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Mês do Orgulho: Como ser uma empresa aliada - de verdade

Sônia Lesse, especialista em Diversidade e Inclusão e diretora de Experiências na Profissas, aborda como uma empresa pode ser inclusiva com a comunidade LGBTQIAP+ e a importância dessa ação não acabar com o mês de junho

Sônia Lesse: As pessoas da comunidade LGBTQIAP+ devem participar das ações, mas não é um dever delas resolver a questão da diversidade nas companhias. Isso é um trabalho da liderança (Cris Faga/NurPhoto/Getty Images)

Sônia Lesse: As pessoas da comunidade LGBTQIAP+ devem participar das ações, mas não é um dever delas resolver a questão da diversidade nas companhias. Isso é um trabalho da liderança (Cris Faga/NurPhoto/Getty Images)

Da Redação
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Redação Exame

Publicado em 30 de junho de 2023 às 06h00.

Por Sônia Lesse, especialista em Diversidade e Inclusão e diretora de Experiências na Profissas

Durante o mês do Orgulho LGBTQIAP+, muitas empresas colocam em evidência suas ações de Diversidade & Inclusão. Atividades como palestras, rodas de conversa ou a inserção da bandeira do arco-íris na foto de perfil das redes sociais, por exemplo, entram na agenda das organizações, passando a ideia de que esse ambiente é um lugar seguro, diverso e inclusivo para todas as pessoas.

Levantar questões sobre os grupos representativos é extremamente necessário nas companhias. Todavia, essa sazonalidade não vai minimizar ou erradicar os desafios e as dificuldades enfrentadas pelas comunidades LGBTQIAP+ no mercado de trabalho.

As empresas precisam entender que não podemos restringir o debate sobre políticas inclusivas para a comunidade apenas em junho. Trata-se de uma preocupação genuína, todos os dias, com as estratégias de Diversidade & Inclusão, desenvolvendo os trabalhos de maneira cuidadosa, estruturada e sustentável.

Infelizmente, em pleno século XXI, ainda há muito preconceito vivenciado por pessoas da comunidade LGBTQIAP+ nas esferas sociais, inclusive nos espaços corporativos.

  • Para se ter uma ideia, de acordo com uma pesquisa da empresa Center for Talent Innovation, divulgada pela Catho, 33% das organizações existentes no Brasil não contratariam pessoas LGBTQIAP+ para cargos de chefia.
  • Além disso, 41% dos colaboradores que fazem parte da comunidade afirmam já terem sofrido algum tipo de discriminação.

E é por medo da reação de colegas e de líderes que muitas delas acabam escondendo sua orientação sexual ou identidade de gênero no ambiente de trabalho. Ou seja, ainda é muito comum que pessoas da comunidade LGBTQIAP+ fiquem à mercê de condutas LGBTfóbicas de colegas e lideranças. Por isso, é imprescindível e urgente que as empresas criem trilhas de desenvolvimento, sensibilização e letramento para todo o time, sem exceção.

Mas e aí? Por onde começar a Diversidade & Inclusão?

Antes de iniciar qualquer ação, é necessário que lideranças e RH olhem para dentro da empresa, identificando como está a situação atual do negócio no contexto de uma cultura diversa e inclusiva. Somente após essa avaliação é possível estabelecer metas e objetivos para entender aonde a companhia quer chegar na pauta da Diversidade & Inclusão.

Outro ponto crucial é verificar o perfil da liderança atuante na organização. Mesmo que ela seja ótima no que faz, também é importante entender o seu papel enquanto liderança inclusiva. Não adianta, por exemplo, ter grande experiência em gestão de processos, mas ao mesmo tempo ser LGBTfóbica. Para evitar que ações excludentes aconteçam, as empresas precisam contratar lideranças inclusivas e, em paralelo, desenvolver aquelas que já trabalham no local.

O comportamento de líderes deve ser observado, pois aqueles que possuem atitudes excludentes não permitem que o time seja produtivo, acolhido e respeitado em suas diversidades.  O clima interno da companhia se torna de pressão e coação. As pessoas sairão da empresa e, além do turnover, o negócio precisará lidar com denúncias públicas que impactam o negócio.

Como trabalha a comunicação da empresa?

Investir em diversidade e inclusão significa transformar a cultura organizacional. Tal investimento envolve também a mudança de posicionamento e a comunicação do negócio. Não adianta fazer um post isolado no Mês do Orgulho, afirmando ser uma empresa diversa e inclusiva.

