Plenário do Senado Federal durante julgamento do processo de impeachment de Dilma (Geraldo Magela/Agência Senado)
Da Redação
Publicado em 6 de setembro de 2016 às 13h46.
Uma das marcas linguísticas do período relacionado ao impeachment é o ANACOLUTO: "O Brasil, ele precisa ser respeitado, Senhor Presidente!".
Figura de sintaxe que consiste na mudança abrupta de construção, que ocorre - como na frase acima - quando um termo é abandonado e fica sem função.
Não consegui contar as inúmeras vezes em que essa quebra sintática ocorreu durante o dia do veredicto.
"Senhor Presidente, o meu sentimento, ele é de dor, mas de justiça."
"A Senadora, ela não tem postura para falar."
"O meu Brasil, ele tem que ser um lugar de honestidade."
Alguns linguistas entendem que é compreensível, na fala, a pessoa recorrer intuitivamente a elementos de ênfase, que vão da entonação ao acréscimo de palavras que - em tese - seriam desnecessárias.
Entendo, por outro lado, que o anacoluto tornou-se moda; tornou-se uma "muleta" e, à visão de muitos, parece ser um recurso sem prejuízo algum, infelizmente.
À condição de um parlamentar, são essenciais a adequação vocabular, o respeito às normas gramaticais, a preparação profissional para a construção de uma argumentação falada e escrita.
No entanto, mais uma vez, viu-se o uso de gráficos difíceis de compreensão; viram-se as impensáveis concordâncias nominal e verbal; viu-se a falta da clareza, a falta da didática; viu-se como convidado de "honra" o anacoluto.
Como certa vez aqui escrevi, esse recurso (na escrita) é para alguém habilidoso e que o faz com coerência. Há um trecho de Gonçalves Dias:
"O forte, o cobarde
Seus feitos inveja"
Sem o anacoluto, o trecho assim fica: "O cobarde inveja os feitos do forte."
Ademais, isso nada tem a ver com a "licença poética". Tem sim a ver com o deslocamento proposital, com a ênfase a uma expressão, vocábulo.
Em outras palavras, por que recorrer informalmente, na fala, a esse recurso? Para nada. É deselegante, desorganiza a estrutura oracional.
Sobre recurso de linguagem, vale muito a premissa: se não for para melhorar o discurso, não use.
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