Vai pesar: o consumidor que tem menos dinheiro é o que mais vai sentir quando o aumento da tarifa de energia chegar (Tânia Rêgo/ABr)
Da Redação
Publicado em 13 de agosto de 2014 às 17h27.
São Paulo - A aritmética elementar ensina que a divisão por igual de determinada quantia pode muito bem, conforme o jeito da divisão e a quantia, resultar em desigualdade. É a velha história da conta do almoço. Dez pessoas sentam-se à mesa. Um é rico, os demais são remediados ou pobres.
Na hora de pagar, a despesa é dividida por igual entre os dez. Leva financeiramente na cabeça, é claro, quem tem menos dinheiro no bolso — o que está com a vida ganha se dá bem, e o pobre coitado se dá mal.
O interessante é que esse modesto conhecimento, que está à disposição dos governos há milênios, continua sendo ignorado pelos mais notáveis gerentes de nossa economia — por ser muito lógico, é considerado pouco sério. Está acontecendo justamente isso, no momento, com a história das tarifas de energia elétrica.
Normalmente, seria mais um caso em que boas intenções levam a um mau resultado: o governo decidiu segurar o reajuste das contas de luz ao longo deste ano, impedindo as distribuidoras de compensar os aumentos de custo provocados pelo encarecimento da energia, com o meritório propósito de dar combate à inflação renascente.
Consequência: os consumidores vão receber uma paulada lá na frente, pois adiar o pagamento da despesa, infelizmente, não fará a despesa sumir. No presente episódio, temos uma variante para pior desse teorema — é a má intenção que está levando ao mau resultado.
A manipulação de preços ora em andamento, de fato, se deve a óbvios motivos eleitorais; o governo não quer o aumento inevitável das contas porque estamos em ano eleitoral, e a presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição, tem medo de perder votos por causa de dissabores tarifários. A conta final a pagar, de um jeito ou de outro, não muda — e, quanto mais demorar o pagamento, mais cara ela fica.
Toda essa massagem nos números, para aliviar agora a dor que virá quando o massagista encerrar a sessão, é feita — olhem só que novidade — com dinheiro público, que por definição pertence a todos por igual. Não parece muito útil ficar discutindo em detalhes precisos os números da conta total a pagar.
Há divergências sobre os valores e sua composição, mas, sejam lá quais forem, é 100% certo que no fim do dia o dinheiro sairá todo do mesmo lugar: o bolso dos brasileiros em geral.
Não é um bom sinal que o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Paulo Caffarelli, ao ser indagado se o Tesouro Nacional fará novos aportes de lenha para a fogueira, tenha respondido: “Eu não sei”. A verdade, de qualquer jeito, é que ninguém estará recebendo um presente.
Parte dos recursos envolvidos vem das concessionárias, que vão repassar aos consumidores, depois das eleições, a porção dos custos que estão absorvendo agora. Outra parte vem dos bancos, sobretudo públicos, que financiam as empresas fornecedoras de energia. Uma terceira vem diretamente do Tesouro.
O resumo da ópera é que tudo o que houver para pagar será pago com recursos que pertencem ao conjunto da população deste país.
Eis aí mais uma aula magna de inépcia por parte da presente administração. A escassez de energia, em si, é fruto da ruinosa política energética que o governo federal impôs ao Brasil nos últimos anos — agravada, sem dúvida, pela infeliz circunstância de que a presidente Dilma Rousseff convenceu a si própria, em algum momento do passado, que é fera em matéria de eletricidade.
Não é: seu entendimento sobre o assunto varia entre o confuso e o inexistente, e o resultado prático está aí. Agora junta-se ao erro original, que levou à escassez, o erro da solução proposta para resolvê-lo, que vai levar à punição dos consumidores.
Para completar a obra, essa punição vai doer de forma desigual: na situação de estímulo ao consumo criada por tarifas irreais, quem mais consumiu, e tem dinheiro de sobra para isso, é quem vai sofrer menos na hora de acertar as contas que estão sendo pagas hoje com dinheiro público; quem tem menos recursos é quem vai sofrer mais.
Distribuição de renda é isso aí.