Escrita: hábito pode se tornar prazeroso (Choreograph/Thinkstock)
Redação Exame
Publicado em 18 de abril de 2023 às 17h31.
Última atualização em 18 de abril de 2023 às 17h42.
Por Diogo Arrais, professor de português
Falar e escrever. Dois atos diários. Para uns, tórrido prazer. Para outros, uma rotina impotente. Quem gosta pensa nos detalhes.
Prepara a vestimenta; combina o ritmo das sentenças; sabe a hora de aumentar e diminuir a voz, usando a gramática como ferramenta para iluminar corretamente o ambiente. A regra? Atingir o objetivo, em concordância e respeito aos envolvidos no ato.
Por vezes, o outro lado está distante, frio. Será preciso conquistar. Para isso, o aparente desinteressado terá de ler ou ouvir algo que tanto deseja. Mesmo que esteja apressado ou no meio da multidão, isto o hipnotizará: um segredo, um bolo de dinheiro, um amor perfeito, uma chave para o paraíso.
Quem exala o atraente das palavras não faz por fazer. Sabe pontuar. Seleciona conectivos; tem postura; sorri e sabe o valor da afinidade. O conjunto da obra, o texto, é feito por devoção. Sua, para arrepiar a plateia (que pode ser composta por uma pessoa apenas). Não se importa com a multidão, porque o que lhe vale é mostrar a que veio, sem jamais ferir.
Se elogiado, agradece. Se criticado, ouve atentamente. É um condicionado a fazer das relações a sinfonia de compreensão do outro, sem se diminuir ou pedir em vão desculpas desnecessárias. A semântica da elegância é seu mais rígido músculo.
De outra sorte, o impotente. O sujeito que faz por fazer. O das palestras demoradas, tendo o medo latente da objetividade, em sujeito e predicado: “Eu errei.”
Quem destrata o poder dos vocábulos perde gente. Perde a oportuna janela, para reproduzir fielmente as intenções. E... o que seria um profundo momento recíproco de emoção ou convencimento torna-se uma propaganda eleitoral gratuita.
O pior é ser ciente da frieza. É acreditar que o improviso não é arte. É deixar de lado a sonora importância dos ali envolvidos, em qualquer ato dialógico. Culpa a gramática, a fonética, o colega, menos quem delegou o adjetivo “frescura” para os mais sensíveis.
Com o tempo, vai deixando de sentir o fervor da vida. Vai criando conflitos. Vai, até que quase não consegue mais voltar, diante de tantos pleonasmos difíceis. A impotência, ainda bem, tem cura.
Um grande abraço e até a próxima,
DIOGO ARRAIS
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Professor de Língua Portuguesa