Tecnologia

Kalache, da 99: os aplicativos contra o PL 28/2017

Na visão das empresas, se aprovado, o projeto pode inviabilizar o modelo de negócios do transporte com carros particulares

99: "Estamos, de certa forma, decidindo como o Brasil vai encarar toda a regulamentação da economia compartilhada" (Facebook/99Táxis/Divulgação)

99: "Estamos, de certa forma, decidindo como o Brasil vai encarar toda a regulamentação da economia compartilhada" (Facebook/99Táxis/Divulgação)

GK

Gian Kojikovski

Publicado em 10 de outubro de 2017 às 20h44.

Última atualização em 10 de outubro de 2017 às 23h44.

Na manhã desta terça, os aplicativos de transporte de passageiros Uber, 99 e Cabify protocolaram no Senado mais de 800.000 assinaturas colhidas nas últimas duas semanas contra o projeto de lei da Câmara 28/2017. Na visão das empresas, se aprovado, o projeto pode inviabilizar o modelo de negócios do transporte por meio de carros particulares da forma que é feito hoje. A proposta está sendo tratada como uma urgência e pode ser votada na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado a qualquer momento.

O PL impõe uma série de regulamentações, como a utilização de placas vermelhas, como as de táxis, além da necessidade de uma autorização específica do poder público municipal para a prestação do serviço. As prefeituras poderiam, por exemplo, limitar o número de carros operando nesse modelo, o que aproximaria o modelo ao de táxis tradicionais. “Isso deve de aumentar o preço, prejudicar o desenvolvimento tecnológico e resultar na perda de oportunidades de trabalho e renda para os motoristas”, diz Kaliana Kalache, gerente de relações governamentais da 99. As empresas dizem não ser contra a regulamentação, mas alegam que o projeto atual tem o objetivo de proibir as operações. Sobre esse assunto, Kalache concedeu a seguinte entrevista a EXAME.

Por que as empresas como a 99, o Uber e a Cabify se uniram contra esse projeto de lei?

Porque ele é tecnicamente ruim é está sendo pouco debatido. Existe um requerimento de urgência na mesa do Senado e, a qualquer momento, ele pode ser votado. Ao mesmo tempo, existe um outro requerimento do senador Paulo Paim (PT-RS) pedindo para que ele passe pela Comissão de Direitos Humanos, esse requerimento também precisa ser votado. Existem, hoje, dois entendimentos sobre o assunto. O que defendemos, que há que se debater mais o assunto, pois não é um debate simples. E também há quem entenda que o projeto está pronto para ser votado. Nós não queremos urgência, ele tem que ser amplamente debatido, porque tal qual ele veio da Câmara, o projeto é uma proibição do serviço disfarçada de regulamentação. Ele restringe a oportunidade de trabalho e renda dos motoristas a partir do momento que condiciona as prefeituras a decidirem quantas permissões e para quem elas seriam disponibilizadas. Isso prejudica a concorrência e diminui o direito de escolha dos usuários ao devolver para uma única categoria o monopólio do transporte de passageiros, como acontecia antes.

Quais consequências a aprovação dessa proposta, da forma como está, traria para a sociedade?

Isso deve de aumentar o preço do transporte nas cidades, além de prejudicar o desenvolvimento tecnológico, entre outras consequências ruins. E isso não são as empresas falando. Recentemente, a secretaria de acompanhamento econômico do ministério da Fazendo emitiu um parecer ao Supremo Tribunal Federal dizendo que éo o PL 28 é anticoncorrencial. Além disso, a secretaria também sugere a desregulamentação dos serviços de táxi atuais, mostrando que se regulamentou o táxi há décadas, quando se tinha outra visão, que hoje é ultrapassada. Hoje, sabe-se que com experiências internacionais de que quanto mais desregulamentado, mais pode-se gerar oportunidades de trabalho e melhores condições para os usuários. No fim, o maior fiscal tem que ser o usuário, os aplicativos têm o acompanhamento em tempo real do que o usuário achou, tanto da qualidade do carro como do motorista, e isso pode ser usado para a fiscalização.

As empresas dizem que não são contra a regulamentação, mas pensam que ela deveria ser feita de outra forma. Apresentaram publicamente, inclusive, um projeto de lei, que não foi levado ainda ao Congresso porque nenhum parlamentar encampou a proposta. Que tipo de regulamentação as empresas defendem?

Ninguém é contra a regulamentação, mas ela precisa ser equilibrada para ser boa para todo mundo, tanto para usuário, motorista, para os taxistas e principalmente para as cidades. Essa regulamentação, a nosso ver, enfocaria principalmente a questão de segurança, qualidade de serviço, a transparência para o usuário sobre os serviços e a colaboração com o poder público nas informações. Os municípios seriam responsáveis por fiscalizar o serviço das operadoras e dos motoristas. É interessante, porque o que enfrentamos agora não é só sobre regulamentar o aplicativo. Estamos de certa forma decidindo como o Brasil vai encarar toda a regulamentação da economia compartilhada. Os aplicativos não fazem nada mais do que conectar o motorista com o passageiro. Então alocamos oferta e demanda, o mesmo que ocorre com o Airbnb, por exemplo. Essa acabou sendo a primeira regulação a ser tratada por ter um impacto maior em uma categoria, mas outras devem vir no futuro.

A regulamentação de São Paulo, que saiu no ano passado e foi elogiada à época inclusive por algumas empresas, pode ser um exemplo?

A regulamentação feita em São Paulo tem muitas coisas boas, mas extrapola na sua competência constitucional em outras. É importante notar que no nosso caso, há duas relações evidentes. Uma delas é a relação que existe entre os aplicativos e os usuários, que é quem disponibiliza o serviço. A outra é entre o motorista e o passageiro. A primeira teria que ser regulamentada pelo critério do direito civil, que é matéria privativa da União. A segunda relação, que é do motorista e passageiro, também compete à União. Aos municípios cabe editar regras municipais, que tratam do interesse local. Nessa relação, a norma de interesse local é garantir que o usuário seja bem atendido, estabelecer regras mínimas de fiscalização, em última análise cobrar uma taxa como poder fiscalizatório, mas a regulamentação de São Paulo extrapola isso em alguns pontos.

A tecnologia dos aplicativos pode ajudar na fiscalização?

Sem dúvida, e ela já está sendo usada dessa forma. Já temos a opção de avaliação e com isso conseguimos uma inteligência muito maior porque se desonera o poder público nessa função de avaliar. O usuário pode dizer se o carro é amassado, se o motorista foi grosseiro, e isso facilita com que esse carro ou motorista sejam fiscalizados.

Mas a fiscalização tem que chegar a todos os motoristas e carros, não? Não é porque um motorista é bem avaliado que ele não terá problemas que às vezes os usuários não conseguem identificar…

Sim. É preciso achar um meio termo para que o poder público chegue até mesmo aos motoristas melhor avaliados. Temos nosso centro de atendimento ao motorista, onde fazemos inspeção em alguns veículos, fazemos algum tipo de curso de formação. Entendemos que temos responsabilidade nisso também, principalmente na questão de segurança. Algumas administrações pedem que a gente faça a checagem de antecedentes criminais, e fazemos isso inclusive onde não há essa obrigatoriedade. Fazemos a análise do prontuário de multas, mapeamos as zonas de risco de violência para avisar aos motoristas, entre outras coisas.

Já que a avaliação do usuário é uma forma de ajudar a fiscalização, por que ela não é obrigatória?

Não concordamos em nada que seja obrigatório, para a pessoa não fazer de mau grado. Deixando aberto, conseguimos opiniões muito mais próximas do que é a realidade.

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