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Facebook ousa cada vez mais na coleta dos seus dados para anúncios

Quando o Facebook se tornou poderoso e popular, diz Srinivasan, a empresa passou a ser capaz de ignorar objeções sobre suas práticas de coleta de dados

 (Reprodução/Getty Images)

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Lucas Agrela

Lucas Agrela

Publicado em 27 de fevereiro de 2019 às 16h34.

Última atualização em 27 de fevereiro de 2019 às 16h36.

Dois anos atrás, um estudante da Faculdade de Direito da Universidade Yale publicou um artigo que se tornaria influente a respeito de como a legislação antitruste deveria ser aplicada a uma das empresas superestrelas da tecnologia dos EUA, que não se encaixa nos moldes convencionais dos monopólios estilo Standard Oil. Agora, outro trabalho acadêmico, de uma ex-executiva do ramo de tecnologia para publicidade formada em Direito na Yale, argumenta que o Facebook abusa de seu poder.

No artigo intitulado “The Antitrust Case Against Facebook”, a autora, Dina Srinivasan, faz uma análise aprofundada do padrão de mudança de opinião do Facebook em relação à coleta de dados de usuários, que possibilitou que a empresa se tornasse uma estrela. Quando o Facebook se tornou poderoso e popular, diz Srinivasan, a empresa passou a ser capaz de ignorar objeções sobre suas práticas de coleta de dados.

O núcleo da argumentação de Srinivasan trata duas preocupações a respeito do Facebook -- possíveis abusos de poder de monopólio e violação da privacidade dos usuários -- não como questões separadas, mas como dois lados da mesma moeda. Trata-se de uma ideia relativamente nova que encontra eco em uma ordem recente da autoridade antitruste da Alemanha. (O Facebook afirmou que o órgão regulador alemão se equivocou ao vincular a aplicação das leis de privacidade e antitruste e anunciou que vai apelar da decisão.)

O trabalho foi publicado nesta semana no Berkeley Business Law Journal, da Universidade da Califórnia, e eu li uma versão publicada na internet há duas semanas.

Deixarei que os especialistas jurídicos avaliem a validade da análise de Srinivasan sobre a questão antitruste. O que me atraiu foi sua leitura seletiva, mas não imprecisa, sobre o histórico do Facebook de ousar cada vez mais na coleta de informações com a finalidade de personalizar os anúncios.

Nos primeiros anos do Facebook, diz Srinivasan, a empresa competia com redes sociais antes populares, como o MySpace, em parte dizendo-se defensor da privacidade das pessoas. Mas quando o Facebook se transformou em uma ferramenta indispensável da vida digital, ele ganhou o poder de reverter as promessas de não coletar certos tipos de informação sobre a atividade das pessoas na internet.

O artigo de Srinivasan é um lembrete de que a prática do Facebook de coletar dossiês digitais para fins comerciais não aconteceu de uma só vez, e sim a um passo lento que esmagou -- ou esperou que terminassem -- as objeções de que o Facebook estava enganando o público ou minando a privacidade das pessoas. Essa história continua tendo relevância porque o Facebook está trabalhando na vinculação de diversas plataformas sociais na internet de uma forma que provavelmente gerará ainda mais dados de usuários para a empresa.

Em um exemplo particularmente convincente, Srinivasan se concentra nos botões “curtir” e “compartilhar” do Facebook. A empresa começou a utilizar os recursos em 2010 e agora eles estão em milhões de websites. Muitos usuários do Facebook não sabem disso, mas esses códigos de software permitem que a empresa colete informações à medida que as pessoas percorrem websites fora do Facebook -- independentemente de as pessoas clicarem ou não nos botões.

Inicialmente, o Facebook disse aos parceiros e ao público que não estava monitorando a navegação das pessoas na web, nem usaria essas informações para anúncios personalizados. As declarações iniciais da empresa sobre quais informações estavam sendo coletadas, e quando, não eram totalmente corretas, mas Srinivasan argumenta que o Facebook era pelo menos cauteloso em relação a essas práticas. Havia um número suficiente de redes sociais alternativas competitivas para gerar reações negativas cada vez que a empresa ia longe demais em relação aos tipos de informação que desejava coletar ou à forma de transmitir as ações das pessoas na internet.

E então, em 2014, o Facebook mudou sua política para permitir o uso de dados das atividades na web para segmentação de anúncios. A empresa, escreve Srinivasan, “faria exatamente o que passou sete anos jurando que não tinha feito e não faria, e finalmente levou a cabo o que o mercado antes competitivo a havia impedido de fazer”.

Para Srinivasan, isso fazia parte do padrão de táticas de isca e troca (bait-and-switch) do Facebook sobre coleta de dados. A empresa cresceu tanto, diz ela, que finalmente podia mudar as regras do jogo.

Fiquei impressionada com o fio que conecta os recentes escândalos de privacidade de dados do Facebook, a leitura de Srinivasan sobre a história do Facebook e as conclusões da autoridade antitruste da Alemanha. Quem desconfia do Facebook agora enfrenta a desagradável escolha entre a vigilância permanente de uma empresa poderosa ou abandonar uma ferramenta fundamental da vida moderna. E isso não aconteceu por acaso.

*Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.

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