Revista Exame

Vai um reforço com o grupo Multi aí?

Aulas de idiomas, cursos profissionalizantes e, agora, reforço escolar

Martins, do Multi: "Aprendi que há dois caminhos para uma empresa: ser preparada para ser vendida ou para comprar outras. Fiquei com a segunda opção" (Germano Lüders/EXAME.com)

Martins, do Multi: "Aprendi que há dois caminhos para uma empresa: ser preparada para ser vendida ou para comprar outras. Fiquei com a segunda opção" (Germano Lüders/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h39.

Nos últimos dez meses, o até então pouco conhecido grupo paulista Multi, uma empresa familiar dona de redes de idiomas como a Wizard e a Skill, avançou sobre concorrentes com um apetite comparável ao dos mais agressivos banqueiros de investimento. Foram 150 milhões de reais colocados na compra de quatro novas empresas - uma de cursos de inglês e três de ensino profissional (entre elas a Microlins, a maior do setor, e a SOS, um nome tradicional no ensino de informática). Essa sequência impressionante de aquisições fez com que o Multi, que começou como uma pequena rede de escolas de inglês no interior de São Paulo no final dos anos 80, se transformasse no maior grupo de franquias do Brasil em número de unidades, à frente de redes como O Boticário e McDonald's. Juntas, suas oito marcas, ligadas ao emergente mercado de ensino, possuem hoje 3 100 unidades e reúnem mais de 1 milhão de alunos. Em 2010, as receitas das escolas do Multi devem chegar a 2 bilhões de reais, crescimento de quase 100% em relação ao ano passado. "Aprendi que há dois caminhos para uma empresa: ser preparada para ser vendida ou para comprar outras. Fiquei com a segunda opção", diz Carlos Wizard Martins, de 53 anos, fundador e presidente do Multi.

Mal integrou as redes compradas - as últimas duas aquisições aconteceram em agosto - , o Multi prepara-se para abrir uma nova frente de negócios. Desta vez, sem investir quase nada. A partir de janeiro, pelo menos 500 unidades franqueadas da rede oferecerão também aulas de matemática e de português, num projeto batizado de Multi Educação. (A decisão de investir nesse mercado surgiu há dois anos, quando uma pesquisa feita entre seus franqueados mostrou que 20% dos alunos dos cursos de idiomas também frequentavam aulas de reforço escolar.) Com foco em crianças de 5 a 10 anos de idade, a proposta é que as aulas sejam um complemento ao ensino formal. A inspiração vem da japonesa Kumon, instalada no Brasil desde 1977 - com 1 700 unidades e 100 000 alunos, a Kumon é a única grande empresa a atuar no mercado de reforço escolar no país, com faturamento estimado em 200 milhões de reais.

O método usado pela Kumon baseiase num sistema de autoaprendizagem, em que as crianças repetem exaustivamente exercícios até que dominem o conteúdo. Como os alunos estudam sozinhos, não há necessidade de manter professores formados para acompanhá- los. Basta ter a sala de aula. Para os atuais franqueados do Multi, que seguirão basicamente o modelo da rede japonesa, o investimento no novo negócio será praticamente nulo. Para o grupo de Martins, a nova operação é uma chance de aumentar as vendas de livros didáticos, que em 2010 serão responsáveis por uma receita de quase 140 milhões de reais. Com as aulas de complemento escolar, o Multi deve aumentar seu faturamento em 20% em 2011 e receber 100 000 novos alunos nos primeiros meses de operação. É o mesmo volume obtido, por exemplo, com a compra da rede SOS Computadores em janeiro - negócio estimado em 30 milhões de reais. "Eles encontraram uma forma engenhosa de multiplicar as receitas", diz o consultor Marcelo Cherto, especializado em franquias. "Além de ganhar dinheiro com as próprias franquias, o Multi ganha com a comercialização do material didático, algo muito parecido com o que fazem redes como a Positivo, que vende apostilas de seus sistemas de ensino."


A ideia de ganhar dinheiro com a venda de material didático está no embrião da empresa, fundada em 1987. Recém-transferido dos Estados Unidos, onde se formou em análise de sistemas, o curitibano Carlos Martins passou a dar aulas de inglês informalmente a pedido de amigos - seu emprego "oficial" era de analista de sistemas da filial de Campinas da extinta fabricante de papel e celulose Champion, comprada anos depois pela International Paper. A procura foi tão grande que Martins decidiu convocar sua mulher, Vânia, para ajudar nas aulas. Um ano depois, o dinheiro que o casal ganhava com os cursos já superava o salário de Martins na empresa. Foi então que ele decidiu criar a Wizard. (O nome da nova empresa foi inspirado em O Mágico de Oz, ou The Wizard of Oz, em inglês. Segundo Martins, o clássico de Lyman Frank Baum tornou-se um de seus livros preferidos graças ao enredo de sonhos e de superação, ingredientes indispensáveis a quem quer ser empresário.) De início, quatro unidades da Wizard foram abertas, todas no interior de São Paulo. O acordo com os franqueados não previa nenhum pagamento de taxa, apenas a obrigatoriedade de comprar os livros e as apostilas desenvolvidos por Martins - um acordo que, no caso dos cursos de idiomas, vigora até hoje. Um ano depois, com o crescimento da rede, Carlos Martins incorporou o Wizard ao próprio nome. Até hoje é ele quem supervisiona e corrige cada um dos livros didáticos produzidos pelo grupo - em média, são 60 títulos por ano. "Não abro mão de estar à frente dos produtos e em contato com os meus franqueados", diz.

Há três anos, Martins divide o comando do Multi com dois de seus seis filhos, os gêmeos Lincoln e Charles, de 31 anos. Foram eles que sugeriram ao pai iniciar a expansão do grupo por meio de aquisições ao retornarem dos Estados Unidos em 2006, onde Lincoln cursou economia e Charles ciências políticas. "Depois do que vimos lá fora, percebemos que o negócio da família podia ser algo muito maior", diz Lincoln Martins, principal executivo do Multi. Desde então, oito empresas concorrentes foram compradas. Charles e Lincoln se dividem na tarefa de avaliar novas oportunidades de compra, tocar a operação e coordenar a expansão internacional do grupo - uma iniciativa que vem ganhando força nos últimos anos. Após a fracassada tentativa de abrir por conta própria uma grande escola de idiomas em Orlando, em 2000, que resultou num prejuízo de 1 milhão de dólares, o Multi optou por outro modelo para crescer lá fora: associações com parceiros locais para abrir pequenas unidades, com não mais de 100 alunos. Hoje são 50 escolas, 25 delas nos Estados Unidos e as demais espalhadas por oito países, como México, Japão e China. Em 2011, a empresa planeja abrir outras 30 unidades no exterior. A expansão do Multi dentro e fora do país e o crescimento do mercado de educação no Brasil têm feito com que uma série de gestores de fundos de private equity e banqueiros de investimento batam à sua porta. A estimativa é que o mercado de franquias de escolas de idiomas e de cursos profissionalizantes movimente cerca de 8 bilhões de reais no Brasil. Segundo Martins, todos os meses ele recebe propostas para vender uma fatia do Multi ou fazer seu IPO. (Em 2007, o grupo chegou a ser assessorado pelo banco UBS e Merrill Lynch para fazer a abertura de capital, mas desistiu por causa da crise mundial.) "Até agora, temos conseguido crescer sozinhos", diz Martins. Para ele, enquanto esse ritmo de expansão for mantido, os candidatos a sócios terão de esperar.

 

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