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O homem que revolucionou o absorvente na Índia

Arunachalam Muruganantham inventou uma máquina que fabrica absorventes higiênicos baratos para mulheres da zona rural da Índia

Arunachalam Muruganantham, CEO da Jayaashree Industries (M. Periasamy/Flickr/Creative Commons)

Arunachalam Muruganantham, CEO da Jayaashree Industries (M. Periasamy/Flickr/Creative Commons)

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Da Redação

Publicado em 2 de julho de 2014 às 12h45.

Como a maioria dos homens adota a abordagem de avestruz quando se trata da menstruação feminina, as realizações de Arunachalam Muruganantham – inventor de uma máquina que fabrica absorventes higiênicos baratos para mulheres da zona rural da Índia – são ainda mais notáveis.

Durante os anos que passou pesquisando, ele perdeu sua mulher, sua mãe se mudou para longe, enojada, e os outros moradores de seu povoado ficaram tão perturbados que lhe ofereceram uma escolha: ser amarrado de ponta-cabeça a uma árvore sagrada ou ser exilado.

Mesmo assim, Muruganantham não desistiu.

Na Índia, a menstruação não é apenas um tema tabu. No caso das mulheres que vivem em vilarejos rurais, a menstruação atrapalha seriamente o ensino, porque as garotas ficam em casa, faltando às aulas e provas, durante os cinco ou seis dias de sua duração. Com isso, algumas meninas acabam nem se dando ao trabalho de ir à escola.

E há o impacto dela sobre os ganhos da família: quando as mulheres passam uma semana em cada quatro sem poder trabalhar, isso afeta o total recebido pela família. Enquanto estão menstruadas, as mulheres não podem ir ao templo nem preparar comida.

Então como o extraordinário Muruganantham, ou Muruga, como ele próprio se chama, se enquadra nesse contexto?

Filho de mãe solteira, nascido numa família pobre de Coimbatore, no sul da Índia, Muruga teve a ideia quando estava tentando impressionar sua mulher, com quem estava casado havia pouco tempo.

Falando ao HuffPost UK Lifestyle, ele contou: “No início de nossa vida de casados, a única hora em que eu conseguia falar com ela a sós era na hora do almoço, porque vivíamos com a família.”

“Um dia, na hora do almoço, eu a vi segurando alguma coisa escondida nas costas e perguntei ‘o que tem em sua mão, Shanti?’. Ela me deu um tapa no rosto e falou ‘não é de sua conta’. Então vi que era um trapo sujo.”

“Sou o filho mais velho de minha família e tenho duas irmãs mais jovens, então eu sabia o que era. Quando eu era criança, tínhamos uma privada aberta, sem telhado. De vez em quando eu encontrava panos manchados que me faziam fugir da privada. Eu vi a mesma coisa nas mãos de minha mulher e falei: ‘Por que você não compra absorventes descartáveis?’ Ela me disse que tinha que usar os panos porque absorventes descartáveis custam caro.”

Muruga decidiu comprar um pacote de absorventes como presente para sua mulher. Foi a uma farmácia comprar um pacote, e este lhe foi entregue embrulhado em muito jornal.

“Era como se ele estivesse me dando um produto contrabandeado. Mesmo hoje, em cidades grandes como Mumbai e Déli, eles embrulham os absorventes e os tratam como se fossem alguma coisa que deve ficar escondida.”

Olhando para o absorvente higiênico, Muruga disse que ficou pasmo com o preço, em se tratando de algo que parecia tão feio. Um absorvente pesava menos que 14 gramas, mas era vendido a 40 vezes o preço do algodão cru.

“Parecia um curativo grande. Eu sou filho de uma tecelã tradicional. Naquela época, em 1997/98, o algodão custava pouco.”

Muruga decidiu fabricar seus próprios absorventes. Comprou uma rede de algodão, a cortou em retângulos e a envolveu em tecido viscoso. Mas então surgiu o maior problema.

Como ele poderia testar sua criação? “Eu precisava pesquisar algo que é extremamente tabu, numa região do mundo altamente conservadora. Uma mulher não fala desse assunto com seu marido, nem com sua mãe.”

Ele pediu feedback à sua mulher, e foi apenas então que entendeu que as mulheres menstruam mensalmente, e não em dias fixos.

“Ela me disse que eu teria que esperar para que ela pudesse me dar o feedback. Até então eu não sabia disso. Na realidade, 99% dos homens não sabem o que acontece com o corpo da mulher.”

O feedback não foi ótimo. Shanthi disse que a criação de Muruga era “desagradável” e que ia voltar a usar os panos. Quando Muruga abordou suas irmãs, elas se recusaram a lhe dar um retorno, e então ele sofreu um terceiro golpe.

Horrorizada com seus experimentos, sua família lhe disse que, se ele continuasse a fazer o que estava fazendo, ela se negaria a alimentá-lo.

Mas Muruga levou suas pesquisas adiante em segredo. Ele sabia que o uso dos panos pelas mulheres não era uma opção viável, mas a maioria das mulheres do país continuava a usá-los.

De acordo com o The Times of India, apenas 12% de 355 milhões de mulheres que menstruam usam absorventes higiênicos. Para a BBC, que publicou uma matéria sobre Muruga, as consequências para a saúde são sérias.

