Carreira

O que o RH terá de fazer num ano incerto como 2012

Esqueça as velhas práticas de atrair, reter e desenvolver. Num ano de incertezas, o RH terá de promover ações inovadoras, como formar profissionais para o mercado, divulgar a imagem de sua empresa e dar mais poder aos funcionários da ponta

Carlos Alberto Griner, diretor de RH da Suzano: ele vai treinar 5 000 pessoas para ajudar na construção da nova fábrica (Marcelo Spatafora)

Carlos Alberto Griner, diretor de RH da Suzano: ele vai treinar 5 000 pessoas para ajudar na construção da nova fábrica (Marcelo Spatafora)

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Da Redação

Publicado em 29 de novembro de 2013 às 13h18.

São Paulo - O cenário para 2012 é incerto. Para os otimistas, o Brasil ainda se mostra a bola da vez, com forte perspectiva de crescimento, impulsionado pela necessidade de infraestrutura e pela iminência dos grandes eventos esportivos. O salário mínimo subirá 14% e o enriquecimento da população tende a aumentar o consumo e, consequentemente, a produção.

Se assim for, as empresas contratarão mais gente, que, novamente, enriquecerá e comprará mais, dando continuidade a um ciclo virtuoso que se iniciou em 2010. Segundo a consultoria Deloitte, nos últimos meses 95% das companhias registraram aumento nos negócios. As outras 5% não ganharam nem perderam. 

Para os pessimistas, o Brasil pode não escapar das projeções drásticas feitas para o resto do mundo, que deve sofrer com o aumento do desemprego e com as dificuldades dos políticos americanos e europeus de encontrar soluções para a crise. De acordo com os economistas da Organização das Nações Unidas, a economia mundial terá um resultado “anêmico”, com projeção de melhora de apenas 2,6% do PIB global. 

Já para os supersticiosos, 2012 é o fim do mundo. A data de 21 de dezembro desse ano foi registrada como sendo o último dia do calendário maia. Para quem não acredita nessa possibilidade, 2012 promete muito trabalho, forçando a elaboração de uma agenda robusta para a área de recursos humanos. A seguir, um planejamento indicado por consultores, acadêmicos e profissionais de RH para quem deseja desenhar o futuro antes que ele aconteça.

Reforce a cultura corporativa

Num mundo cada vez mais globalizado, complexo e imprevisível, aumentam as incertezas, que fazem os acionistas exigirem resultados rápidos. Nesse jogo, quem não entrega sai. Um estudo da Standard & Poor’s mostra que, dez anos atrás, os presidentes das corporações ficavam em média nove anos no cargo. Hoje, ficam três. “A pressão por resultados rápidos aumenta o risco para os negócios e dificulta a sustentação da empresa”, alerta Henri Vahdat, sócio da área de capital humano da consultoria Deloitte.

Para sobreviver nesse cenário incerto, a organização precisa de uma forte cultura corporativa. “A cultura é a forma de a empresa pensar, sentir e agir”, explica o consultor. Ela é superior a qualquer indivíduo e se mantém, mesmo que os principais líderes saiam. E é graças a ela que o funcionário irá atribuir um sentido maior e mais nobre ao seu trabalho, além de apenas cumprir prazos.


Companhias com culturas fortes têm colaboradores mais engajados; e colaboradores engajados promovem a empresa a amigos e familiares, criando mentalmente um equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. “No final de um dia, um mês, um ano, isso fará toda a diferença”, diz Vahdat. A própria Deloitte também tem um projeto mundial para reforçar sua cultura corporativa e fazer com que os 170 000 empregados, espalhados em 700 cidades de 140 países, trabalhem em uníssono.

Antecipe as necessidades

“Tradicionalmente, a área de RH vem sempre correndo atrás do rabo”, diz Christian Orglmeister, presidente no Brasil da consultoria Boston Consulting Group (BCG). Um exemplo claro desse fenômeno se percebe quando os executivos de outras áreas pedem ao RH 20% a mais de pessoas para suprir o crescimento dos negócios. Dada a missão, a área de RH corre atrás da tarefa e, depois de um ano, quando finalmente contrata os candidatos necessários, percebe que a demanda já mudou.

