Diogo Arrais, professor: A cada dia mais, em vez de seguir o aportuguesamento dos termos e a adaptação ao padrão gráfico da língua (como clube, uísque, estresse e tantos outros), incorporamos a forma de outras (Getty Images/Divulgação)
Redação Exame
Publicado em 22 de agosto de 2023 às 13h39.
Por Diogo Arrais, professor de português (@diogoarrais)
Atenção! O hacker falará. Instantes depois, os mais importantes noticiários estampam as declarações sobre os bastidores da política nacional.
Fato é: as últimas semanas foram repletas desse substantivo estrangeiro. A cada dia mais, em vez de seguir o aportuguesamento dos termos e a adaptação ao padrão gráfico da língua (como clube, uísque, estresse e tantos outros), incorporamos a forma de outras.
Call, meet, bike, dog (doguinhos!), minha “doguinha” é mais dócil que minha cachorra, pois se tem um pet, em um coworking top. Sobram as desprezadas preposições, seguindo o flow... OMG! Tudo sem o mi-mi-mi, no bilíngue do não padrão.
Tudo vale a pena, quando... a compreensão textual não padece das enfermidades relacionadas à clareza, à objetividade. Em tempos de busca por produtividade, as mensagens andam “performando” para “bater a meta” do minimamente compreensível? Está a Última Flor do Lácio à beira de um burnout?
Com a condenação do hacker (o sujeito, mas não o termo), é válida a recomendação dos manuais sobre estrangeirismos, por menor que seja seus números de likes: se houver um termo equivalente em português, prefira-o à palavra estrangeira. Use cardápio, e não menu; padrão, e não standard; primeiro-ministro ou premiê, e não premier; pré-estreia, e não avant-première.
Se o termo estrangeiro já foi incorporado à língua portuguesa na sua forma original, use-o sem itálico. Em geral, esses termos estão registrados nos dicionários e no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras. São palavras de uso amplo, como marketing, blog, startup, royalty, design, download, on-line, off-line, hacker.
Aliás, o bendito hacker tem origem em hack, ou seja, remete a corte, brecha. Refere-se ao sujeito que tem técnicas de invasão de sistemas. Nesse universo lexical, existem o hacker, o cracker (termos registrados em nosso vocabulário oficial). Em saudosos pensamentos, como seria o aportuguesamento da expressão? Pensando nos análogos “basketball – basquete” e “cocktail – coquetel”, talvez assim fosse: “ráquer”. No entanto, isso seria obra dos que se emocionam ao lerem Bechara ou Napoleão.
Como o Google, os hackers e a Inteligência Artificial já se sentaram à mesa do tique-toque, parece que a ortografia não tem mais cadeira. Como língua é uso, sirvam-se! Em um fast-food linguístico, os dicionários deram lugar a um app.
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