Malária: no Brasil, a Amazônia concentra 99,6% dos casos da doença (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 25 de abril de 2014 às 19h52.
Rio de Janeiro - O Laboratório de Pesquisa em Malária do Instituto Oswaldo Cruz (IOC-Fiocruz) está desenvolvendo drogas alternativas que possam ser administradas junto com uma vacina contra a malária para aumentar a imunidade contra a doença.
Ainda não há, porém, perspectiva de quando a vacina ou as novas substâncias estarão disponíveis, disse hoje (25) à Agência Brasil o chefe do laboratório e presidente da Federação Internacional de Medicina Tropical e Malária, Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro.
Nesta sexta-feira celebra-se o Dia Mundial da Luta contra a Malária, data em que a Organização Mundial da Saúde (OMS) reforça a importância de se trabalhar para a eliminação da doença em todos os países.
No momento, a Fiocruz está efetuando testes pré-químicos em animais próximos ao homem (primatas), mas ainda terão de ser feitas experimentações em humanos.
“Acho que estamos chegando perto de termos uma vacina, em dez anos, que proteja completamente, e uma que proteja parcialmente, em cinco anos, ou até em três [anos]. As nossas [experiências] estão em um estágio menos adiantado”, manifestou o especialista.
Segundo Daniel-Ribeiro, o grande desafio para o Brasil, hoje, é eliminar a malária que mata, antes que ela se torne resistente às drogas disponíveis, procurando as pessoas infectadas em suas casas, como ocorria na década de 1950.
Destacou, além disso, a necessidade de se “conscientizar a população e o pessoal da área de saúde que malária é um problema grave, de emergência médica, porque pode matar na área extra-amazônica”.
No país, a Amazônia concentra 99,6% dos casos de malária. Mas, graças ao diagnóstico imediato, os registros na região caíram 26% em um ano, passando de 241 mil casos, em 2012, para 177 mil, no ano seguinte.
Daniel-Ribeiro explicou que quando o tratamento é feito nas primeiras 48 horas após a identificação da doença, diminui a chance de o paciente ficar muito doente e, eventualmente, morrer. Lembrou que 82% dos registros são causados por um parasita que não mata.
O tratamento atual utiliza uma associação medicamentosa que mata o parasita em poucas horas. Há boas ferramentas, disse o pesquisador, assegurando que está tentando desenvolver novas drogas, tendo em vista que 18% dos casos de malária se devem ao plasmódio (parasita da malária) que mata.
Analisou como oportuna a decisão do milionário norte-americano Bill Gates, nos anos 2000, de investir recursos em pesquisas visando a erradicação da malária no mundo.
A partir daí, os pesquisadores passaram a usar testes de diagnóstico rápido e mosquiteiros impregnados de inseticidas atóxicos. Além disso, passou-se a tratar a malária com uma associação de remédios e não apenas um único antibiótico.
O chefe do Laboratório de Pesquisa em Malária do IOC-Fiocruz acredita que os prefeitos “têm que investir no combate à malária. Têm que ser recompensados, se forem bem, e têm que ser punidos, se forem mal”. A malária, frisou, “tem que estar na agenda pública”.
Daniel-Ribeiro disse que, atualmente, 60% dos casos na Amazônia são tratados nas primeiras 48 horas.
Os cerca de 4 mil postos de saúde da região estão preparados para fazer o diagnóstico imediato e o tratamento da população.
Fora da Amazônia, incluindo as cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte, melhor equipadas, somente 19% dos casos são tratados também nos dois primeiros dias da doença, porque não há um diagnóstico rápido.
“Porque o médico daqui não pensa como qualquer [pessoa de] posto de saúde da Amazônia pensa. Aqui, nós não somos treinados para pensar em malária. O médico pensa que é dengue”.
O resultado, indicou, é que quando a malária é diagnosticada e tratada na Amazônia, a pessoa tem 100 vezes menos chance de morrer do que fora da região.
Números divulgados pela assessoria de imprensa do IOC-Fiocruz mostram que a redução no número de mortes por malária atingiu 40% na Amazônia, entre 2012 e 2013, caindo de 60 para 36.
Daniel-Ribeiro informou que nos anos de 1940, a estimativa, feita em cima do número de casos febris, é que havia 4 milhões de casos da doença por ano no Brasil. “Tinha malária no Brasil inteiro”, observou.
Na década seguinte, a Organização Mundial da Saúde (OMS) resolveu que era preciso erradicar a enfermidade no mundo por meio de duas estratégias básicas: busca ativa e tratamento dos casos, indo às casas das pessoas; e combate ao vetor.
Com isso, de fato, eliminou-se a malária de vários lugares do globo, inclusive da região extra-amazônica, no Brasil, completou.
“Chegou-se ao início dos anos de 1960 com 37 mil casos registrados. Talvez fosse o dobro ou o triplo”. Avaliou, porém, que em comparação aos 4 milhões anteriores, “foi uma enorme redução”.
Em 1970, os casos subiram para 70 mil. Com os programas de fomento à mineração e à agropecuária, implantados pelo regime militar, Daniel-Ribeiro sublinhou que “o homem, literalmente, invadiu a floresta”, ocupando a Amazônia, sem saber, cultural e imunologicamente, como se defender dessa infecção, que não conhecia. “Foi uma mortalidade enorme”.
Antes da virada do ano 2000, chegou-se a 600 mil casos no Brasil. De lá para cá, seguiu-se no país o programa da OMS de diagnóstico, busca ativa e tratamento dos casos, com a implantação, na Amazônia, de postos com capacidade de fazer diagnóstico e tratamento gratuitos.
O pesquisador do IOC-Fiocruz chefia um grupo de pesquisadores que é referência para o Ministério da Saúde em malária fora da Amazônia.
Segundo expôs, o problema fora da região amazônica é só de vigiar, porque "tem muita gente que viaja, tem até mosquito que viaja, e eu preciso tomar cuidado, porque um caso aqui pode acarretar uma epidemia de dez e até de 100 pessoas. Tem que tomar cuidado para não reintroduzir a malária em lugares onde ela não existe mais”.
Quase 90% dos casos registrados fora da Amazônia são importados, informou o pesquisador.