Revista Exame

Um guia para a alta da bolsa

Alta acumulada do Ibovespa é de 170% desde início de 2016. Ainda há muitas oportunidades — mas recomendação é não pôr mais de 30% do patrimônio em ações

Shopping da Multiplan em São Paulo (Alberto Rocha/Folhapress)

Shopping da Multiplan em São Paulo (Alberto Rocha/Folhapress)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 18 de julho de 2019 às 05h30.

Última atualização em 18 de julho de 2019 às 11h26.

bolsa brasileira nunca recebeu tantos pequenos investidores como nos últimos seis meses. Foram 1.900 entrantes por dia, ou 58.000 por mês, engordando o bolo que hoje soma 1,1 milhão de pessoas físicas. Elas detêm 18,3% do total investido na B3. O movimento vem sendo impulsionado por um pacote de expectativas: a confiança na retomada da economia e na aprovação da reforma da Previdência, abrindo espaço para o ciclo de queda dos juros prosseguir.

Mas a tecnologia também teve seu papel. Nunca foi tão fácil fazer uma ordem de compra de ações por meio de aplicativos e sites de corretoras. Eles querem fisgar principalmente o investidor mais jovem, que já é maioria entre os acionistas individuais da bolsa.

O público dos 26 aos 45 anos soma mais de 600.000 CPFs na B3, embora o grosso do volume investido, de 43%, ainda esteja em poder dos mais velhos, acima dos 66 anos.

Essa massa crescente ajudou a impulsionar o Ibovespa para acima dos 100.000 pontos. Ainda é hora de entrar? Onde estão as melhores oportunidades? E fora da bolsa, o que vale a pena? EXAME ouviu especialistas e dá algumas respostas a seguir.

1 Ainda é hora de entrar na bolsa?

Mesmo com o otimismo já embutido no preço das ações, analistas acreditam que o bull market — a tendência de valorização do mercado — deve continuar, ainda que com percalços no caminho. “A aprovação da reforma da Previdência já está no preço da bolsa, mas ainda tem muita coisa positiva por vir, como as privatizações e a reforma tributária”, diz o professor de economia do Insper João Luiz Mascolo.

O segredo é ter visão de longo prazo e resistir aos momentos de baixa, que são dados como certos (basta dizer que o Ibovespa caiu nos quatro pregões posteriores à aprovação da Previdência em primeiro turno na Câmara). Um erro comum é ignorar os movimentos cíclicos de longa duração. Desde o início de 2016, a bolsa subiu 170%, e deve continuar valorizando. A projeção menos otimista colhida por EXAME, da XP Investimentos, prevê o Ibovespa em 115.000 pontos no fim de 2019; a mais positiva, da Ativa Investimentos, prevê 125.000 no final do ano.

Seria o suficiente para o Ibovespa fechar 2019 em alta de quase 30%. A indicação para o investidor mais conservador é alocar de 5% a 10% em ações e o restante em renda fixa; para os mais ousados, até 30% em ações. Para quem já está familiarizado com esse mercado, a recomendação é rebalancear a carteira. “Deve vender alguns papéis para embolsar um dinheiro e aplicar em algum investimento de renda fixa com liquidez diária, de preferência”, diz Thiago Salomão, analista da Rico Investimentos.

 

2 Quais setores devem valorizar no cenário pós-reforma?

Empresas ligadas ao consumo doméstico são apontadas como as primeiras da fila a sentir as benesses de um cenário pós-reforma. Ações de varejo, que já vinham subindo na esteira de expectativas positivas para a economia, são vistas como as de maior potencial de valorização. Os grandes varejistas devem pegar carona nesse movimento, a exemplo do Magazine Luiza e da Via Varejo.

Mesmo que seus papéis tenham avançado substancialmente no ano, o mercado ainda enxerga potencial de alta. O setor de alimentos é outro que tende a ser favorecido, beneficiando papéis de produtoras de carnes, como JBS e BRF, assim como as operadoras de shopping centers — as ações das empresas BR Malls, Multiplan e Iguatemi guardam boas perspectivas no segmento.

Papéis de companhias de aluguel de carros também podem trazer bons retornos, com destaque para Unidas, Movida e Localiza. Empresas do setor imobiliário e da construção civil, outra área muito dependente de crédito, também devem ganhar com a melhora no cenário macroeconômico.

