Repórter de Economia e Mundo
Publicado em 20 de abril de 2023 às 06h00.
Última atualização em 20 de abril de 2023 às 11h51.
Uma visita da presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, ao presidente da Câmara dos EUA, Kevin McCarthy, ligou o alerta global neste mês. A China respondeu com mais exercícios militares, meses depois de a ex-mandatária da Câmara Nancy Pelosi ter ido ela própria a Taiwan.
Ava Shen, da consultoria de risco Eurasia, falou à EXAME sobre as tensões — que ocorreram ainda em meio à viagem do presidente Lula à China. Veja os principais trechos, editados para concisão.
O que os movimentos de ambos os lados em Taiwan significam? Há uma escalada?
A reação militar da China mostra que Pequim quer impedir futuras reuniões de alto nível entre Estados Unidos e Taiwan. Mas a resposta foi abaixo do que no pós-viagem de Pelosi. Não representa uma escalada, a reação já era esperada. Apesar disso, elevou-se o nível das atividades no Estreito de Taiwan, e missões militares aéreas atingiram novos recordes.
Taiwan e China estão nesse conflito desde 1949. Quando as tensões voltaram a aumentar?
Sobretudo desde a eleição da presidente Tsai Ing-wen, em 2016. Logo no início, ela passou a rejeitar o conceito de “China única”, e a China aumentou a pressão militar e diplomática. Pequim historicamente não gosta de seu partido, o Partido Democrático Progressista (DPP), que percebe como “separatista”.
Além disso, as relações Estados Unidos-China se deterioram desde 2016, e a China tem sido perturbada pelo aprofundamento dos laços Estados Unidos-Taiwan, embora o governo americano ainda respeite a política de “China única”. Pequim recorre a demonstrações de força para dissuadir (sem sucesso) essa aproximação.
Um aspecto no radar é que Taiwan e Estados Unidos realizarão suas eleições presidenciais em 2024: um presidente do DPP em Taiwan e um republicano nos Estados Unidos aumentariam ainda mais as tensões.
Quando a guerra na Ucrânia começou, analistas apontaram que Taiwan poderia ser a próxima. Há um risco de fato?
A preocupação aumentou no Ocidente, mas uma invasão chinesa a Taiwan é muito improvável nos próximos anos. A China ainda prefere não recorrer a uma invasão, que cada vez mais soa cara e imprevisível, dado o que ocorre na Ucrânia.
Os militares chineses são inexperientes e ainda não têm as capacidades necessárias para ocupar Taiwan. Sanções contra a Rússia também alertaram Pequim sobre os riscos para sua economia.
Que implicações econômicas essas tensões podem gerar no resto do mundo?
Dado que a probabilidade atual de uma invasão é baixa, ainda não ocorreram interrupções significativas. No entanto, se as atividades militares chinesas se intensificarem ainda mais, com exercícios maiores e mais frequentes e a guarda costeira chinesa realizando inspeções em navios no Estreito de Taiwan, as empresas provavelmente enfrentarão graus de atrasos.
Esta entrevista está sendo feita com o presidente brasileiro Lula em viagem à China. Qual papel a senhora enxerga para esses países do chamado “Sul Global” na atual arena geopolítica?
Lula e Xi Jinping [presidente chinês] apoiam uma ordem mundial multipolar, na qual Brasil e China podem aumentar sua influência diplomática. Os dois estão investidos no Brics, que se molda para ser um fórum de desenvolvimento alternativo. Durante a visita de Lula, já foram assinados inúmeros acordos, como em tecnologia e infraestrutura. Os dois países tendem a tentar coordenar sua política externa e engajamento com o “Sul Global” antes da cúpula do Brics na África do Sul, em agosto.
No entanto, Lula e Xi só estão buscando uma cooperação pragmática. Lula ainda quer manter boas relações com os Estados Unidos e a Europa e, portanto, é improvável que embarque em todas as iniciativas chinesas.
Esta reportagem faz parte da seção Visão Global, disponível na edição 1.250 da EXAME. Leia também as outras notas da seção: