Revista Exame

Cacau Show, a Zara do chocolate

Ao seguir passos semelhantes aos da gigante espanhola do varejo de moda, a Cacau Show se tornou a maior franquia de alimentos do país.

Costa, presidente da Cacau Show: meta de abrir a milésima loja da rede até o final de 2010

Costa, presidente da Cacau Show: meta de abrir a milésima loja da rede até o final de 2010

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Da Redação

Publicado em 25 de junho de 2012 às 09h37.

São Paulo - O discurso do paulistano Alexandre Costa, dono da rede de lojas de chocolate Cacau Show, sempre soou um tanto megalomaníaco. Aos 17 anos de idade, apenas com a experiência de quem via os pais venderem de porta em porta cremes da Avon e potes da Tupperware, decidiu seguir o exemplo.

Em 1988, às vésperas da Páscoa, ele peregrinou pelas ruas da zona norte de São Paulo, onde morava, para oferecer chocolates aos moradores. Bom de lábia, conseguiu 2 000 encomendas. Para dar conta dos pedidos, contratou uma senhora que o ajudou a preparar os ovos em apenas três dias.

Desde então, a disposição de Costa para estabelecer metas aparentemente impossíveis não parece ter arrefecido. Em 2001, após a abertura de sua primeira loja com a marca Cacau Show, propôs-se a criar a maior franquia de alimentos do Brasil.

Chegou lá em 2009, com 750 lojas que faturaram 272 milhões de reais. (A comparação considera número de lojas. Em vendas, a maior rede é o McDonald’s, com 575 unidades e faturamento de 3,3 bilhões de reais.) Agora, aos 39 anos, Alexandre Costa trabalha para abrir sua milésima loja em 2010. Para isso, terá de inaugurar 250 pontos de venda até dezembro - e bater seu recorde de 234 novas lojas num único ano, em 2008.

Para se tornar o maior empresário brasileiro do setor de chocolates, com o dobro do tamanho de sua maior concorrente direta - a octogenária Kopenhagen faturou 160 milhões de reais em 2009, com 256 lojas -, Costa traçou sua estratégia de crescimento praticamente sozinho.

Nunca contratou conselheiros nem consultores. Jamais teve sócios investidores - um amigo de infância, com 2,5% de participação na empresa, é seu único parceiro. Desistiu de se tornar um empreendedor apoiado pela Endeavor, ONG voltada para o estímulo a pequenas e médias empresas com potencial de expansão, quando soube que teria de ceder 2% do capital da Cacau Show em troca do apoio.

Costa, que abandonou o curso de administração na Faap no terceiro ano para se dedicar a seu negócio, considera-se um autodidata. Conversa informalmente em média uma vez a cada dois meses com três mentores - Lírio Parisotto, fundador da Videolar, Artur Grynbaum, presidente do Boticário, e Pedro Passos, um dos controladores da Natura.

Também busca referências em empresas estrangeiras. A mais recente delas é a gigante espanhola do varejo de moda Zara. “Quero ser a Zara do chocolate”, diz ele.


O que despertou sua atenção para a Zara em primeiro lugar foram as coincidências na origem das duas companhias. Criada em 1975 pelo empresário Amancio Ortega, a varejista espanhola só deixou de ser uma fabriqueta de roupões em La Coruña ao produzir cópias mais baratas de modelos sofisticados e vendê-las em lojas parecidas com as de redes famosas. Em três décadas, Ortega espalhou 1 500 lojas por 72 países da Europa, Ásia e Américas.

Do mesmo modo, a Cacau Show cresceu ao inaugurar um nicho de mercado até então inexplorado. Com lojas e embalagens semelhantes às de marcas de primeira linha, Costa aliou um certo ar de sofisticação a um preço mais baixo - em média um quarto do que cobra a Kopenhagen. “

A Cacau Show preencheu o vácuo entre a Kopenhagen e as marcas artesanais, que até são mais baratas, mas não têm apresentação atraente”, diz o consultor de franquias Marcelo Cherto.

No caso da Cacau Show, garantir o preço baixo é resultado da vigilância obsessiva de seu dono. Para lembrar a todos da importância de cortar custos, nas reuniões anuais de orçamento Costa mantém sobre a mesa um facão com cabo de madeira e lâmina enferrujada, presente de um cortador de cacau de Ilhéus.

