Carreira

Como são fabricadas as estrelas no Brasil

Por trás do glamour, a carreira das celebridades populares tem ingredientes surpreendentemente parecidos com a de qualquer profissional


	Anitta: "O resultado só chega com muito trabalho"
 (Divulgação)

Anitta: "O resultado só chega com muito trabalho" (Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 13 de janeiro de 2014 às 12h55.

São Paulo - Quando o relógio já passava da 1 hora e 24 minutos de uma madrugada de um sábado de outubro, em uma casa de shows à beira da rodovia Washington Luiz, na cidade de São Carlos, no interior de São Paulo, um locutor anunciou a atração da noite: "Agora, com vocês, a cantora mais poderosa do Brasil". Uma buzina de caminhão toca. "Anitta!", grita o apresentador.

Enquanto a plateia delira, Anitta desfila seus hits. Entre eles está Show das Poderosas, um dos maiores sucessos do Brasil em 2013 — seu clipe tem atualmente 65 milhões de visualizações no YouTube.

A carreira de Anitta começou há quatro anos no Rio de Janeiro e teve um impulso em 2011, quando um de seus shows foi visto pela empresária Kamilla Fialho. "Vi uma artista talentosa, mas que precisava ser aprimorada", diz Kamilla.

Para alcançar a fama, Anitta foi preparada por um ano. Nesse período, frequentou diariamente a academia e fez aulas de teatro, canto e dança. "Ela é muito dedicada e disciplinada", diz a empresária.

No universo pop, qualidade musical e talento não são sinônimos. A afinação da voz, a riqueza da letra ou a complexidade da composição em geral importam menos que o corpo sarado, o volume alto e o refrão pegajoso.

No funk, no axé ou no sertanejo, entre outros gêneros, o talento é mais bem medido pelo potencial de virar um sucesso comercial. de virar dinheiro.  "Tem artista que nem sequer canta bem, mas sabe interpretar", diz Rick Bonadio, produtor responsável por lançar, entre outros, Mamonas Assassinas, Charlie Brown Jr. e NXZero.

 Uma vez descobertos por empresários e produtores, os amadores talentosos recebem um investimento, como ocorreu com Anitta, para aprimorar aspectos técnicos. Para alcançar o estrelato profissional, os projetos de astro passam por um processo de fabricação, muitas vezes intenso, cheio de frustrações e sem garantia de recompensa no final. 


Essa produção depende principalmente do esforço. "É um longo caminho", diz Bonadio. dessa perspectiva, os fenômenos pop têm uma fórmula de carreira comparável à de pessoas comuns — trabalho duro, sem se abater e sem desistir facilmente. 

"Essa é a fórmula de profissionais de sucesso, sejam eles estrelas ou não", diz Maira Habimorad, presidente da consultoria de recursos humanos dMRH, de São Paulo.

Depois de sete anos cuidando da carreira do cantor sertanejo Luan Santana, o empresário Anderson Ricardo decidiu montar uma consultoria que prepara aspirantes ao estrelato para chegar lá.

Os serviços de Anderson incluem um estudo sobre o mercado em que o profissional pode se encaixar melhor, além de uma rede de fornecedores, como professores de música, compositores, músicos, estilistas e até gestão de fã-clube.

A fábrica de estrelas também oferece a experiência de Anderson. Ele indica as casas de espetáculo que são boas pagadoras e as rádios que repercutem mais. Por seis meses desse respaldo, Anderson cobra 300.000 reais. "O artista é um produto que tem de ser rentável", diz anderson.

Atualmente, a consultoria trabalha com nove candidatos a novo Luan Santana. Uma vez selecionados, os artistas trabalham com metas a ser alcançadas, como média de shows, por exemplo. "Minha meta é lançar um novo fenômeno a cada dois anos", diz Anderson.

A construção do sucesso de qualquer profissional tem alguns dos ingredientes presentes na fabricação das celebridades pop. Esforço, disciplina e aprendizado contínuo são as primeiras lições. Mas o método de Anderson Ricardo mostra que há outros aspectos, semelhantes em todas as carreiras.

