Tecnologia

"Twitter e Facebook acabam com segredos", diz historiador

Em entrevista ao site de Veja, Andrew Keen critica a superexposição dos usuários, ataca a "doutrina da multidão" e prevê uma "geração sem mistério"

Historiador Andrew Keen em evento da Economist, de 2012 (Wikimedia Commons)

Historiador Andrew Keen em evento da Economist, de 2012 (Wikimedia Commons)

DR

Da Redação

Publicado em 18 de agosto de 2012 às 14h13.

Ex-empresário do Vale do Silício convertido em historiador, Andrew Keen é hoje um dos críticos mais ácidos do mundo digital. Em seu primeiro livro, O Culto do Amador (Jorge Zahar; 208 páginas; 39 reais), de 2009, o britânico de 51 anos denunciou o que chamou de "ditadura da ignorância" na web, difundida por narcisistas ávidos pelos holofotes digitais. Ganhou rapidamente desafetos, foi tachado de apocalíptico e ficou conhecido como o "anticristo da web”. Três anos depois, Keen volta à carga em novo livro. Seu alvo: Facebook, Twitter, Google+ e afins.

Keen desembarca ao Brasil na próxima semana para divulgar Vertigem Digital – Por que as redes sociais estão nos dividindo, diminuindo e desorientando (Jorge Zahar; 253 páginas; 45 reais). Nele, o historiador ataca o carimbo "social" das ferramentas e games on-line, critica a superexposição dos usuários e ironiza os entusiastas da "transparência" das redes citando o filósofo francês Jean Baudrillard: “A transparência é boa demais para ser verdade... o que há por trás deste mundo transparente?”.

O desencanto do britânico passa longe da tecnofobia. Keen está no Twitter, usa iPhone, iPad e MacBook, passa dez horas por dia na internet e checa obsessivamente seu e-mail. Seu alvo nunca foi a tecnologia. É o que chama de "era do exibicionismo", que estaria forjando uma "geração sem mistério". Em entrevista ao site de Veja, Keen explica por quê.

- O que há de errado com as redes sociais?

Andrew Keen: Temo que a palavra "social" seja transformada em ideologia. Todas as últimas inovações digitais – de recursos musicais a soluções criativas – recebem obrigatoriamente o carimbo de social. Isso é preocupante. A internet deve sempre preservar a autonomia do indivíduo, atributo que não é respeitado por diversas plataformas. Os pensamentos originais só aparecerão quando as pessoas rejeitarem essa doutrina da multidão.

- Recentemente, o empresário Biz Stone (um dos fundadores do Twitter) previu que o futuro será "social".

Keen: Se isso for realmente verdade, é preocupante. Foi por esse motivo que escrevi meu segundo livro. Precisamos conquistar um espaço na web onde possamos nos proteger da multidão e desenvolver nossas próprias ideias. É preciso praticar mais a autocensura e limitar o número de publicações pessoais nas redes.

- Em seu livro, o senhor diz que as pessoas estão abrindo mão de suas informações pessoais. Por quê?

Keen: Vivemos a era do exibicionismo. Estamos desistindo dos nossos segredos. Chegamos ao mundo da transparência radical. Nossos perfis no Facebook, Twitter e Google+ são nossas vitrines. Hoje, riqueza corresponde a conectividade. Com esse comportamento extremamente narcísico, estamos virando marcas. Eu mesmo, por exemplo, sou o "anticristo da web".

- Esta "marca" o incomoda?

Keen: Não. É até agradável. Como um garoto judeu do norte de Londres, sempre cultivei a ambição de me tornar o anticristo de algo historicamente relevante. O que poderia ser mais significativo do que o Vale do Silício?


- As redes sociais podem realmente acabar com os segredos das pessoas?

Keen: Conseguimos saber os gostos e os anseios das pessoas só visitando seus perfis nessas redes. Podemos ter uma geração de pessoas sem mistérios. Meu conselho aos usuários da rede é mentir. Eu mesmo nunca digo a verdade em meu perfil no microblog. Se você me segue no Twitter, confesso: não terá condições de saber muitas coisas sobre mim.

- O senhor se considera pessimista?

Keen: Eu sempre fui uma pessoa otimista, mas não vivo de sonhos. Aponto os problemas das redes sociais. Não significa que eu seja avesso à tecnologia. Uso a internet diariamente por dez horas, tenho iPhone, iPad e Macbook e sou obcecado por e-mail. Tenho mais de 20.000 seguidores e reconheço: o século XXI será a era da internet. Só não tenho Facebook.

- Por quê?

Keen: Essa rede não é confiável. Ela apresenta um modelo de negócio nada desprezível, com a exposição de dados pessoais, como nome, cidade, idade, gênero, atividades, amigos mais próximos. Seus usuários não são clientes, mas produtos. É uma armadilha compartilhar informações nesse tipo de plataforma. Quanto mais você compartilha, mais a rede sabe sobre você, e mais você se transforma em um produto. O filósofo francês Michel Foucault estava certo: a visibilidade é uma armadilha.

- Qual é o futuro do conhecimento na internet?

Keen: O conhecimento será restrito e estará presente em ambientes fechados com sistemas de pagamento, como o do The New York Times, onde sei que a informação é confiável. Ambientes digitais em que exista livre acesso de distribuição e compartilhamento de conteúdo como a Wikipédia ficarão comprometidos. A elite (pessoas como eu) sempre terá acesso às informações mais confiáveis, mas as massas vão se submeter à 'ditadura da ignorância'. É como voltar à Idade Média – e isso não é uma perspectiva muito atraente.

Biblioteca

Vertigem Digital

O livro expõe os problemas do uso excessivo das redes sociais, como Facebook, Twitter e Google+. Para Keen, estas plataformas ameaçam forjar uma "geração sem mistério".

Autor: Andrew Keen
Editora: Zahar

O primeiro livro de Keen

O Culto do Amador

Na obra, o historiador inglês sustenta que blogs, MySpace, YouTube, Orkut e Wikipédia estão criando uma cultura de banalidades e desinformação, uma vez que é possível publicar qualquer assunto, sem questionar a veracidade dos fatos.

Autor: Andrew Keen
Editora: Zahar


O futuro da internet

The Next Web Latin America

Nos dias 22 e 23 de agosto, o Brasil sedia pela primeira vez uma das maiores conferências sobre internet em todo mundo. Andrew Keen é um dos nomes convidados para discutir os rumos dos negócios, tecnologia e cultura digital. Também participam Werner Vogels, executivo da Amazon, Michell Zappa, estrategista de tecnologias emergentes, entre outros.

Local: Espaço Armazém, Rua Jaguaré-Mirim, 164, São Paulo, SP
Preço: 1.200 reais
Data: 22 e 23 de agosto de 2012

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