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Maior desafio é a educação, diz membro da OLPC

Mais do que desenvolver a tecnologia de um computador barato, o problema principal é saber como aplicá-lo nas escolas, afirma David Cavallo

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h38.

Nesta entrevista a EXAME, David Cavallo, diretor do grupo de pesquisas Futuro do Aprendizado, do MIT, e um dos líderes da OLPC, fala sobre a concorrência com o Classmate PC, da Intel, e sobre o real desafio de levar computadores de baixo custo às escolas públicas: usá-los adequadamente para aprimorar a educação.

EXAME - Em que países o projeto da OLPC está mais avançado?

David Cavallo - Tentamos coordenar o lançamento de modo que seja relativamente simultâneo entre diversos países. Embora não tenhamos firmado contratos formais em nenhum lugar, um trabalho significativo sobre o conceito e as possibilidades de lançamento ocorreram no Brasil, Argentina, Uruguai, Nigéria, Líbia e Tailândia. Há outros países que também realizam trabalhos sérios.

EXAME - Quais são os principais obstáculos ao sucesso da OLPC?

Cavallo - Tudo é complicado. A tecnologia é, em muitos sentidos, a parte mais fácil. O que é difícil é fazer as pessoas realmente olharem seriamente para o que pode efetivamente melhorar a educação. Isso é crítico; é a nossa missão de fato. Os países precisam fazer isso, mas muitas vezes há uma falta de visão, de vontade política e de idéias concretas que podem causar um impacto significativo. Muitas pessoas oferecem idéias simples que parecem interessantes, mas que não funcionaram no passado, a despeito de investimentos de milhões de dólares. Ensinar tecnologia na sala de aula e usar materiais multimídia são exemplos disso. Soa bem, mas não teve resultados significativos em nenhum lugar.

EXAME - Como o senhor vê o Classmate PC, da Intel, e outras opções de computação barata que estão surgindo?

Cavallo - Ficamos felizes que a Intel e outros estejam prestando atenção à necessidade de computação de baixo custo para educação. Não era o que acontecia antes de começarmos a OLPC, então estamos orgulhosos de já termos conseguido esse efeito. A necessidade é grande e a escala é enorme. Há espaço para todo mundo. Só não deveria haver espaço para desinformação ou para competir de uma maneira que tenta eliminar o outro. Isso faz com que pensemos sobre as intenções de cada um. Por exemplo, se houvesse comprometimento pela computação de baixo custo para fins educacionais e inclusão, então a Intel deveria oferecer um gama completa de produtos, não apenas um laptop para competir conosco. Honestamente, acredito que nossa máquina supera a deles de longe, na medida em que temos uma rede mesh [tipo de tecnologia sem fio que permite a troca de dados entre computadores próximos] que garante conectividade nas escolas e em casa sem a necessidade de outra infra-estrutura cara; temos uma tela que permite leitura com a luz do sol; temos uma máquina de baixo consumo de energia, já que a maioria das salas de aula não está equipada para agüentar laptops rodando à plena carga; e temos um maravilhoso ambiente novo baseado em software livre. Entretanto, a competição é boa e sabemos que Intel e outras empresas desenvolverão essas funcionalidades e ainda mais. Dessa forma, as crianças, suas famílias e países se beneficiarão da competição livre e justa.

EXAME - Dada uma determinada quantidade de máquinas, a OLPC consegue estimar quanto um projeto de distribuição de equipamentos nas escolas públicas custaria ao governo brasileiro? Ou quanto o preço dos laptops representa no custo total de uma iniciativa desse tipo?

Cavallo - Somos uma organização sem fins lucrativos ou comerciais. Estamos comprometidos com abertura e transparência. Trabalhamos desde o começo com o governo sobre planos para providenciar reparos e manutenção (dos equipamentos), conectividade etc. Então não há surpresas e a implementação poderá ocorrer de forma produtiva. Primeiro, vamos olhar os benefícios. Os problemas na sociedade são reais. Acreditamos que educação está na base de qualquer solução de longo prazo para o desenvolvimento econômico e social, para inclusão e para desenvolvimento humano no mais elevado da capacidade de cada um. Isso não vem de graça. Demanda investimento e tempo. Mas traz benefícios reais tanto no curto, como no longo prazo. Além disso, devido a nosso comprometimento com o software livre e devido à rede mesh, acreditamos que os benefícios virão logo por meio de desenvolvimento local de software, conteúdo, serviços e suporte educacional. Haverá benefícios reais de uma nova abordagem em relação ao aprendizado. Focando-se em conteúdo relevante, em desenvolvimento local, no aumento da qualidade educacional, os entraves mais caros serão amenizados. Esses são benefícios reais e quantificáveis. O custo de nossa máquina é o seu preço. Não há lucro, esforço de vendas ou marketing. As máquinas trazem infra-estrutura de rede. O que é necessário para a internet já existe em muitas escolas, mas isso é uma despesa extra. Estamos desenvolvendo um servidor de baixo custo, com a intenção de fabricá-lo no Brasil. O servidor facilitará a comunicação, segurança e armazenamento. Estimamos que isso aumentará os custos dos laptops em algo entre 1 dólar e 2 dólares. Como não buscamos lucro, desenvolvemos nossa máquina para ter qualidade e para durar. Não queremos que seja frágil ou que se torne obsoleta rapidamente, de modo que as pessoas tenham de comprar outra em três anos, como é prática na indústria. Mesmo assim, sabemos que as coisas quebram. Por isso, temos um plano de reparo local, uma parte feita na escola e o restante em escala nacional. Naturalmente, deve haver auxílio para o desenvolvimento dos professores. Embora isso também seja um custo, se for bem feito, trará benefícios em termos de melhoria da qualidade educacional.

EXAME - Criar máquinas fora do padrão de mercado - e ainda por cima com capacidade computacional menor -- não pode complicar a garantia de reposição de peças e suporte técnico? Além disso, trata-se de um projeto que só pode existir com apoio do governo. Não é uma iniciativa auto-sustentável. O problema disso é que a vontade política muda muito facilmente.

Cavallo - Há muitos aspectos de nossa máquina que são mais poderosos do que os equipamentos atualmente disponíveis. A rede mesh é um exemplo. Além disso, um problema na indústria de computação é que, à medida que os chips se tornam mais velozes, os sistemas ficam maiores e mais pesados e, por isso, a performance não melhora. Desenvolvemos um sistema magro, de modo que mesmo que existam processadores mais velozes disponíveis, do ponto de vista do usuário a performance será boa. Não queremos nos tornar uma empresa de laptops. Se o mercado responder e criar máquinas de alta qualidade e baixo custo, seria o ideal. Nesse caso, focaríamos no aprendizado, entrega e assistência. Se o mercado não fizer isso, então haverá espaço para o tipo de atividade que estamos fazendo atualmente. Por fim, se o conceito de um laptop por criança demonstrar resultados reais, a vontade política vai crescer. As pessoas vão demandar isso.

EXAME - Qual sua expectativa em relação a prazo e tamanho do projeto no Brasil? Como está o apoio do governo brasileiro?

Cavallo - O Brasil foi o primeiro país a abraçar o conceito, a começar a estudá-lo e a planejar seriamente. É difícil porque o conceito é novo. Mas a experiência com o governo tem sido fantástica. É um processo difícil, mas tem havido um ótimo progresso.

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