Ansiedade: De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o Brasil é o país mais ansioso do mundo com 9,3% da população sofrendo de um transtorno (CSA Images/Getty Images)
Victor Sena
Publicado em 22 de janeiro de 2021 às 17h48.
Última atualização em 22 de janeiro de 2021 às 21h57.
A ansiedade já foi apontada como o “mal do século”, virou tema de discussões em mesas de bar e ganhou ainda mais força no Brasil com a crise sanitária da pandemia, como mostram diversas pesquisas sobre a saúde mental dos brasileiros em 2020.
Ela também foi a emoção sentida com mais frequência no ambiente de trabalho, de acordo com a pesquisa “A Comunicação Não-Violenta nas Organizações no Brasil”, lançada pela Aberje.
Além disso, ae acordo com a Organização Mundial da Saúde, o Brasil é o país mais ansioso do mundo com 9,3% da população sofrendo de um transtorno. No entanto, quando ela não é excessiva, não é de todo ruim.
Mesmo que exista um nível de ansiedade em que a pessoa é enquadrada dentro de um transtorno psiquiátrico, especialistas ouvidos pela EXAME destacam que, até certo ponto, é normal sentir ansiedade no dia a dia e no trabalho.
O dicionário Michaelis resume bem a ansiedade, mas só uma frase é pouco.
A definição encontrada nele para a ansiedade é “estado emocional frente a um futuro incerto e perigoso no qual um indivíduo se sente impotente e indefeso”.
Esse estado de medo acontece principalmente pela liberação de adrenalina e cortisol, substâncias que fazem o sangue ir em direção ao cérebro, o coração acelerar e as pupilas dilatarem.
É o seu corpo se preparando para uma luta ou uma fuga. Isso é uma herança biológica da nossa espécie. Os humanos que sobreviveram ao longo dos anos, desde a época das cavernas, foram os ansiosos, que previam riscos e projetavam o futuro.
Na sociedade contemporânea, esse risco é diferente, mas ainda visualizamos ameaças nas situações do cotidiano.
“A ansiedade está relacionada com a sobrevivência. Ela é um alerta de perigo, por isso ela tem relação com o medo. Ela se manifesta em geral quando você se sente ameaçado, e pode acontecer a partir de ameaças reais ou projetadas pela pessoa”, explica a psiquiatra do Hospital das Clínicas de São Paulo Luciana Siqueira.
Essas ameaças projetadas acontecem, de acordo com a psiquiatra, porque o ser humano faz “pareamentos”. Ou seja, cria um paralelo entre a ameaça de um ataque de animal selvagem e o medo de perder um compromisso porque pegou trânsito.
A psicóloga Desirée Cassado, da The School of Life, explica também que a ansiedade patológica surge como consequência da nossa capacidade de linguagem, que é algo extremamente sofisticado, comparado com outros animais.
Com isso, inventamos histórias o tempo inteiro sobre a nossa vida e o contexto em que estamos, gerando imagens conclusivas. Quando essas histórias parecem ter um final ruim, elas viram gatilhos para o corpo entrar no modo ansioso, mesmo não sendo concretas.
Além do medo, outro aspecto da ansiedade é a antecipação. “A ansiedade está relacionada ao estado de antecipação, mas se for para antecipar uma coisa boa, a gente chamaria de excitação, expectativa”, explica Desirée.
“A ansiedade não é um problema em si, está dentro do organismo, é da natureza humana. No entanto, existem condições na qual o indivíduo adoece desse sistema do qual a ansiedade faz parte, e aí entram os transtornos”, explica o psiquiatra Henrique Bottura.
Entre os transtornos de ansiedade, os mais comuns são os de ansiedade generalizada, de pânico, o obsessivo-compulsivo e a fobia social.
O que existe em quem tem um transtorno de ansiedade é uma generalização do risco. Mesmo sem perceber, a pessoa tem um estado de espírito que vê ameaças em tudo.
O que vai diferir a ansiedade saudável da patológica é a intensidade e se há sintomas diferentes do que seria esperado para a situação que os disparou.
Quando ela é positiva, e não atrapalha o dia a dia, funciona como a emoção que regular nossas intenções e ações. Essa é a visão do psiquiatra Henrique Bottura.
“A ansiedade funcional sobe diante de situações que são desafiadoras. Ela estar alta na empresa não significa necessariamente que é um problema. O gestor deve esperar que os profissionais tenham algum nível de ansiedade, para entregar as coisas no prazo, por exemplo”, explica.
No ambiente de trabalho, ela garante responsabilidade, disciplina, comprometimento e foco. O problema é quando isso transborda.
O ambiente de trabalho pode ser tanto positivo como negativo para quem sofre de transtornos de ansiedade. Isso vai depender da cultura da empresa.
Competição e pressão além da conta costumam piorar quadros ansiosos. Também é natural que exista uma certa ansiedade no trabalho porque as pessoas visualizam ameaças como ser julgado, recriminado e perder o emprego.
Na psicanálise, o trabalho pode ser visto como um organizador psíquico. Quando agrega coisas positivas aos funcionários ajuda mais do que atrapalha quem tem questões emocionais.
O psiquiatra Antônio Geraldo da Silva entende que ele pode ser um aliado. “Isso vai depender de qual contexto nos encontramos. Se o ambiente de trabalho é agradável, protegido, a pessoa sentirá prazer e bem-estar. Se o ambiente entristece e traz desânimo, algo não vai bem. Podemos ter relacionamentos com colegas e chefes que nos trazem alegria, bem-estar, sensação de proteção e significado de vida melhor ou podemos ter colegas e chefes que provocam insegurança, mal-estar e falta de proteção.”