É necessário começar de dentro, educando o time para que ele saiba se comunicar respeitosamente, colocando os princípios e valores da empresa em cada mensagem ou atividades do cotidiano. A diversidade no jeito de se expressar e de se comunicar deve ser lembrada e atendida toda vez que for realizada algum tipo de comunicação no negócio, seja para o público interno ou externo.  Afinal de contas, cada indivíduo se apresenta de forma única para o mundo que o cerca.

Nesse cenário, a linguagem inclusiva surge como forte aliada da diversidade. Ela busca transformar a comunicação para estar mais conectada com a natureza e diversidade da humanidade. É bem comum reproduzirmos, sem notar, preconceitos ao falar e escrever da maneira como fomos ensinados. Por meio da linguagem inclusiva, modificamos padrões enviesados, reducionistas e pouco plurais enraizados na maneira como nos expressamos. Essa preocupação nas organizações transforma também a mentalidade da equipe e todas as pessoas envolvidas nos processos de comunicação.

O respeito à diversidade, por meio da linguagem inclusiva, é uma preocupação crescente nas relações sociais e, portanto, na comunicação das empresas. A pessoa que está à frente da área de recrutamento e seleção de uma empresa, antes de começar a descrever uma vaga, deve usar a linguagem inclusiva para não trazer seus vieses inconscientes à tona, evitando a influência de crenças e preconceitos na descrição do cargo.

A empresa deve mostrar essa preocupação com o tema, deixando explícito o seu compromisso em ser um ambiente inclusivo e diverso. No texto de anúncio da vaga, por exemplo, uma opção é trazer a neutralidade de gênero, não utilizando o padrão dos pronomes “ele” ou “ela”. Em vez disso, usar “pessoa” para fazer referência. Veja: “buscamos pessoas com experiência em gestão de processos”.

Importante destacar: independentemente do nível de maturidade do negócio em relação ao tema Diversidade & Inclusão, é essencial agir com transparência e honestidade. Se a empresa ainda estiver introduzindo uma cultura inclusiva, compartilhe o real estágio de desenvolvimento e convide as pessoas para fazerem parte dessa jornada.

Quem deve introduzir a linguagem inclusiva na empresa?

Ter pessoas da comunidade LGBTQIAP+ participando das ações de Diversidade & Inclusão é imprescindível, pois elas colaboram trazendo realidades que muitas vezes não percebemos, justamente por não sermos indivíduos atravessados por esses marcadores.

Sem sombra de dúvidas, o “achismo” é a pior forma de tratar a inclusão das pessoas nas organizações. No ambiente organizacional, é comum ver que muitas atividades são colocadas em prática, antes mesmo da liderança ouvir as pessoas que precisam ser impactadas com o trabalho.

As pessoas da comunidade LGBTQIAP+ devem participar das ações, mas não é um dever delas resolver a questão da diversidade nas companhias. Isso é um trabalho da liderança.  Papéis e responsabilidades devem ser bem definidos e comunicados, para não replicar violências exigindo que pessoas façam um trabalho do qual elas não foram contratadas para fazer.

Um bom exemplo disso são as organizações que criam um comitê de diversidade para apoiar o time de RH a garantir processos seletivos mais diversos. Com esse comitê, as empresas poderão debater sobre o assunto, buscar evolução, gerar oportunidades inclusivas e fazer do mercado de trabalho um lugar consciente. Mas lembre-se que, mesmo para pessoas que fazem parte, voluntariamente, dos comitês ou grupos de afinidade, as atribuições devem ser bem definidas para não culminar em sobrecarga.

A empresa é mesmo a favor da diversidade?

Uma cultura só se torna inclusiva quando existem estratégias e indicadores do negócio que apontem para os resultados adquiridos. Então, uma empresa não pode dizer que é a favor da diversidade somente com ações isoladas. Isso não significa nada! Dizer ser diversa em junho, apenas com a celebração do mês do Orgulho, é puro marketing! Me mostre seus números: quantas pessoas trans você contratou no último ano? Celebrar é muito importante, mas trabalhar para ampliar as oportunidades para pessoas da comunidade LGBTQIAP+ desmistifica a sazonalidade das ações.

Saiba que ter um time com perfis diversos é uma forma de reduzir as desigualdades sociais e, ao mesmo tempo, estimular as empresas a serem mais produtivas e eficientes. Mesmo que seja um caminho longo e com muito trabalho a ser feito, o importante é não parar de construir e desenvolver esses espaços inclusivos e diversos nas empresas. Seja uma empresa que se orgulhe de suas pessoas nos 365 dias do ano.

O meu desejo, enquanto especialista em Diversidade & Inclusão, é construir um espaço em que todas as pessoas possam ser desenvolvidas, livres em suas escolhas e respeitadas. E você, vem comigo nessa jornada?

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