Ações do setor financeiro são citadas pelos analistas como promissoras nesse cenário, com destaque para Itaú Unibanco e Bradesco, as mais relevantes do Ibovespa. Se por um lado os juros baixos achatam o spread, por outro ampliam as carteiras de crédito e reduzem o custo de captação. “Nem com os juros em queda o setor bancário perde dinheiro”, diz Luiz Mariano De Rosa, sócio da Improve Investimentos.

3 Onde estão as cascas de banana na bolsa e no contexto de mercado?

Embora a chance de conclusão da reforma da Previdência seja promissora após a aprovação em primeiro turno na Câmara, existe o risco de tropeços no caminho. Analistas não descartam a possibilidade de uma nova crise política ou até mesmo algo como um “Joesley Day”.

A divulgação do áudio da conversa entre o dono da JBS e o presidente Michel Temer derrubou os mercados em maio de 2017 e enterrou a chance de aprovação da reforma das aposentadorias. Outro sinal de alerta para os mercados é a tensão comercial entre os Estados Unidos e a China e os receios de uma recessão americana.

“O cenário externo parece o maior risco atual”, diz Dan Kawa, executivo-chefe de investimentos da gestora de patrimônio TAG Investimentos. Setores cujos negócios dependem da ampliação de investimentos e projetos de infraestrutura devem demorar um pouco mais para reagir.

Nesse grupo estão ações dos setores elétrico, de logística, concessões e saneamento, condicionados à atração de capital privado e estrangeiro, que deve vir com mais força se o país recuperar o grau de investimento. “Precisamos do selo de bom pagador de volta para o estrangeiro retornar”, diz Luiz Mariano De Rosa, sócio da Improve Investimentos.

O risco, nesse caso, é as privatizações não saírem e o investidor ficar exposto. As small caps (empresas pouco negociadas na bolsa) são apontadas como de grande potencial para o segundo semestre e devem trazer bons retornos para os investidores de coração forte. Mas, por sua baixa liquidez, podem ter grandes oscilações diárias.

Estados Unidos versus China: a tensão global é um ponto de atenção para o investidor | Kevin Lamarque/Reuters

4 mesmo com a queda dos juros, ainda dá para ganhar, na bolsa ou fora dela, sem arriscar?

O cenário de juros historicamente baixos exigirá mais estômago do investidor para lidar com os riscos. Os retornos da renda fixa devem ficar cada vez menores nesse movimento. Um título público atrelado à Selic, taxa de juro básica, que rende 4,9% em 12 meses com o atual juro de 6,5%, passaria a render 4,1% com a Selic em 5,5%, nível projetado para o fim de 2019 na última pesquisa realizada com analistas.

As debêntures (títulos de dívida emitidos por empresas) despontam como uma opção fora da bolsa e com risco mais moderado. Os ganhos com esses papéis ficam acima dos títulos públicos indexados à Selic, pelo fato de as empresas oferecerem mais risco que os governos. A bolsa americana é mais uma alternativa para o pequeno investidor.

O índice S&P 500, que reúne 500 ativos cotados na bolsa de Nova York, subiu mais de 17% no primeiro semestre, batendo seguidos recordes, a despeito das tensões comerciais entre os governos de Estados Unidos e China e do risco crescente de uma recessão americana.

Há ainda fundos no Brasil que espelham os índices de Nova York sem a necessidade de o investidor enviar dinheiro para fora ou fazer conversão de moedas — podem ser uma boa aposta. Outra opção dentro da renda variável é a diversificação. Por exemplo, com ETFs (do inglês Exchange Traded Funds), fundos que replicam índices da bolsa.

Na bolsa, uma aposta mais segura são as empresas que dividem os lucros com o acionista. Entre as melhores pagadoras de dividendos em junho estiveram BR Distribuidora, Itaúsa, BB Seguridade, Telefônica e Taesa. “Essas empresas têm um negócio mais maduro e ficam mais atraentes pelo perfil mais defensivo”, diz Roberto Chagas, responsável pela área de renda variável da gestora Trafalgar Investimentos. Opções não faltam. 

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