Michelle Telles, da Red Bull: “Deixo o smartphone de cabeça para baixo” (Alexandre Battibugli/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.
São Paulo - A interrupção é uma praga para a produtividade do profissional. Segundo estudos de ciência cognitiva, o ser humano demora em média 15 minutos para restabelecer a concentração após uma interrupção.
Hoje, em um ambiente de trabalho em que as pessoas são interrompidas permanentemente por telefonemas, e-mails, comunicadores instantâneos e redes sociais, sem contar as reuniões, manter o foco no que é importante é quase impossível.
O resultado da baixa produtividade — estima-se que o excesso de interrupção diminua em 40% nosso poder de realizar — é que estamos entregando um serviço de pior qualidade. E, obviamente, voltando para casa insatisfeitos ao fim de mais um dia de trabalho.
Esqueça por um minuto os terabites de informação que são despejados na sua mesa de trabalho diariamente. Um novo livro, lançado este ano no Brasil, mostra que a tecnologia da informação é, sim, um grande vilão da produtividade, mas não é o pior deles.
Para a advogada e escritora americana Susan Cain, autora de O Poder dos Quietos (Ed. Agir, 352 páginas, 22,90 reais), a arquitetura corporativa prejudica mais a concentração do que as mensagens eletrônicas e a telefonia.
Isso porque normalmente trabalhamos em espaços abertos que, intencionalmente, facilitam a convivência, a abordagem e a comunicação. Sim, essas características sempre foram tratadas como um avanço na representação do espaço de trabalho por trazerem um ar de democracia e liberdade. Mas há problemas também, que são pouco discutidos. “Trabalhamos em escritórios com pouco descanso do barulho ou do olhar dos colegas”, diz Susan.
A ideia de derrubar as paredes nas organizações é nobre, pelo menos na teoria. O contato pessoal facilita o melhor fluxo de ideias entre funcionários. Consta que esse modelo de arquitetura foi desenvolvido no Japão, país onde o respeito à hierarquia é maior, e os escritórios de espaços amplos foram uma forma de estimular a interação.
A mensagem colou no mundo inteiro, turbinada na crença de diminuir a distância entre o corpo executivo e a base, facilitando o fluxo de informações. Virou padrão mundial.
“Sem as paredes, os ambientes de trabalho se tornaram mais ruidosos e caóticos, e as trocas de ideias, mesmo sendo efetivas, passaram a não ter hora para acontecer, o que tem contribuído para atrapalhar o desempenho”, diz Emerson Ciociorowski, coach e consultor de empresas. “Em culturas em que as pessoas já têm dificuldade de concentração, como a brasileira, isso é um problema.”
Outro ponto que Susan levanta em seu livro é que o ambiente corporativo favorece pessoas extrovertidas e, naturalmente, complica a vida dos introvertidos.
Para ela, estamos vivendo em um mundo que é tão expansivo, extrovertido e conectado que perdemos de vista o nosso lado introvertido, silencioso. “Corremos de reuniões a reuniões, prazos a prazos, sem momentos para refletir ou ficar sozinhos, em silêncio”, diz Susan. A crescente busca de ioga, meditação e terapias alternativas, segundo ela, é uma prova de como esse barulho todo tem afetado a vida das pessoas.
A questão, aponta Susan, que passou seis anos fazendo pesquisa para escrever o livro, é que o silêncio e a introspecção são ingredientes fundamentais para que um profissional use a criatividade, a persistência e a moderação para assumir riscos. Sem esses elementos, os resultados pessoal e corporativo ficarão prejudicados.
“A criatividade depende da reflexão e da quietude para se desenvolver. Da mesma forma, o barulho dissipa a persistência, o que faz as pessoas desistirem mais facilmente de pensar em soluções melhores para resolver algumas questões de forma mais inusitada e, acima de tudo, assertiva”, escreve.
Flávio Crivari, de 27 anos, coordenador de produção de conteúdo da Anhanguera Educacional, diz preferir fazer em casa, onde há menos ruído, os trabalhos que demandam mais da sua criatividade e concentração. Por coordenar uma equipe de 12 pessoas, ele afirma que encara com naturalidade as interrupções, que muitas vezes são necessárias para tirar dúvidas ou definir estratégias.
Mas confessa que tem vezes em que elas se tornam prejudiciais para a realização do trabalho. O principal é o telefone, tanto o fixo quanto o celular. “Dependendo da ligação, perco completamente o raciocínio”, diz. “E os mensageiros automáticos piscando na tela também me atrapalham muito, depois é difícil retomar.”
Obviamente, ninguém imagina uma volta ao passado das empresas cheias de divisórias, mas Susan coloca em dúvida a eficácia da comunicação “forçada” dos espaços abertos.
A melhor solução para a autora seriam escritórios privados, com locais públicos de interação. “Isso estimularia o encontro casual entre colegas, que é o tipo de interação mais propícia ao surgimento de ideias criativas”, diz a escritora. “Encontros formais, obrigatórios, não contribuem para a inovação.”
Embora produza interrupções, a tecnologia também contribui para aumentar a produtividade. Basta pensar em como ela facilita e acelera a comunicação. Por isso, evitar a tecnologia não é a solução. “Já pensei em não ter mais Facebook e outras redes, mas acabo usando muito, inclusive para o trabalho. Então, é melhor ver a tecnologia como um mal necessário”, diz Michelle Telles, de 28 anos, especialista de marketing da Red Bull.
A saída é controlar melhor os contatos para manter a concentração. “Entro pouco nas redes sociais e deixo o smartphone com a tela para baixo”, diz Michelle. O e-mail também é possível de ser administrado. Basta reservar um horário do expediente para responder a todas as mensagens. Embora leve o mesmo tempo, terá um impacto positivo na manutenção do foco.
Se vivemos num mundo que potencializa a extroversão, é preciso mudar o jeito de lidar com os introvertidos. Numa reunião, por exemplo, profissionais mais recatados podem não se sentir à vontade para dar opiniões na hora, algo que é esperado mais ou menos de todo mundo. “Talvez seja melhor dar um tempo após a reunião para que os participantes mais introspectivos se manifestem”, diz Susan. “Assim, boas ideias seriam mais bem aproveitadas.”