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Bom para as empresas, adiamento da LGPD pode prejudicar o consumidor

Para especialistas, os adiamentos do governo para a Lei Geral de Proteção de Dados poderiam ser revistos para dar mais segurança para as pessoas

LGPD: normas sobre o uso e a guarda de dados foram aprovadas no Brasil em 2018 (monsitj/Getty Images)

LGPD: normas sobre o uso e a guarda de dados foram aprovadas no Brasil em 2018 (monsitj/Getty Images)

RL

Rodrigo Loureiro

Publicado em 7 de maio de 2020 às 05h55.

Última atualização em 7 de maio de 2020 às 05h55.

A pandemia do coronavírus fez o governo adiar o início da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Assinada na última quarta-feira, a MP 959 permite que as empresas só se enquadrem as novas normas de uso e armazenamento de dados digitais apenas a partir de 3 de maio de 2021. E essa falta de proteção pode prejudicar o consumidor.

Consultados pela reportagem, advogados especialistas em direito digital concordam que o adiamento da LGPD continua deixando o consumidor sob os riscos de não ter uma devida proteção jurídica em relação ao mau uso de suas informações armazenadas pelo setor privado e por órgãos públicos.

“Mesmo se entrasse em vigor em agosto, o Brasil já estaria atrasado no debate de privacidade e proteção de dados”, diz Gisele Truzzi, advogada especialista em direito digital e sócia do escritório Advogados. “Quanto mais se atrasa, mais problemas começam a aparecer”, diz.

Truzzi cita como exemplo os dados cedidos por operadoras de telefonia para verificar os índices de isolamento social das pessoas durante a quarentena. “Muitas questões relacionadas ao tratamento de dados de saúde, por conta da pandemia, já poderiam estar sendo tratadas na LGPD”, afirma.

Este ponto, que aborda as transformações digitais motivadas pelo isolamento social da pandemia, também foi abordado por Renato Opice Blum, advogado e professor de direito digital do Insper. “O deslocamento de profissionais para o trabalho remoto em home office e o uso de tecnologias fora do ambiente de trabalho que justificariam uma maior proteção do ponto de vista jurídico", afirma

Aprovada em agosto de 2018 sob a Lei 13.709/2018, a LGPD é um conjunto de normas que regula as atividades de tratamento, uso e armazenamento de dados pessoais. Ela é baseada do Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR, na sigla em inglês) e, na prática, dá aos consumidores mais controle e às empresas mais responsabilidade na adoção práticas mais transparentes na guarda e uso de dados.

As empresas teriam um tempo para se adequarem as leis e seriam, em um primeiro momento, apenas notificadas de suas infrações. Quando as sanções passassem a valer, as companhias poderiam ser multadas em até 2% de seu faturamento líquido (limitado a 50 milhões de reais por infração) e o bloqueio ou a eliminação dos dados pessoais envolvidos.

No dia 29 de abril, a Medida Provisória 959 assinada pelo presidente Jair Bolsonaro e que trata a respeito de questões relacionadas ao auxílio emergencial do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda alterou, na totalidade, o início da vigência da LGPD para o dia 3 de maio de 2021. Neste caso, porém, as sanções também podem ser aplicadas a partir desta data.

Vale lembrar, contudo, que pelo adiamento ser feito pela Medida Provisória, é possível que o prazo inicial para o início da vigência da LGPD seja alterado mais uma vez. "A MP precisa ser confirmada ainda pelo Legislativo. Se não for, a LGPD pode ser prorrogada para 29 de agosto, depois a MP cai e a LGPD entra em vigor", explica a advogada Patrícia Peck Pinheiro, advogada especializada em direito digital e sócia do escritório PG Advogados.

O governo não especificou com clareza as razões que podem ter levado a decisão de propor uma nova data para que a lei passe a viger. Um dos motivos apontados por especialistas, porém, é o custo para as empresas. Dependendo do tamanho da companhia, o processo tende a ser mais oneroso.

Uma pesquisa recente realizada pela ICTS Protiviti realizada com 192 empresas nos primeiros meses de 2020 mostrou que um percentual de 16% das companhias estava preparado para as mudanças que entrariam em vigor, inicialmente no começo deste ano.

“As empresas não enxergam o LGPD como algo essencial neste momento”, afirma Truzzi. “Esse adiamento favorece o setor privado e o Estado. É um processo que pode ser bastante custoso dependendo da quantidade de dados tratados”, diz.

"É preciso fazer um balanço. Poderia ter se prorrogado as sanções. A sociedade precisa da lei, mas não é possível onerar um setor privado que está sofrendo com o impacto da pandemia na economia", afirma Blum. Na opinião do especialista, a lei poder entrar em vigor em agosto, mas com as empresas só sendo penalizadas a partir de maio do ano que vem.

Entenda o caso

Com tantas reviravoltas, uma contextualização se faz necessária. Apesar de ter sido sancionada em agosto de 2018, a lei não entrou em vigor no prazo combinado de 18 meses após a publicação no Diário Oficial da União. Em vez disso, foi adiada por diversas vezes.

A primeira vez foi em dezembro de 2018. Na época, o então presidente Michel Temer editou a Medida Provisória 869/2018, vetou a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, órgão que faria a fiscalização das normas, e alterou o início da vigência para agosto de 2020.

No começo de abril, por conta da pandemia do novo coronavírus, o Senado aprovou o adiamento da LGPD. O tema foi incluído no PL 1179/2020, que flexibiliza algumas leis para que as empresas enfrentem os efeitos econômicos da crise causada pela covid-19. Neste cenário, as normas passariam a valer a partir de 1º de janeiro de 2021, mas com as sanções sendo aplicáveis somente a partir de agosto de 2021.

O terceiro adiamento foi proposto no fim do mesmo mês com a MP 959. O cenário atual é de que a LGPD, em sua totalidade, irá entrar em vigor somente no dia 3 de maio de 2021.

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