Um deles é a compreensão de que mercado demanda as habilidades de que o profissional dispõe. Outro é a rede de contatos, que o profissional precisa cultivar para manter pessoas interessadas em contar com seu trabalho. "Permanece no topo aquele que usa o que tem de melhor", diz Fernando Jucá, sócio da empresa de treinamento e desenvolvimento Atingire, de São Paulo.


"Os profissionais mais espertos sabem usar o fato de estar no topo e ter acesso aos melhores profssionais e técnicas para aprender e conseguir aproveitar ainda mais suas competências."

O cantor Roberto Carlos ilustra essa situação. Ao longo da carreira, ele soube aproveitar a fama para fazer contatos e se associar a artistas que fazem sucesso momentâneo. Essa estratégia de troca traz fama ao novo artista e ajuda Roberto Carlos a incluir novas tendências em seu trabalho.

A busca por profissionais do mundo das celebridades não é meramente questão de ser bom ou não. "Quando procuro um artista, a primeira coisa que vejo é se ele traz algo novo", diz Rick Bonadio.

Quando garimpam o mercado, os grandes empresários do show business querem saber se aquele talento é capaz de ocupar um espaço em um mercado já concorrido ou se o artista abre uma nova frente. Numa empresa, a contratação de um profissional segue uma análise semelhante.

É comum uma situação em que dois profissionais qualificados concorrem a uma única vaga. O que define a contratação é a aposta da empresa de que um deles é o mais adequado. "Um grupo de pessoas decide se fará daquela pessoa uma estrela", afirma Maíra.

"Ninguém faz sucesso sozinho." Outra lição das celebridades é a adaptação. Se a carreira não está indo bem, é preciso mudar de estratégia. O empresário Anderson Ricardo, por exemplo, aposta que a onda de sertanejo deve diminuir, pois o mercado já está saturado, e os próximos sucessos devem ser da música pop.

Para mudar de ramo, fechou contrato com a cantora Wanessa Camargo, que se afastou do sertanejo, reposicionou sua carreira e agora canta em inglês e mira o público GLS. "Eu vendo um produto", diz Wanessa.


O mesmo acontece com a carreira quando, por exemplo, determinada especialização técnica entra em decadência e o profissional precisa adquirir outro conhecimento para se manter valorizado. "Tem lugar para todo mundo", afirma Mônica Ramos, diretora do Career Transition Service da consultoria LHH/DBM, de São Paulo.

Algum talento todo mundo tem. Mas saber como usá-lo bem e estar satisfeito só poucos sabem. Por isso, se você souber, as possibilidades de conseguir atingir seus objetivos são muito maiores.

Ela se prepara

Atrás do nome Anitta se esconde Larissa de Macedo Machado, carioca de 20 anos que desde os 16 investe na carreira de cantora. Um ano antes de estourar, a artista fazia aulas de canto, dança e teatro. Hoje, por causa dos 30 shows que faz, em média, por mês, e de dormir em ônibus e avião e dançar o espetáculo inteiro, adquiriu uma hérnia na coluna e convive com sessões de fsioterapia.

"Sei que o sucesso é para poucos e para aqueles que são dedicados", diz. "Muita gente acha que tem talento para algo, mas, se você não ralar incansavelmente, não vai conseguir resultado." Por causa da rotina atarefada, só consegue ter uma folga a cada dois meses e está sem inspiração para compor.

"Deixei de ter tempo para viver, só trabalho. Mas sei que é um momento de dedicação para conquistar o máximo que eu puder", diz. A artista e sua equipe sabem que esta é a hora de aproveitar o sucesso. Parte do dinheiro que ganha, Anitta reinveste na carreira.

O plano é parecido com o de muitas empresas que apostam no retorno de longo prazo. Aproveitar um produto de sucesso, fazer dinheiro com ele, investir na marca, conquistar clientes fiéis e colher resultados ainda maiores no futuro.

"Não adianta ter sorte e ficar de pés para o ar. O resultado só chega com muito trabalho", afirma Anitta. Quanto tempo sua estrela terá brilho no universo da música popular é uma incógnita. Mas Anitta sabe que não existe êxito sem empenho e investimento, muitas vezes de risco.

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