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Algoritmo de saúde deu preferência a pacientes brancos, diz pesquisa

Programa utilizado em hospitais dos Estados Unidos estava dando preferência para pacientes brancos em fila virtual de atendimento

Tecnologia na saúde: algoritmo estava priorizando pacientes brancos (Getty Images/Reprodução)

Tecnologia na saúde: algoritmo estava priorizando pacientes brancos (Getty Images/Reprodução)

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Maria Eduarda Cury

Publicado em 26 de outubro de 2019 às 08h24.

Última atualização em 26 de outubro de 2019 às 08h24.

São Paulo - Com a chegada da tecnologia nos processos médicos, o mundo se animou com as novas possibilidades de receberem tratamento médico. Mas, aparentemente, nem a tecnologia consegue estabelecer um sistema de saúde justo para toda uma população: uma nova pesquisa, realizada nos Estados Unidos, apontou que um serviço responsável pela saúde de milhões de americanos está favorecendo mais pacientes brancos do que pacientes negros. Utilizando mais de 50 mil registros hospitalares, pesquisadores da área da saúde analisaram que um algoritmo do sistema permite que pessoas brancas furem a fila virtual de atendimento.

O programa, que é utilizado por grandes hospitais dos Estados Unidos - que não foram identificados pelos pesquisadores -, faz uso de um algoritmo que diminui significativamente a importância dos problemas de saúde de pessoas negras, se comparados com pessoas brancas que estão com os mesmos problemas no mesmo nível. Por exemplo, se um paciente branco está com um pneumonia, e um paciente negro também contraiu a doença, o sistema vai computar que o paciente branco está com uma situação mais grave do que o negro, independentemente do que os registros médicos atestarem.

O software, destinado a servir como suporte extra para indivíduos e equipes que lidem com problemas de saúde complexos - como tratamentos de doenças crônicas -, acaba por reduzir a proporção de pacientes negros que são atendidos, em comparação aos números de pacientes brancos que são beneficiados pelo algoritmo. Os pesquisadores calcularam que, após o início do uso do programa, a porcentagem de indivíduos negros que recebiam atendimento médico passou demais de 50% para menos de 20% e, consequentemente, o índice de pacientes negros nas salas de espera aumentou.

Ziad Obermeyer, físico da Universidade da Califórnia que participou da pesquisa, comentou que a empresa responsável pelas configurações do algoritmo - que, assim como os hospitais que compraram o programa, não foi identificada - reconheceu o erro e está trabalhando para solucionar o problema. Obermeyer disse que, aproximadamente, cerca de 70 milhões de indivíduos estadunidenses utilizam o software para conseguirem atendimento médico.

Surpreendentemente, o que leva o algoritmo a privilegiar pacientes brancos não são perguntadas relacionadas com a raça dos indivíduos. Na verdade, ao coletar informações do paciente, o software utiliza a renda familiar ou individual para calcular custos futuros, prevendo quanto o paciente em questão irá custar para o programa de atendimento futuramente - ou seja, ele utiliza informações hipotéticas do futuro ao invés de analisar a situação de saúde atual do paciente. Como as pessoas que possuem uma renda menor precisam de maior assistência financeira do plano, essas pessoas são colocadas para o final da fila. E, nos Estados Unidos, os pacientes negros costumam ter menos condições financeiras do que pacientes brancos - o que é um efeito da desigualdade presente na sociedade.

Linda Goler Blount, presidente da organização Saúde das Mulheres Negras, afirma que um sistema como esse é preconceituoso por negar atendimento aos pacientes pobres - de maneira geral, ainda que os negros estejam em maior quantidade no estudo -, e considera que estão em situação de risco consideravelmente menor do que pacientes brancos ricos. "Não é porque as pessoas são negras, é por causa da experiência de ser negra. Se você analisasse pacientes brancos ou hispânicos pobres, tenho certeza de que veria padrões semelhantes", disse Blount em nota no estudo.

Segundo Obermeyer, a análise feita pela equipe levanta um problema que pode ser nacional, caso outros algoritmos que resultem em um tratamento desigual estejam sendo utilizados pelo território americano. Ainda de acordo com ele, é possível desenvolver um programa que identifique pacientes com doenças mais complexas sem que isso prejudique o atendimento de pacientes negros: os pesquisadores testaram uma versão do algoritmo que, ao combinar a questão dos custos futuros com o número de vezes em que uma doença crônica surgirá no período de um ano, é possível diminuir em mais de 80% a desigualdade de atendimento entre brancos e negros com a mesma condição.

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