O próprio time de executivos é um exemplo de seu esforço para manter a empresa com uma estrutura enxuta. Abaixo dele há apenas dois diretores, um de operações e outro comercial. Costa também cuida pessoalmente de cada negociação, desde a compra de máquinas até o acerto com agências de publicidade.

“Ele não deixa escapar nada”, diz Parisotto, dono da Videolar. No ano passado, recusouse a contratar uma construtora para gerenciar as obras de expansão da fábrica de Itapevi, em São Paulo, com 36 000 metros quadrados de área e capacidade de produção de 10 000 toneladas de chocolate por ano. Decidiu ele mesmo supervisionar a construção. “Economizamos 20% em uma obra orçada em 20 milhões de reais”, afirma.

Para manter as lojas abastecidas, a Cacau Show segue outro mandamento da Zara: a rapidez na entrega de produtos. A empresa espanhola garante a chegada de suas peças na Europa em 24 horas e em até 48 horas no restante do mundo. Desde 2005, a Cacau Show consegue atender a maioria dos franqueados em dois dias, enquanto os concorrentes levam até duas semanas.


Para tanto, opera um sistema em que os franqueados têm dia e hora a cada semana para fazer pedidos, despachados por meio de uma frota terceirizada de até 40 caminhões. O rigor não permite concessões - nem à própria mãe, Vilma.

Dona de uma franquia da rede, ela costumava perder a data dos pedidos. Em 2008, Costa pediu que se desfizesse da loja. “Minha mãe queria privilégios. Recomendei que passasse o negócio adiante e desde então ela se aposentou”, diz.

Inspirado na rede espanhola, Costa pretende renovar as prateleiras com maior frequência neste ano. Sua meta é lançar até dez novidades a cada 15 dias, mesmo tempo com que a Zara troca suas coleções. Até o ano passado, os lançamentos na Cacau Show se limitavam a datas comemorativas, com menos de dez coleções por ano - o mesmo modelo adotado pela concorrência.

Para atingir essa meta, ele pretende se valer de artifícios que vão de simples mudanças de embalagens a lançamentos de novos sabores de produtos. “Aumentar a renovação nas prateleiras faz com que o cliente volte à loja mais vezes”, afirma Costa.

A mudança é uma tentativa de manter a concorrência a distância. Em 2009, o grupo CRM, que controla a Kopenhagen, montou a Brasil Cacau, uma franquia para concorrer no mercado de Costa. Hoje a rede possui 50 lojas. “Queremos chegar a 500 até o final de 2011”, afirma Renata Vichi, vice-presidente do grupo CRM.

Para se destacar diante das concorrentes, a Cacau Show também vem ampliando os investimentos em marketing. Em 2006, fez o primeiro anúncio em televisão. Desde então, o orçamento da área (não revelado pela empresa) dobrou a cada ano. Em 2010, parte da publicidade vai ser espontânea. A escola de samba paulista Rosas de Ouro adotou como tema de seu desfile de 2010 o livro lançado por Costa em 2008, O Cacau é Show, sobre a história do cacau.

O empresário afirma que enviou no ano passado um exemplar da obra, resultado de uma viagem da Amazônia à Bahia, para diversas escolas de samba de São Paulo. À empresa de Costa caberá investir 25 000 reais no desfile, com a compra de 50 fantasias. Agora, ele avalia duas possibilidades para expandir a Cacau Show.

A primeira é comprar uma chocolateira na Bélgica. “Poderíamos criar franquias na Europa ou vender chocolate belga no Brasil”, diz ele. A outra opção é comprar uma fábrica de sorvetes no Brasil. Em parceria com a paulista Sottozero, a Cacau Show já vende sorvetes desde o ano passado.

“Antes de decidir, vou considerar as vendas deste verão”, diz ele. Costa garante que terá fôlego para seguir sozinho, sem investidores. Pode parecer um passo grande demais. Ou, para alguns, até uma certa dose de arrogância. Mas quem saiu da zona norte de São Paulo com seus ovos de Páscoa caseiros para construir a maior rede de lojas de chocolates do mundo acha que ainda pode fazer mais. Sozinho.

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