Mouse: implantes de chips ou dispositivos acoplados ao corpo humano podem tomar seu lugar (Vangelis Thomaidis/iStockphoto)
Estadão Conteúdo
Publicado em 13 de dezembro de 2018 às 16h28.
São Paulo - Há 50 anos, o modo como as pessoas interagem com as máquinas foi profundamente alterado. Era 9 de dezembro de 1968, quando Douglas Engelbart, pesquisador do Stanford Research Institute, apresentou para uma plateia de mil engenheiros em San Francisco (EUA) um pequeno dispositivo que permitia apontar para qualquer objeto virtual numa tela de computador.
"Não sei o porquê, mas nós o chamamos de "mouse". Às vezes, eu me desculpo por isso. Mas começamos o chamando dessa maneira e nunca mudou", disse ele durante a apresentação.
O impacto da apresentação foi tão forte, que ela passou a ser conhecida como "Mother of All Demos" - a mãe de todas as demonstrações tecnológicas que vieram a seguir.
Como se fosse um viajante do futuro, Engelbart, morto em 2013, não apresentou apenas o mouse, mas também o conceito de computadores conectados, hiperlinks, janelas virtuais, videoconferência e documentos online colaborativos. Meio século depois, o relacionamento das pessoas com o aparato digital vive outra revolução.
"Antes do mouse, o mundo digital, que era unidimensional, passou a ser bidimensional. Agora, estamos caminhando para um universo tridimensional", diz Rico Malvar, responsável pela divisão de pesquisas da Microsoft. Em outras palavras, o mouse inaugurou a ideia de que a tela dos computadores tem duas dimensões, com eixos X e Y, nos quais é possível movimentar-se livremente.
Antes dele, as máquinas apenas exibiam linhas de texto rígidas, e a melhor forma de comunicação entre homem e computador eram os "punch cards" - pedaços de papel furadinhos que transmitiam informações. A terceira dimensão, que se apresenta agora e promete ditar o comportamento do futuro, indica que o mundo digital reconhecerá profundidade, além de altura e comprimento. Isso significa o fim da tela dos dispositivos e a entrada em cena de gestos, voz, sensores e os mundos virtuais e aumentados.
É o começo do que é chamado de "computação ambiental" - todo o ambiente entende e interage com as pessoas.Exemplo disso são as caixas de som inteligentes, que conversam com os usuários e já dão os primeiros passos rumo à popularidade. Segundo um estudo da Adobe, 32% dos consumidores dos EUA já têm um dispositivo do tipo em casa. Esse número deve saltar para 48% após o Natal. Em janeiro deste ano, apenas 14% tinham o equipamento. Isso sem contar a presença de assistentes virtuais de voz em celulares, tablets e PCs.
A máquina enxerga você."As novas interfaces permitem que o computador enxergue as pessoas de forma mais sofisticada. A tendência é que nos vejam como realmente somos: uma mistura de voz, imagem, gestos e até emoções", diz Lucia Vilela Leite Filgueiras, professora do departamento de engenharia de computação e sistemas digitais da escola politécnica da Universidade de São Paulo (USP).
Ao perceber humanos de maneira mais complexa, os sistemas digitais poderão oferecer respostas igualmente complexas, antecipando necessidades. Se anteriormente era necessário um processo de dez passos com o mouse para acessar, por exemplo, "músicas preferidas para noites alegres", as novas interfaces poderão fazer isso sem que o usuário precise dar um único passo.
E se a máquina estiver errada, o curso para correção pode ser um único comando.Por trás de tudo isso, está a inteligência artificial, segmento que empolga o mundo tecnológico - a receita global do setor deve chegar a 105,8 bilhões de dólares em 2025, segundo a consultoria Tractica. Especialistas acreditam que o que alimentará tudo isso serão computadores quânticos, máquinas tão poderosas que sequer existem.
Com ambientes inteligentes e dispositivos que nos entendem, o mouse vai morrer? "Ele ainda é produtivo, mas deve sumir primeiro do grande público. Depois de áreas mais especializadas", diz Plínio Aquino, professor do departamento de ciência da computação do Centro Universitário da FEI. E o que pode substituí-lo? Tem quem acredite em implantes de chips ou dispositivos acoplados ao corpo humano.
Outros imaginam pequenos drones nos acompanhando o tempo todo. Há ideias de projeções em superfícies ou até diretamente nos olhos. O importante é que seja uma linguagem tão natural quanto os eixos apresentados pelo mouse - crianças já sabem mexer em tablets e smartphones antes mesmo de escrever e até andar.Embora ninguém saiba exatamente o que nos aguarda, Malvar lembra que vale olhar para o legado deixado por Engelbart: "Pense bem na frente. Implemente com a tecnologia que você tem, pois ela vai mudar no futuro. E imagine a experiência mais natural possível."