Tecnologia

O teste das baterias de larga escala

Diane Cardwell e Clifford Krauss © 2017 New York Times News Service Escondido, Califórnia – No Sul da Califórnia, durante o outono de 2015, um gigantesco vazamento de gás natural foi responsável por um dos piores desastres ambientais da história do país e, ainda por cima, acabou com uma das principais fontes de energia das […]

O CÂNION DE ALISO, NA CALIFÓRNIA: um enorme vazamento de gás fez o estado investir pesado no uso de baterias para estocar energia elétrica  / Coley Brown/The New York Times

O CÂNION DE ALISO, NA CALIFÓRNIA: um enorme vazamento de gás fez o estado investir pesado no uso de baterias para estocar energia elétrica / Coley Brown/The New York Times

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Da Redação

Publicado em 25 de janeiro de 2017 às 12h06.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h14.

Diane Cardwell e Clifford Krauss
© 2017 New York Times News Service

Escondido, Califórnia – No Sul da Califórnia, durante o outono de 2015, um gigantesco vazamento de gás natural foi responsável por um dos piores desastres ambientais da história do país e, ainda por cima, acabou com uma das principais fontes de energia das usinas termoelétricas da região.

Os reguladores do setor energético precisavam de uma solução rápida. Mas, ao invés de continuarem com o gás, preferiram se voltar para uma tecnologia mais associada às lanternas de bolso: pilhas e baterias. Eles liberaram as fornecedoras de energia para instalarem baterias – muitas e muitas baterias.

Essa foi uma solução audaciosa e arriscada. A ideia é que as baterias são capazes de armazenar eletricidade durante o dia (quando muitos dos painéis solares do estado enchem a rede elétrica de energia), liberando à medida que a demanda aumenta (no início da noite, quando as pessoas voltam pra casa). Pensando bem, baterias recarregáveis são como pequenas usinas elétricas sob demanda e, em teoria, são capazes de substituir usinas inteiras.

As empresas de energia estudam o uso de baterias em larga escala em todo o país, mas no Sul da Califórnia o ritmo de desenvolvimento dessa tecnologia é cada vez mais acelerado.

Essa ideia tem um potencial enorme. No entanto, o desafio de armazenar eletricidade espanta engenheiros, pesquisadores, políticos e empreendedores há séculos. Mesmo com o desenvolvimento acelerado de inúmeras tecnologias, as baterias ainda não se desenvolveram tanto quanto poderiam.

Além disso, os modelos mais novos e poderosos trazem uma série de riscos, tais como incêndios e explosões, caso não sejam instalados de forma apropriada. Esse é o mesmo problema que levou a Samsung a recolher 2,5 milhões de smartphones Galaxy Note 7 em setembro do ano passado, graças ao risco de incêndios.

Depois de meses de correria, os engenheiros californianos terminaram a construção de três usinas de armazenamento de energia que começarão a servir a rede elétrica do Sul da Califórnia a partir do mês que vem. Essas usinas são compostas por milhares de versões gigantes das baterias de íon-lítio que usamos em smartphones, laptops e outros aparelhos digitais.

Uma delas é o centro de operações da San Diego Gas & Electric, cercada de parques industriais em Escondido, a 48 quilômetros ao norte da cidade, e será a maior do tipo no mundo, de acordo com os desenvolvedores. Isso representa o maior teste de armazenamento de energia em larga escala e os especialistas creem que seja uma oportunidade fundamental para um futuro de energias limpas.

Aqui, cerca de 200 quilômetros a sudeste de Aliso Canyon, o local onde ocorreu um imenso vazamento de gás em 2015 – o equivalente do aquecimento global de manter 1,7 milhão de carros rodando por um ano – 19.000 módulos de bateria do tamanho de um balcão de cozinha serão interligados. Eles irão funcionar a partir de duas unidades móveis de 60 metros quadrados.

Fabricadas pela Samsung, as baterias são capazes de carregar energia suficiente para servir de backup caso falte energia na rede. Elas também são protegidas para absorver energia de baixo custo – especialmente de origem solar – durante o dia e devolvê-la à rede depois de anoitecer. São também capazes de substituir as velhas usinas a gás que já não têm mais combustível suficiente desde o vazamento desastroso.

“A Califórnia está dando uma chance às baterias para que elas mostrarem o que são capazes de fazer”, afirmou Andrés Gluski, executivo-chefe da AES, que está instalando os sistemas.

A AES também está instalando uma rede compacta de baterias em El Cajon, um bairro a leste de San Diego. Ao mesmo tempo, a Tesla, a empresa mais conhecida pelos carros elétricos, está criando sistemas integrados de baterias para outra empresa de energia, a Southern California Edison, nos arredores de Chino.

As apostas são altas para ambas as empresas de armazenamento de energia. Caso os projetos enfrentem dificuldades ou falhem, isso pode colocar em risco a estabilidade da rede elétrica do Sul da Califórnia, além de acabar com o interesse na tecnologia como um todo.