“As mulheres que usam panos com frequência têm vergonha de deixar que sequem ao sol. Com isso, os panos não são desinfetados. Aproximadamente 70% das doenças reprodutivas na Índia são causadas por falta de higiene menstrual. Isso também pode afetar a mortalidade materna.”

Muruga voltou sua atenção às mulheres de uma faculdade de medicina, calculando que elas teriam menos reservas se fossem abordadas.

Foi e voltou de bicicleta – 40 km de ida e outros 40 de volta – para buscar as folhas de feedback delas, mas acabou por descobrir que elas estavam falsificando as respostas. “Encontrei três delas ocupadíssimas preenchendo as folhas das outras.”

O único recurso que lhe restou, disse Muruga, foi experimentar o absorvente, ele próprio. Embora seja admirável e provavelmente faça de Muruga o único homem no mundo a usar um absorvente higiênico para pesquisar um produto para facilitar a vida das mulheres, essa decisão lhe criaria problemas de todos os tipos.

“A questão era: onde eu ia conseguir um útero? Então fabriquei um útero com uma bexiga de futebol, o enchi de sangue de animal e fiz um furinho. Usei o falso útero em todo lugar, enquanto andava a pé ou de bicicleta, debaixo do meu ‘dhoti’ (um pano amarrado em volta do corpo, como um sarongue).”

Muruga estava usando métodos altamente incomuns, e, num povoado pequeno, esse fato não passou despercebido. Na verdade, as pessoas pensaram que ele tivesse enlouquecido.

Ele lavava seus panos no poço comunitário, e as pessoas começaram a comentar. “Num povoado pequeno e ortodoxo, a maior ocupação da maioria das pessoas é olhar para o que as outras estão fazendo.”

Os boatos se espalharam, e, depois de ouvir uma fofoca de que Muruga estaria tendo um caso com as moças da faculdade de medicina, Shanthi fez as malas e disse que ia fazer uma visita a seus pais. Ela não voltou.

Depois que ela partiu, Muruga teve sua próxima grande ideia. Em lugar de usar um útero improvisado, ele examinaria absorventes higiênicos usados e veria como funcionavam.

“Achei que era pouco natural usar o absorvente em mim, mas o fato de tê-lo usado me levou a respeitar as mulheres, por enxergar a coisa desde a perspectiva delas. Desafio qualquer homem a fazer o mesmo.”

Ele já sabia que o algodão não funcionava. Não absorvia o líquido muito bem, e, mesmo quando absorvia, o líquido acabava filtrando para fora.

Mas como ter acesso a absorventes usados? “Mesmo que você estivesse no Reino Unido, se pedisse um absorvente interno usado, a mulher chamaria a polícia.”

Ele encontrou algumas voluntárias que concordaram em deixar seus absorventes usados numa lata de lixo especial, onde ele os buscaria. Amarrando um lenço no rosto para afastar o cheiro, Muruga fez seus experimentos.

Para sua mãe, a gota d’água foi quando ela viu uma fila de absorventes usados secando ao sol –a técnica de Muruga para reduzir o cheiro.

Convencido que seu filho estava sob o domínio de alguém que estava fazendo magia negra, ela fez as malas. Depois que ela partiu, os moradores do vilarejo o cercaram.

“Eles acharam que eu era um pervertido, então a solução que propuseram foi me amarrar a uma árvore sagrada, de cabeça para baixo. Me deram a opção de deixar o vilarejo. Foi o que eu fiz.”

Muruga foi dividir um quarto pequeno com cinco pessoas. Com a ajuda de um professor universitário, começou a pesquisar os materiais usados. Então descobriu que a resposta era usar celulose, e não algodão.

Seu principal problema era que as máquinas que decompõem a celulose custavam milhares de libras. A única opção viável seria construir sua própria máquina. Depois de quatro anos e meio, ele conseguiu.

Hoje Muruga tem 250 máquinas, e, apesar da hesitação inicial, as máquinas foram adotadas em 1.300 vilarejos espalhados pela Índia. São operadas e vendidas por mulheres, de modo que há menos estigma associado à compra de uma delas.

Depois que Muruga mostrou sua máquina ao Instituto Indiano de Tecnologia, o IIT, em Chennai, o instituto o candidatou a um prêmio de inovação nacional. Ele ganhou o concurso e recebeu o prêmio das mãos do então presidente da Índia, Pratibha Patil.

Mas seu maior motivo de orgulho foi ajudar as garotas de um vilarejo tribal a frequentar a escola, depois de séculos, porque elas não precisavam mais ficar em casa quando estavam menstruadas.

E uma notícia ainda melhor: sua mulher voltou para ele. Questionado sobre o que motivou tamanha paixão por um projeto que se estendeu por 15 anos e que buscou especificamente empoderar as mulheres, Muruga respondeu:

“Fui criado por mãe solteira. Eu vi como minha mãe lutou para me criar, então eu quis fazer isto para ajudar outras mulheres a ganhar a vida para sustentar suas famílias.”

E então ele diz algo tão comovente que é poderoso: Se você empodera uma mãe, empodera um país.”

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