Mark Zuckerberg: "Eu acredito que uma boa regulação possa prejudicar os negócios do Facebook no curto prazo, mas será melhor para todos, inclusive para nós, no longo prazo” (Joshua Roberts/Reuters)
Agência O Globo
Publicado em 17 de fevereiro de 2020 às 16h44.
Última atualização em 17 de fevereiro de 2020 às 16h54.
Londres — Por anos, o Facebook pressionou governos contra a imposição de leis e regulamentos, argumentando, em alguns casos, que as amarras do Estado repelem a inovação, ou podem inviabilizar modelos de negócio como os das gigantes de tecnologia.
Agora, o cofundador e diretor executivo da companhia, Mark Zuckerberg, pede por mais regulação. Pede, porém, por “boa” regulação, e apresenta suas propostas.
“Eu acredito que uma boa regulação possa prejudicar os negócios do Facebook no curto prazo, mas será melhor para todos, inclusive para nós, no longo prazo”, afirmou Zuckerberg, em artigo publicado nesta segunda-feira no jornal britânico Financial Times. “Se não criarmos padrões que as pessoas considerem legítimos, elas não confiarão nas instituições ou na tecnologia”.
A publicação do artigo coincide com uma visita de Zuckerberg a Bruxelas, capital da União Europeia, onde as chamadas “big techs” estão sendo escrutinadas nos últimos anos, com a imposição de multas bilionárias e propostas de leis duras. No mês passado, Sunda Pichai, diretor executivo da Alphabet, também esteve na cidade.
A mudança de posição do Facebook é compreensível. A empresa entrou no olho do furacão após a revelação de que dados vazados da rede social foram parar na mão da consultoria Cambridge Analytica, e usados para influenciar pleitos em vários países, inclusive na última eleição presidencial americana e no referendo do Brexit. Nos EUA, a companhia foi multada em US$ 5 bilhões.
Desde então, crescem as discussões sobre regras para conter o poder das grandes empresas de tecnologia nos dois lados do Atlântico. A França está adiantada na imposição de impostos sobre o setor. Dentro da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), conversas envolvendo cerca de 130 países tentam definir padrões globais para taxar negócios digitais.
Em Bruxelas, Zuckerberg irá se reunir com a comissária Margrethe Vestager e outras autoridades do bloco, que prepara novas leis em áreas como inteligência artificial, plataformas digitais e responsabilização para conteúdo publicado por usuários. Nos EUA, a discussão chega ao desmembramento dessas companhias. No artigo, Zuckerberg apresenta as suas propostas.
No texto publicado no Financial Times, o CEO propõe a regulamentação de quatro áreas: eleições, conteúdo nocivo, privacidade e portabilidade de dados. Um paper será publicado pela companhia, levantando questões que, na visão do Facebook, devem ser tratadas por leis.
O primeiro ponto é a transparência. As plataformas precisam informar as autoridades como seus sistemas de remoção de conteúdo funcionam, para que regulamentos sobre a atividade possam ser criados. Outra questão destacada por Zuckerberg foi a polêmica dos anúncios políticos.
“Quem decide o que conta como propaganda política em uma democracia? Se uma organização sem fins lucrativos publica um anúncio sobre imigração durante uma eleição, ele é político? Quem deve decidir — empresas privadas ou governos?”, questionou o executivo.
Zuckerberg elogiou os esforços da União Europeia para facilitar a portabilidade de dados, mas levantou questões sobre o tema. “Como definimos o que conta como seus dados? Se eu compartilho algo com você, como o meu aniversário, você deve ser capaz de levar esse dado para outros serviços, como seu aplicativo de calendário? Esse dado é meu ou seu?”
“Nós temos que balancear a promoção da inovação e a pesquisa com a proteção da privacidade das pessoas e a segurança”, disse Zuckerberg. “Sem regras claras sobre portabilidade, leis de privacidade estritas encorajam as companhias a trancarem os dados, se negando a compartilhar com outros, para minimizar riscos regulatórios”.
Por fim, Zuckerberg propõe mais supervisão e responsabilização das empresas de tecnologia. “As pessoas precisam sentir que as plataformas globais de tecnologia respondem a alguém”, afirmou o executivo, que também declarou apoio aos esforços da OCDE na busca por taxas globais. Mas o executivo deixou claro: “É claro, nós não concordaremos com todas as propostas”.
“Mas eu acredito que regras mais claras serão o melhor para todos”, finalizou Zuckerberg. “A internet é uma força poderosa para o empoderamento social e econômico. Regulações que protejam as pessoas e apoiem a inovação podem garantir que ela permaneça desta forma”.