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Bilionários em silêncio: Gates e Buffett se afastam após três décadas de amizade

Doações bilionárias, jogos de bridge e conselhos viraram história. Agora, a relação de ambos parece se resumir a gestos formais

Gates e Buffett: de parceiros estratégicos a vozes discretas   (Dimitrios Kambouris / Equipe/Getty Images)

Gates e Buffett: de parceiros estratégicos a vozes discretas (Dimitrios Kambouris / Equipe/Getty Images)

Publicado em 30 de junho de 2025 às 05h01.

Em 5 de julho de 1991, no retiro da família Gates em Hood Canal, nos Estados Unidos, Bill Gates e Warren Buffett se conheceram por insistência da mãe do fundador da Microsoft. Nenhum dos dois estava animado para o encontro — Gates via Buffett apenas como um “corretor de ações” e Buffett não se interessava por tecnologia.

Gates, então com 35 anos, relutava em comparecer — achava que Buffett era apenas um especulador da bolsa. Buffett, aos 60, também não demonstrava interesse. “O que vamos fazer o dia todo com esse pessoal?”, teria dito a caminho do encontro.

Ambos estavam errados. No primeiro dia, eles tiveram uma conversa que durou 11 horas.

Gates e Buffett se afastaram do restante dos convidados e mergulharam em uma troca intensa sobre negócios, tecnologia, modelos mentais e o futuro da economia mundial. Enquanto Mary Gates (mãe de Bill Gates) e Meg Greenfield (jornalista do Washington Post que levou Buffett ao evento) socializavam com outros presentes, os dois bilionários se isolaram na sala principal da casa à beira do lago.

Gates ficou particularmente impressionado com como Buffett, mesmo vindo de um mundo fora da tecnologia, conseguia fazer perguntas que iam direto ao ponto. Um dos questionamentos foi: “Se você tivesse que reconstruir a IBM do zero, como ela seria?”. A profundidade da análise de Buffett mudou a visão que Gates tinha sobre o investidor.

Do outro lado, Buffett ficou encantado com a clareza de raciocínio e a objetividade de Gates ao explicar a lógica por trás do funcionamento da Microsoft e do mercado de software. “Ele tinha a habilidade rara de ensinar algo complicado com simplicidade”, relataria Buffett anos depois.

O encontro deu início a uma amizade que já ultrapassa três décadas, resultando em mentorias, encontros semanais, viagens, investimentos e, sobretudo, partidas de bridge. Mas, como todas amizades, a dos bilionários também não é diferente e parece ter "esfriado" nos últimos anos.

Amigos e filantropos

Em 2000, Gates criou a Fundação Bill & Melinda Gates, com o objetivo de ampliar o acesso à saúde, educação e tecnologia em escala global. Warren Buffett, já então uma referência em investimentos e filantropia, foi um dos grandes incentivadores da iniciativa.

Seis anos depois, o gesto de confiança veio em números: Buffett anunciou que doaria 99% de sua fortuna para causas sociais, sendo a fundação de Gates a principal beneficiária. Entre 2006 e 2023, suas contribuições somaram pelo menos US$ 39 bilhões, considerando a valorização das ações da Berkshire Hathaway repassadas ao longo dos anos.

O impacto da aliança foi além das doações. Em 2010, os dois anunciaram publicamente o Giving Pledge, um compromisso ético que convida bilionários a doarem a maior parte de suas fortunas em vida ou por testamento. Desde então, mais de 240 signatários aderiram à iniciativa, com promessas que já somam cerca de US$ 600 bilhões.

Durante a pandemia de covid-19, a parceria se intensificou. Gates e Buffett passaram a se reunir semanalmente por videochamada. As conversas, previstas para uma hora, ultrapassavam frequentemente o tempo estimado. Gates chegou a chamá-lo de seu “conselheiro científico”.

Mas o tom da relação mudou.

Em 2021, pouco após o anúncio do divórcio entre Bill e Melinda Gates, Buffett se retirou do conselho da fundação. Ele alegou que sua participação não era mais necessária, embora as doações continuassem.

A decisão marcaria o início de um distanciamento. Fontes próximas a Buffett revelaram incômodos com a burocratização da fundação e comentários de que Gates teria comportamento ríspido com colegas. A revelação de encontros entre Gates e Jeffrey Epstein também abalou a reputação do fundador da Microsoft — e, segundo a imprensa americana, teria impactado a confiança de Buffett.

Em 2023, aconteceu o que parece ser um distanciamento definitivo: Buffett anunciou que, após sua morte, nenhum centavo restante de sua fortuna irá para a fundação Gates. Seus três filhos, que ficaram encarregados da doação do patrimônio, concordaram em seguir esse caminho.

A decisão não revoga as doações em vida, que continuam — como ficou claro neste mês, quando Buffett doou cerca de US$ 6 bilhões em ações da Berkshire, sendo US$ 4,6 bilhões para a fundação de Gates.

Da intimidade ao protocolo

Gates costumava escrever com frequência sobre Buffett em seu blog. Em 2018, publicou fotos de ambos em uma loja de doces em Omaha; em 2019, contou sobre um churrasco informal. Em 2020, dedicou um post inteiro ao aniversário de 90 anos do amigo.

Em 2021 e 2022, os textos passaram a mencionar Buffett apenas em contextos institucionais. Em 2023, Gates não escreveu nenhuma linha sobre o colega. Em 2024, até junho, apenas uma citação — ligada à doação de ações.

Apesar disso, Buffett ainda mantém ações de generosidade. Em junho de 2025, anunciou a doação de US$ 6 bilhões em ações da Berkshire para cinco instituições — a maior fatia, US$ 4,6 bilhões, foi para a Fundação Gates.

Quando Buffett anunciou que deixaria o comando da Berkshire Hathaway, Gates publicou um tributo. “Minha vida mudou no dia em que nos conhecemos. Não só por ele ser um dos maiores investidores da história, mas por ser um amigo e mentor”, escreveu.

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