“Um bom planejamento de mão de obra é um dos principais argumentos que o RH tem para falar de igual para igual com as áreas de negócios”, diz o consultor da BCG. Contudo, segundo estudos da consultoria, menos de 20% dos executivos de recursos humanos fazem isso. Se você faz parte dos 80% que “correm atrás do rabo”, é fundamental começar já um planejamento de longo prazo — para três, cinco, sete anos à frente.

Para começar, é preciso olhar a organização para definir a estratégia. Por exemplo, se sua empresa só vende leite, mas pretende comercializar também cerveja nos próximos cinco anos, você já sabe — hoje — que irá precisar de profissionais que negociem com comerciantes menores, donos de bares e restaurantes, um público diferente dos grandes atacadistas com que você se relaciona. Isso implica contratar mais gente — e gente com competências, comportamento e conhecimento, diferentes dos que sua empresa tem hoje.

O exercício não para por aí. É preciso olhar internamente e identificar quantas pessoas dentro de casa podem assumir o novo negócio, quanto treinamento elas precisarão para chegar ao nível desejado e quanto tempo isso levará. As que faltam, onde a corporação buscará? No concorrente? Nas faculdades?


A petroquímica Braskem já tem uma projeção para daqui a três anos: precisará contratar 1 800 empregados, sendo 400 engenheiros e 150 pesquisado es. A companhia de logística ALL, o Citibank e a Johnson & Johnson também têm uma estimativa de longo prazo. Para suprir a demanda, os gestores de RH buscam jovens em universidades, por meio do programa de trainee — e também brasileiros que estão cursando MBA em universidades internacionais.

Segundo a diretora de gente e qualidade da ALL, Melissa Werneck, esses são programas que darão a cara da companhia no futuro. “Se tivermos um ano ruim para um deles, criaremos um buraco na liderança daqui a três ou cinco anos”, diz ela. 

Atrair e reter as pessoas por meio de um pacote de ganhos não funciona mais, principalmente porque salário e benefícios são facilmente copiados pelo concorrente. A estratégia para 2012 é comunicar para o mercado o que a empresa tem de melhor, aumentando a visibilidade como empregador. “O objetivo não é ser forte em tudo, mas se diferenciar onde é mais relevante”, diz Orglmeister, da BCG. Essa é a estratégia da Johnson & Johnson, da Braskem, da farmacêutica Sanofi Aventis e da fornecedora de serviços de call center Contax.

Esta última vem transformando um negócio tradicionalmente sem glamour em algo atrativo para seu público. Ao criar o slogan “Oportunidades para a vida”, Sérgio Piza, vice-presidente de RH, mudou a imagem pesada do call center — de um lugar de ritmo intenso, com pequenos intervalos e alta rotatividade, para um lugar em que dá as primeiras chances de carreira do profissional.

Com essa proposta, muda-se o olhar sobre o negócio. Em vez de enxergar um trabalho que suga sua energia por várias horas consecutivas, por exemplo, você pode ver uma empresa que, por permitir uma jornada de seis horas, contribui para que o jovem estude e continue se desenvolvendo num outro período.

As ligações de clientes rabugentos, por sua vez, são “vendidas” como uma oportunidade de o profissional desenvolver sua técnica de negociação e comunicação. E até a alta rotatividade do setor, tradicional do negócio, ganha outro status — a permanência curta na organização é divulgada como uma fase importante de maturidade nos primeiros anos do profissional.

Afinal, após três anos num call center, você estará bem preparado para trabalhar em qualquer outra corporação. Piza lembra que a Contax não promete milagres. Deixa claro que o trabalho é difícil e o cliente estressa, mas só lá o jovem irá aprender coisas que não aprenderia em outro lugar. 


Esse é um ótimo exemplo de como o RH pode investir na imagem da empresa, seja qual for seu negócio, e aumentar sua visibilidade como empregador, sem mascarar a realidade. O primeiro passo é definir sua proposta de valor. Em seguida, comunicar ao mercado. A Braskem tem até uma equipe de 90 empregados que vão a universidades falar em palestras e promover a companhia.