Depois que um projeto pioneiro e de menores proporções instalado em uma fazenda eólica em Oahu no Havaí pegou fogo em 2012, o investimento nas unidades de armazenamento de energia praticamente desapareceu durante alguns anos. Essa instalação, que utilizava 12 mil baterias de chumbo-ácido para ajudar a equilibrar as flutuações no fluxo de energia, pegou fogo três vezes nos primeiros 18 meses de operação. A empresa responsável por ela, a Xtreme, acabou indo à falência. A fazenda eólica, por sua vez, recorreu a outra tecnologia para equilibrar a produção.

Uma das pessoas mais interessadas nos projetos de energia do Sul da Califórnia é Susan Kennedy, que ajudou a conduzir as políticas energéticas da Califórnia por mais de uma década no posto de reguladora estadual e membro do alto escalão do gabinete de dois governadores – o democrata Gray Davis e o republicano Arnold Schwarzenegger. Agora ela é proprietária de uma startup de armazenamento de energia que não fez parte da construção das unidades de armazenamento que foram criadas após o vazamento de gás de Aliso Canyon.

“No momento em que uma delas falhar, ninguém mais vai querer saber de investir nisso”, afirmou Susan a respeito da aposta nas baterias.

A AES apenas compra as baterias, assim como os equipamentos, de empresas como a Samsung, a LG Chem e a Panasonic. Ela projeta e monta as unidades de armazenamento, empilhando as baterias em prateleiras no interior de salas parecidas com vestiários.

O projeto também está sendo acompanhado de perto por defensores das energias renováveis. A razão: se as instalações de baterias em larga escala funcionarem conforme o previsto, isso ajudará geradores eólicos e solares a funcionar como usinas tradicionais, uma vez que trabalharão de maneira contínua, liberando energia mesmo quando o sol não está brilhando e os ventos pararam de soprar.

“O armazenamento de energia é a ferramenta ideal para a integração de energias renováveis a uma infraestrutura energética como a nossa. Sem isso, encaramos o risco da variabilidade imposto pelas energias renováveis, gerando falta de confiabilidade”, afirmou Josh Gerber, gerente de integração de tecnologias avançadas da SDG&E, enquanto trabalhadores rebocavam as muretas baixas que servirão de apoio às unidades de armazenamento em Escondido.

De acordo com o contrato, a AES é responsável por garantir que as baterias funcionem por 10 anos, depois dos quais a SDG&E assume os trabalhos. Um ponto potencialmente negativo é o fato de que as baterias são completamente carregadas e descarregadas a cada dia, levando a uma degradação mais acelerada.

Os executivos envolvidos demonstram confiança no projeto e na estabilidade, apesar dos problemas recentes da Samsung com as baterias de smartphones. Essas baterias contam não apenas com uma configuração diferente da dos smartphones, afirmam os executivos, como o tamanho das unidades também permite a inclusão de ferramentas sofisticadas de monitoramento, bem como de equipamentos industriais de segurança, resfriamento e ventilação.

O projeto, assim como a pequena unidade que a AES instalou em El Cajon, pode funcionar como a prova de conceito que Gluski sempre procurou.

A AES firmou um acordo para instalar um projeto ainda maior, avaliado em 1 bilhão de dólares, em Long Beach, para a Southern California Edison e que não faz parte das iniciativas ligadas ao vazamento de gás natural de Aliso Canyon; o projeto deve entrar em operação até o fim de 2020. Os planos da empresa de energia para utilizar baterias tem o objetivo de substituir parte de suas velhas usinas a gás no Rio San Gabriel.

Em longo prazo, os planos de Gluski são de mudar drasticamente o portfólio de produção de energia da empresa – que ainda depende demais do carvão mineral e do gás natural – utilizando mais fontes renováveis. Para ele, os sistemas de armazenamento são componentes fundamentais para que a energia solar e a eólica se tornem uma fonte dominante em partes da América Latina, da Ásia e da África, onde a AES é ativa.

Para os defensores de energias limpas – incluindo os habitantes do bairro de Porter Ranch em Los Angeles, um lugar tão lindo que Steven Spielberg escolheu como cenário para o filme “E.T. – O Extraterrestre”, de 1982, mas onde muitos ainda reclamam de alergias, dores de cabeça e outros sintomas que expulsaram muitas pessoas de casa durante o vazamento – essa poderia ser uma arma poderosa na luta contra o gás natural.

Contudo, a pressão será enorme sobre as empresas de energia do Sul da Califórnia, que já estão com a reputação manchada pelos frequentes cortes de energia que se seguiram ao escândalo da Enron. Ninguém quer que alguma coisa parecida volte a acontecer, quando apagões afetaram fábricas e até mesmo alguns hospitais.

“Quando a energia acaba, as pessoas morrem. Chegamos a um nível em que falhar deixou de ser uma opção”, afirmou Susan Kennedy.

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