Comunicação: série de oito encontros semanais tem como objetivo discutir alguns dos principais aspectos da comunicação no Brasil nas últimas cinco décadas (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 13 de agosto de 2013 às 12h25.
São Paulo – A importância do jornalista Luiz Beltrão (1918-1986) para as Ciências da Comunicação no Brasil foi destacada por José Marques de Melo, professor da Universidade de São Paulo e da Universidade Metodista de São Paulo na abertura do Ciclo de Conferências “50 anos das Ciências da Comunicação no Brasil: a contribuição de São Paulo”, realizada no dia 9 de agosto na sede da FAPESP.
Promovida pela FAPESP em parceria com a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), a série de oito encontros semanais – que serão realizados até o dia 4 de outubro, sempre às sextas-feiras – tem como objetivo discutir alguns dos principais aspectos da comunicação no Brasil nas últimas cinco décadas.
Considerado o fundador das Ciências da Comunicação como área de conhecimento no Brasil, Beltrão lançou em 1963, na Universidade Católica de Pernambuco, onde lecionava, o Instituto de Ciências da Informação (Inciform).
“Beltrão era um jornalista que, a exemplo da maioria dos profissionais da área, não tinha muita metodologia para preparar suas aulas, mas procurou se disciplinar o máximo possível”, disse Marques de Melo. “Ele fez uma série de pesquisas empíricas e, quando concebeu o Inciform, sistematizou essas pesquisas e criou, em 1964, um departamento de pesquisa na instituição.”
Em 1965, Beltrão criou a revista científica Comunicação & Problemas, inspirada no primeiro periódico da área lançado no mundo, a Journalism Quartely, editada nos Estados Unidos. Tempos depois, Beltrão também realizou o 1º Curso Nacional de Ciências da Informação em Recife, que contou com uma conferência magna proferida por Gilberto Freyre (1900-1987).
“Esse conjunto de ações marcou a presença de Recife e de Luiz Beltrão no processo de desenvolvimento dos estudos de comunicação no Brasil que têm um tradição enraizada na literatura das Ciências Humanas desde meados do século 19, mas que só emergiu como campo do conhecimento no país no século 20, basicamente entre as décadas de 1960 e 1970”, disse Marques de Melo.
De acordo com Marques de Melo, uma das razões para o fato de Recife e Beltrão estarem no centro do processo de desenvolvimento da pesquisa em comunicação no Brasil é porque, na época, o Nordeste sinalizava o “novo” no país.
Na década de 1960, por exemplo, foi instituída a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), dirigida pelo economista Celso Furtado (1920-2004). “O órgão atraiu para o Nordeste uma série de projetos e começou-se a pensar no desenvolvimento da região”, disse Marques de Melo.
Além disso, segundo o pesquisador, antes do surgimento do Inciform, já havia na Universidade Católica de Pernambuco o Movimento de Cultura Popular (MCP), criado por Miguel Arraes e inspirado no Movimento Povo e Cultura, da França, que contava com a participação de diversos intelectuais. “Alguns desses intelectuais trouxeram uma série de ideias da Sociologia da Comunicação e da Sociologia Cultural para o Nordeste”, disse Marques de Melo.
“Foi a confluência de uma série de fatores que levaram Beltrão a ter um vislumbre das Ciências da Comunicação como um novo campo que surgia no Brasil”, avaliou Melo.
“Beltrão respondeu a esse movimento com uma proposta que não relegava a um segundo plano a importação do modelo de conhecimento da comunicação que, sobretudo, a França e os Estados Unidos tentaram disseminar no Brasil naquela época, mas que o adaptava ao plano nacional”, disse.
Além de Recife, de acordo com Marques de Melo, outras cidades que desempenharam importantes papéis no processo de desenvolvimento das Ciências da Comunicação no Brasil foram Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro.
Em 1964, foi criada por Roberto Pompeu de Souza Brasil (1914-1991) a Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, onde Beltrão, que substituiu Brasil anos depois, criou programas de pós-graduação e defendeu, em 1967, sua tese de doutorado sobre “folkcomunicação”, disciplina que estuda a comunicação popular e o folclore na difusão de meios de comunicação.
Em 1966 foi criada a Escola de Comunicações Culturais – atual Escola de Comunicações e Artes – da USP, da qual Marques de Melo foi um dos primeiros professores, além de ter ajudado a criar o programa de pós-graduação. No ano seguinte, em 1967, também foi criado o Centro de Pesquisa da Comunicação Social da Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero.
Completando o ciclo, em 1971 foi realizado no Rio de Janeiro, por iniciativa da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o 1º Congresso Brasileiro de Comunicação. E, em 1973, em Belo Horizonte, o 1º Congresso Brasileiro de Ensino e Pesquisa em Comunicação no Brasil, que reuniu todas as Escolas de Comunicação em funcionamento no país.
“Foram todos esses momentos cruciais que determinaram o aparecimento do campo da comunicação no Brasil”, disse Marques de Melo.
Contribuição da FAPESP
Marques de Melo lembrou que foi um dos primeiros pesquisadores que submeteu um projeto na área da comunicação para a FAPESP, no início da década de 1970, quando foi processado pelo regime militar e aconselhado a sair temporariamente do país.
O projeto foi analisado por Oscar Sala, professor do Instituto de Física da USP e diretor científico da FAPESP na época. “Passei um ano nos Estados Unidos com Bolsa de Pós-Doutorado da FAPESP. Foi uma oportunidade interessante para observar o sistema de pós-graduação em jornalismo nos Estados Unidos”, disse.