Dê autonomia nas pontas

“Se você tem cabeças pensantes, a empresa ganha agilidade, fortalece a formação das pessoas e cria um sentimento de ‘dono’ do negócio”, diz Carlos Alberto Griner, diretor de RH da Suzano. Para criar o sentimento de dono, a fabricante de papel e celulose vai dar mais autonomia às pontas. Isso vai trazer a rapidez que a corporação precisa nas tomadas de decisões, fortalecerá o modelo de resultado nas unidades de negócios e, de sobra, ajudará na formação de novos líderes.

Para executar, a Suzano planeja um redesenho da estrutura e o uso de metodologias para definir quais decisões serão tomadas nas pontas e o que deverá subir para a diretoria. O projeto é uma evolução do movimento que começou em 2010, quando a companhia reformulou seus valores e os inseriu na avaliação de desempenho. Hoje, como parte dos gestores está alinhada às crenças corporativas, eles já são capazes de tomar decisões sozinhos. 

Para promover esse dinamismo, porém, é fundamental que a empresa crie um ambiente de liberdade. Só assim as pessoas podem sentir que podem, sem julgamento, colocar suas ideias em prática. Para o professor espanhol José Ramon Pin, presidente do Centro de Estudos Internacionais sobre Organização da escola de negócios Iese, as empresas precisam estimular certo caos.

E isso, na prática, significa duas coisas: a primeira é que os líderes precisam permitir a livre expressão e tolerar o erro; a segunda é que talvez seja a hora de rever a estrutura corporativa.  

Forme líderes modernos

Apenas 6% dos gestores de RH disseram que têm líderes em número suficiente para tocar os negócios futuros da companhia, segundo uma pesquisa da consultoria americana Right Management. Mais do que ausência de líderes, há um apagão de gestores com competências necessárias para tocar os negócios hoje e, mais ainda, no futuro. Pelo histórico do país, o gestor brasileiro é bom em tempos de crise, em gestão de problemas. Quando as condições econômicas são favoráveis, as corporações precisam de outro perfil de liderança.


E aí o buraco aumenta. “O líder, na crise, olha o momento, o resultado imediato, o corte de custo e a rentabilidade”, explica Alberto Mondelli, presidente da consultoria Mercer para a América do Sul. “No crescimento, ele olha o investimento, as possibilidades de compra, e gerencia as pessoas incentivando-as a fazer o máximo. A inovação é o principal tema da agenda no longo prazo.” Cabe ainda a esse líder do presente-futuro permitir o erro e saber dar autonomia.

A tendência para 2012 em termos de liderança é criar um sistema interno de identificação e treinamento de potenciais líderes. Para isso, Mondelli sugere um tripé simples: responsabilizar, confiar e acompanhar. “O gestor de RH deve treinar os líderes para que eles atribuam responsabilidade à sua equipe; deem espaço para que seus subordinados tomem decisões; e acompanhem cada um, para ver se tem algo a antecipar ou adiar.” Isso é baseado na confiança.

Prepare mão de obra para além dos muros

De um lado, um país com má qualidade de educação. De outro, as empresas com carência de gente. “Para 2012, o desafio básico é o conhecimento básico”, diz Orglmeister, da BCG. E aí restam às companhias três alternativas: 1. apoiar as escolas públicas; 2. criar uma escola própria; 3. contratar um professor para ensinar os funcionários, pois nenhum trabalhador será capaz de fazer um treinamento técnico ou operar uma máquina se não souber português e matemática.

Marcelo Arantes, vice-presidente de pessoas e organização da Braskem, acredita que as corporações deveriam se unir e criar uma parceria para formar empregados para o mercado — em vez de competir entre si. “Essa história de roubar gente do concorrente não resolverá o problema do Brasil nem da falta de mão de obra”, diz o executivo. A Braskem está fazendo sua parte.

