Venezuelanos cruzando a fronteira do país com o Brasil: no país, existem 300 mil refugiados, de diversas nacionalidades (Ricardo Moraes/Reuters)
Victor Sena
Publicado em 5 de fevereiro de 2021 às 14h12.
Última atualização em 5 de fevereiro de 2021 às 14h13.
Venezuelanos, sírios, angolanos. Essas são algumas das nacionalidades que compõem a legião de refugiados que vieram para o Brasil. Hoje, existem cerca de 300 mil pessoas no país em situação já reconhecida de refúgio ou em processo de reconhecimento, segundo a Agência da ONU para Refugiados.
Nos últimos anos, a guerra civil síria e a crise econômica que assola a Venezuela foram algumas das causas dessa migração. Como já tem uma política de abrigo, o verdadeiro desafio do país está em garantir a integração dessa população, principalmente na hora de ter acesso ao mercado de trabalho.
Para vencê-lo, o primeiro passo é reduzir a resistência das empresas em contratar refugiados, de acordo com Paulo Sérgio de Almeida, da Agência da ONU para Refugiados no Brasil. Segundo ele, uma pesquisa de 2019 mostra que 34% da população tem ensino superior ou pós-graduação, mas mesmo assim a inserção é difícil.
Este foi o assunto do Exame Talks "A contratação de profissionais refugiados pelas empresas" desta quinta-feira, que contou com a participação de especialistas do assunto e de uma refugiada.
Por trás dessa barreira, está a falta de conhecimento sobre como é a situação legal de um refugiado. A legislação brasileira garante documentação, como CPF e carteira de trabalho, até para os recém-chegados, que ainda não terminaram seu processo legal de pedir o refúgio.
Eles têm a possibilidade até de ser microempreendedores. Além disso, Paulo Sergio aponta que a revalidação de diplomas do ensino superior é mais um desafio dos empregadores. Segundo a Acnur, apenas 10% da população refugiada está no mercado formal.
Entre os principais benefícios da contração de refugiados estão: mais diversidade nas equipes, inovação e resiliência. Na visão de Paulo Sérgio, refugiados costumam desenvolver inteligência emocional desenvolvida e capacidade de enfrentar dificuldades. Além disso, há mais engajamento e o índice de retenção é melhor.
Empresas que não podem contratar têm a possibilidade de criar programas de treinamento e ações sociais voltadas para a população.
O diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global, Carlo Pereira, defende que as empresas atuem nessa frente:
“O Brasil assinou tratados para que a gente faça acolhimento. Então, é papel das empresas como cidadão corporativo atuar nessa integração. Existe um papel moral”, argumenta. “Uma pesquisa já mostrou que 86% das pessoas acredita que as empresas devem falar sobre temas da sociedade, mesmo que não estejam relacionadas ao seu negócio. 70% entendem que os CEOs devem tomar ações para a sociedade. Há uma expectativa para que as empresas ajudem a endereçar essas questões, como as ambientais e sociais”.
Além dos benefícios para as equipes, como a diversidade, a contratação de refugiados também pode servir de case para as empresas. Esse é o caso do Grupo Renner, que abriu um programa de capacitação para mulheres refugiadas, que já garantiu a contratação de 90 delas.
Eduardo Ferlauto, executivo do grupo, afirma que as políticas de inclusão de refugiados foram bem recebidas pelas equipes. Ele destaca também como é importante a empresa fazer o acompanhamento do processo de integração do funcionário e reforçar qual é a cultura daquele ambiente.
Como o estado de Roraima é o mais afetado pela crise migratória na fronteira da Venezuela, Paulo Sergio de Almeida, da Acnur, entende que é importante “interiorizar” o fluxo migratório de refugiados, ajudando as pessoas a irem para outros estados, onde podem ter mais oportunidades de trabalho.
No Exame Talks desta quinta-feira, a conversa também contou com a presença da venezuelana Elianeth Ramos, que trabalha como auxiliar de logística na Tembici, e é refugiada.
“Eu me senti muito acolhida. Me sinto muito grata. No trabalho, existem valores em comum que nos unem como profissionais."