado, fiz as reuniões entre as 18 e as 20 horas deles”, afirma. “Neste ano, será minha vez de estar disponível entre 21 horas e 3 da manhã.”

Além das reuniões em horários nada amistosos, o líder de RH global vai precisar administrar as viagens. Há apenas dois anos no cargo, Ursula, da Embraco, já foi mais de uma vez para os sete países de que cuida. Só para a China foi três vezes. Pereira, da Stora Enso, deverá viajar quatro vezes para a Europa para visitar as fábricas até junho deste ano.

Por causa do ritmo e da nova rotina, pensar na família é fundamental — mesmo antes de dizer sim à posição global. No caso de uma mudança de país, como fez Marilia (os outros três estão sediados no Brasil), a adaptação pode ser difícil. Marilia se mudou para Miami com a mãe idosa, o marido, o filho, o cachorro e a empregada doméstica. O filho demorou algumas semanas para se adaptar à nova escola, e o marido deixou o negócio próprio no Brasil.

Embora haja alguns sacrifícios pessoais, a posição de RH global pode aproximar o profissional de lugares mais altos no mundo corporativo. Ao alcançar esse cargo, o executivo de gestão de pessoas pode cogitar a liderança total da área de RH e — por que não? — até a presidência. Uma vez lá, o céu é o limite.

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