Arantes identificou em todo o país 21 estabelecimentos, principalmente escolas técnicas, dos quais tentará uma aproximação em 2012. A ideia é valorizar a carreira técnica e, se possível, influenciar a grade escolar. Além disso, a Braskem está desenvolvendo uma área de educação industrial para treinar operadores, mantenedores e engenheiros petroquímicos.


A ALL já tem uma iniciativa similar: criou, em 2008, uma universidade interna, reconhecida pelo Ministério da Educação, que forma engenheiros ferroviários. No fim de um ano, o funcionário entrega um trabalho de conclusão de curso, que, na verdade, é um projeto de melhoria para a empresa.

Na mesma linha de formar para o mercado, a Suzano repensou o projeto de construção da nova fábrica de celulose, em Imperatriz, no Maranhão, que pretende ser a maior do mundo no segmento. Em vez de deixar o projeto a cargo de uma construtora — que levaria para a região gente de fora, se instalaria na cidade e, findo o projeto, iria embora —, a Suzano fez um consórcio com a prefeitura, o Senai, a construtora, os sindicatos e as empresas locais.

Juntos, treinarão cerca de 5 000 moradores para construir a nova fábrica, que tem previsão de operação para novembro de 2013. A ideia é que, ao término da obra, as pessoas poderão ajudar na construção de novos prédios, que devem surgir com o progresso da região. Usando o mesmo método, Carlos Alberto Griner vai treinar mais 150 moradores locais para operar a fábrica depois de pronta. Se der certo, a Suzano deve replicar o modelo para outros negócios.

Reveja a estrutura do RH

“Para ter visão de futuro, o executivo de RH precisa ter funcionários no planejamento”, diz Mondelli, da Mercer. Isso é diferente do modelo de parceiros de negócios, usado por muitos gestores. “Os parceiros de negócios dão apenas parte dessa visão, porque estão perto das pessoas”, explica o consultor. “O RH deve pensar em ter especialistas que conheçam muito temas próprios do RH e sejam capazes de ter um olhar abrangente, acompanhando as mudanças do mercado e vendo como adaptar o plano interno a essas mudanças.”

O Citibank e a Sanofi Aventis estão de olho nessa tendência. O plano do Citi é ter um RH mais voltado ao cuidado das pessoas, com tempo para escutar e ajudar no planejamento de carreira — sempre de olho na estratégia do banco. Já André Rapoport, vice-presidente de RH da Sanofi Aventis, está revendo a alocação das pessoas. “Minha percepção é que tenho muita gente fazendo atividades operacionais e poucas fazendo o estratégico”, diz o executivo. Hoje, sua equipe tem 52 colaboradores (para 5 335 funcionários), sendo 35% no operacional e 65% no estratégico. O plano de Rapoport é mudar 10% de cada lado. Um projeto mundial da Sanofi também prevê novas tecnologias para o RH.


RH, cuide de si!

A consultoria DBM fez, em 2011, uma pesquisa para conhecer quais são os valores pessoais dos executivos de recursos humanos. Descobriu que os RHs priorizam valores nobres, ligados à transformação do indivíduo, como ética, compaixão e envolvimento comunitário, e deixam de lado valores básicos, como a autoestima, segurança e necessidade de amar e pertencer.

“Pelo que vimos na pesquisa, o RH não cuida de si”, diz Cláudio Garcia, presidente da DBM no Brasil. Como tem uma vida social intensa e precisa interagir com os outros para praticar seus valores, o executivo de pessoas se doa demais para os outros. Mas quanto ele doa para si? “Quem cuida dos outros são os que precisam estar mais equilibrados, e para isso precisam cuidar do próprio físico, psicológico e social, ou correm o risco de se desequilibrar”, alerta Garcia. 

O perigo de o executivo de recursos humanos se frustrar, se esgotar fisicamente, ficar doente, deprimido e pedir demissão também aumenta. Por isso, em 2012, o profissional de RH só vai conseguir organizar toda a agenda acima se, antes de tudo, investir em si mesmo. 

Tenha estabilidade intelectual, emocional e financeira para suportar a pressão que virá pela frente. E, pela lista de afazeres, você já sabe que não vai ser pouca.

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