Repórter
Publicado em 10 de março de 2025 às 06h55.
Última atualização em 10 de março de 2025 às 06h56.
A Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, teria cogitado realizar concessões para conquistar a aprovação do Partido Comunista Chinês e expandir seus serviços no país, de acordo com uma denúncia feita por Sarah Wynn-Williams, ex-diretora global de políticas da empresa.
Segundo Wynn-Williams, a companhia teria aceitado permitir que o governo chinês supervisionasse o conteúdo publicado na plataforma e censurasse opiniões contrárias ao regime.
A denúncia, apresentada em abril à Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC, na sigla em inglês), inclui detalhes de um plano elaborado em 2015 para criar um sistema de censura adaptado à China. O projeto previa a nomeação de um "editor-chefe" com autoridade para remover postagens e até mesmo bloquear completamente a rede social durante períodos de instabilidade política. O documento, de 78 páginas, foi obtido com exclusividade pelo jornal The Washington Post.
Além da censura, autoridades chinesas também teriam pressionado a empresa de Mark Zuckerberg para hospedar dados de usuários locais em servidores chineses, o que facilitaria o acesso do governo a informações pessoais. A denúncia aponta que essa seria uma condição essencial para a aprovação da entrada da Meta no mercado chinês.
Nos bastidores, a Meta teria criado um grupo interno em 2014 para desenvolver uma versão da rede social que atendesse às leis chinesas, batizado de "Projeto Aldrin" — uma referência ao astronauta Buzz Aldrin, o segundo homem a pisar na Lua. Documentos internos mostram que Zuckerberg, CEO da empresa, estava pessoalmente envolvido no plano e realizou reuniões com altos funcionários do governo chinês para facilitar as negociações.
Em um e-mail de 2014, Zuckerberg escreveu a executivos como Sheryl Sandberg e Elliot Schrage afirmando que a empresa precisava “trabalhar intensamente” para garantir que seus serviços estivessem disponíveis na China em até três anos
O esforço incluiu gestos diplomáticos, como a escrita de um prefácio para um livro do presidente Xi Jinping e um discurso de 20 minutos em mandarim para estudantes universitários. Em um dos episódios mencionados na denúncia, Zuckerberg chegou a pedir a Xi que desse um nome chinês à sua filha, o que foi recusado.
Outro trecho da denúncia detalha um caso de censura direcionada. Em 2017, a empresa restringiu a conta de Guo Wengui, um empresário chinês exilado nos Estados Unidos e crítico do regime de Pequim, após pressão de Zhao Zeliang, um dos principais reguladores da internet na China.
A decisão teria sido tomada depois que Zhao sugeriu que agir contra Guo demonstraria a disposição da Meta de cooperar com os interesses chineses. Em notas internas citadas na denúncia, funcionários da empresa afirmam que, caso não pudessem tomar providências contra o dissidente, isso afetaria as negociações com Pequim.
Apesar dos esforços, a Meta nunca conseguiu autorização para operar na China. Em 2019, a empresa abandonou formalmente seus planos no país, no mesmo período em que o governo do então presidente Donald Trump aumentava as tensões comerciais com Pequim.
Atualmente, a companhia tem adotado uma postura abertamente anti chinesa. Recentemente, Zuckerberg declarou que trabalhará com o governo dos EUA para “garantir que os padrões globais de IA sejam baseados em nossos valores, não nos da China”.
A Meta também passou a apoiar campanhas que criticam empresas chinesas, como o aplicativo TikTok, e tem se beneficiado das restrições impostas por Washington às plataformas chinesas. Em uma reunião interna, Zuckerberg afirmou que, caso o TikTok fosse banido nos EUA, isso favoreceria os negócios da Meta.
Procurada pelo Washington Post, a Meta afirmou que seu interesse no mercado chinês “não era segredo” e que os planos da empresa para o país foram abandonados anos atrás. “Exploramos a possibilidade, mas decidimos não seguir em frente. Mark Zuckerberg anunciou isso publicamente em 2019”, disse o porta-voz Andy Stone ao jornal americano.