Revista Exame

Vida longa ao ministro Guido Mantega

A melhor notícia da insossa troca ministerial em gestação é a ausência do Ministério da Fazenda na boataria de sempre — mais uma prova de que, a partir do Plano Real, o Brasil mudou definitivamente de patamar

Guido Mantega: nos últimos 18 anos, ele é o terceiro ministro da Fazenda, um feito revolucionário no Brasil (Lailson Santos/Veja)

Guido Mantega: nos últimos 18 anos, ele é o terceiro ministro da Fazenda, um feito revolucionário no Brasil (Lailson Santos/Veja)

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Da Redação

Publicado em 1 de março de 2012 às 09h12.

São Paulo - O aspecto provavelmente mais positivo da discreta, insossa e desambiciosa troca de ministros que vai se processando atualmente em Brasília não é a chegada de caras novas, com grandes ideias para fazer o governo funcionar melhor, porque até agora não se viram, e nem se verão, caras realmente novas ou ideias realmente grandes.

É a permanência, na equipe da presidente Dilma Rousseff, do ministro da Fazenda, Guido Mantega. À primeira vista pode não parecer muita coisa — o que o ministro teria feito assim de tão notável, durante estes seis anos em que vem ocupando o cargo, para aplaudir sua confirmação? 

Nada de extraordinário, realmente, mas, quando se pensa um pouco melhor na história recente da economia brasileira, a manutenção de Mantega como ministro é uma excelente notícia. É só fazer as contas.

Pedro Malan, ministro da Fazenda ao longo de todo o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, ficou no cargo durante oito anos seguidos, de janeiro de 1995 a dezembro de 2002 — um recorde nacional de durabilidade no posto.

De lá para cá, só houve mais dois ministros da Fazenda: o primeiro deles foi Antonio Palocci, que ficou até ser demitido em 27 de março de 2006, e o outro é Mantega, que o substituiu e permanece no cargo até hoje.

Nos últimos 18 anos, portanto, o Brasil teve apenas três ministros da Fazenda — uma demonstração de estabilidade que encontra poucos paralelos em qualquer país do mundo moderno e que, para os usos e costumes do Brasil, chega a ser um feito praticamente revolucionário.

Guido Mantega, nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff, vem segurando essa tradição recente, e que ficará tanto melhor quanto mais tempo durar, de não ficar mexendo toda hora no ministro da Fazenda — seja porque bateu uma crise e o governo entrou em pânico, seja por conveniências do jogo político.

Sua permanência no ministério, sempre dada como certa durante toda as recentes conversas de reforma, comprova, pelo menos até agora, que não há sinais de alteração nesse procedimento — e a economia brasileira só tem de ficar aliviada com isso.


Pela marcha normal da carruagem, Mantega deve continuar até o final do atual governo, em dezembro de 2014 — e, se isso se confirmar, o Brasil terá conseguido atravessar 21 anos inteiros com apenas três ministros da Fazenda. Melhor não é possível. Basta lembrar um pouco como eram as coisas no Brasil de não muito tempo atrás.

O Ministério da Fazenda, então, era um hotel de alta rotatividade. Os ministros viviam em estado de desmoralização permanente — não pode haver, ao mesmo tempo, ministro com moral e com inflação.

Durante anos a fio, tanto nos governos militares como depois deles, o Ministério da Fazenda foi utilizado como terreiro de macumba econômica, com seguidas tentativas de resolver problemas através de passes de mágica, truques e experimentos exóticos. Funcionários do FMI e assemelhados eram frequentadores habituais do prédio — tinham até sala por ali.

Quem terá esquecido dos “planos” econômicos que se engavetavam uns nos outros, dos tabelamentos, ágios e tablitas, dos “fiscais do Sarney” e tantas outras operetas de circo que os governos apresentavam ao público como ações de gestão da economia? Num período de 30 anos, entre 1964 e 1994, o Brasil teve seis moedas diferentes.

A certa altura, no auge da anarquia, o governo confiscou todo o dinheiro da população e o manteve congelado — acreditando, talvez, que se não houvesse dinheiro na praça não haveria inflação. É duro de acreditar hoje, mas Zélia Cardoso de Mello já foi ministra da Fazenda.

Isso tudo, felizmente, faz parte de um mundo morto. Ele se extingui com o plano de estabilização que, a partir do governo Itamar Franco, em 1994, e em seguida com Fernando Henrique, derrotou a inflação, criou o real e vem sendo mantido até hoje.

Saímos do abismo — e a prova disso é que o Ministério da Fazenda é onde menos se troca de chefe. Oremos, com fé, pelo ministro Mantega.

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