Robert Kelly, professor entrevistado pela BBC quando teve o quarto invadido por seus filhos (YouTube/BBC/Reprodução)
Claudia Gasparini
Publicado em 5 de abril de 2017 às 15h00.
Última atualização em 5 de abril de 2017 às 15h00.
São Paulo — Um professor universitário que trabalhava de casa teve sua entrevista com um apresentador de TV divertidamente “invadida” por seus dois filhos pequenos, e o vídeo se transformou rapidamente em um hit da internet, com mais de 23 milhões de visualizações só no canal oficial da BBC no YouTube.
Cenas como essa são vividas todos os dias por quem faz home office; a diferença é que não são transmitidas ao vivo pela televisão.
O motivo é que grande parte das empresas não dá treinamento adequado para quem trabalha de casa, o que dá margem a uma infinidade de interrupções, ruídos e problemas de todo o tipo, explica André Brik, especialista em home office do Instituto Trabalho Portátil.
O caso do professor entrevistado pela BBC é especialmente emblemático, porque os protagonistas da confusão são seus filhos — justamente quem tem mais dificuldade para compreender o conceito ambíguo de um pai ou mãe que se encontra em casa, mas não está realmente disponível para interação.
O problema, diz Brik, é que a criança frequentemente confunde presença com acessibilidade. É preciso explicar cuidadosamente as regras da situação ou transformar tudo em um jogo. “Em certos casos, resta buscar ajuda de profissionais como babás, amigos ou parentes, ou só trabalhar em casa enquanto as crianças estiverem na escola”, comenta ele.
Claro que não dá para colocar toda a culpa nos pequenos: mesmo os adultos têm dificuldade para entender o home office. Não é raro que outras pessoas que moram na casa dificultem a vida do trabalhador remoto com barulhos, pedidos e interrupções constantes. Em muitos outros casos, é o próprio profissional quem se autoboicota e toma decisões nocivas à sua produtividade.
Segundo Cleo Carneiro, vice-presidente da Sobratt (Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades), a responsabilidade pelo sucesso dessa modalidade de trabalho é compartilhada por empregador e empregado. “A companhia precisa dar treinamento e sensibilizar a equipe, mas o funcionário também precisa ter disciplina e tomar todas as atitudes necessárias para não perder o foco”, afirma ele.
A seguir, os especialistas ouvidos por EXAME.com apontam os 5 erros mais comuns entre profissionais que trabalham de casa — e eles vão muito além de simplesmente não trancar a porta durante uma entrevista com a BBC enquanto seus filhos estiverem em casa:
Se você vai cumprir o expediente no seu quarto, para que colocar uma roupa “apresentável”? Segundo Brik, escolher uma vestimenta adequada, igual àquela que você escolheria para ir ao escritório, faz muita diferença sim.
“Cada detalhe precisa simular a sua 'saída' para o trabalho, inclusive para sinalizar para as demais pessoas da casa que você está no seu ‘modo’ profissional”, afirma o especialista.
Se você passa o dia vestido de forma desleixada, até a sua disposição psicológica muda para pior. Sem que você perceba, o conforto do pijama pode torná-lo ainda mais vulnerável a distrações.
Outro grande erro, diz Carneiro, é descuidar da sua estação de trabalho. Ela precisa ser tão limpa, organizada e ergonômica quanto seria em um escritório convencional. Segundo ele, é estritamente proibido ficar no sofá ou na cama.
Aparentemente confortáveis num primeiro momento, esses móveis não são adequados para essa finalidade e podem gerar dores no corpo ao final do dia. E mais: a reincidência de posturas erradas traz problemas de saúde no futuro.
Segundo os especialistas consultados, fazer uma boa administração do próprio tempo é o grande segredo para um home office bem-sucedido. Além de uma agenda para o mês e para a semana, é importante contar com uma lista de tarefas que você precisa cumprir naquele dia, com horários bem delimitados.
Para obter eficiência máxima, o conselho de Brik é dividir o seu tempo em blocos de uma ou duas horas, e fazer intervalos de 10 minutos entre eles. Enquanto durar cada bloco, você está proibido de checar as redes sociais, conversar com alguém da casa ou “assaltar” a geladeira. A pausa servirá justamente para fazer tudo isso e, assim, aliviar a tensão.
Muitos problemas vividos durante o home office poderiam ser evitados se a comunicação entre as partes envolvidas fosse melhor. “Você precisa definir com a empresa certos protocolos de trabalho”, explica Brik. Isso envolve combinados sobre os momentos em que será preciso conversar e dar feedback sobre resultados ao longo do dia, por exemplo.
Qual será a ferramenta usada para conversar com pares, subordinados e gestores? Quando você sai do computador, precisa colocar o status ‘ocupado’ ou ‘ausente’ no chat? Quanto tempo dura o intervalo do almoço? A quem você deve recorrer se tiver algum problema técnico com o software usado para o trabalho? As respostas a todas essas questões, das mais operacionais às mais complexas, devem ser bem conhecidas pelas duas partes, ou haverá desencontro e conflito.
Praticado há relativamente pouco tempo no Brasil, o trabalho à distância é alvo de desconfiança de empresas e até de profissionais. “Existe ainda uma ideia conservadora, criada nos anos 1950, de que trabalhar é igual a tomar café da manhã, pegar a maleta e ir até o escritório”, diz Brik. Ter “permissão” para “ficar em casa” em vez de ir ao prédio da empresa é visto como privilégio.
O preço dessa percepção para a produtividade é imenso. "Fica a sensação de que home office não é algo sério, e que é aceitável relaxar enquanto se está em casa", diz Brik. Compreender essa mudança de paradigma é fundamental para se dar bem com o home office e com qualquer outra modalidade alternativa de trabalho, inclusive os espaços de coworking.