Revista Exame

Ser malvado é um bom negócio para a Adidas

Na maior campanha de marketing de sua história, a Adidas abandona a postura de boazinha e parte para o ataque. Assim quer superar a Nike até 2015

O jogador argentino Lionel Messi: uma das estrelas da campanha da Adidas, o craque tem baixíssima rejeição entre os consumidores brasileiros (Divulgação)

O jogador argentino Lionel Messi: uma das estrelas da campanha da Adidas, o craque tem baixíssima rejeição entre os consumidores brasileiros (Divulgação)

DR

Da Redação

Publicado em 28 de abril de 2011 às 13h09.

O mundo dos fabricantes de artigos esportivos é basicamente dividido em dois hemisférios. Em um deles está a americana Nike, líder mundial, com 19 bilhões de dólares em vendas. Suas campanhas, normalmente embaladas por músicas que remetem a energia, mostram todas as nuances do dia a dia do esporte — não apenas vitórias edificantes mas também atletas que se machucam ou explodem de raiva diante do fracasso.

Do outro lado fica a alemã Adidas, segunda maior do setor, com faturamento de 16 bilhões de dólares. Ao contrário da Nike, os alemães optaram por tratar o esporte em suas campanhas de marketing de forma mais, digamos, civilizada — o tom sempre foi o da “superação”. Pois quem assistiu à estreia do último filme da Adidas, lançado simultaneamente em 120 países no dia 16 de março, notou que essa oposição de estilos, até então muito clara, ficou um bocado turva.

O comercial de 2 minutos traz uma série de cenas frenéticas com mascotes de times de futebol se agredindo, lutadores de boxe sangrando e atletas soltando gritos de guerra ancestrais. Tudo isso misturado a cenas de ensaios da cantora Katy Perry e shows do rapper BoB em inferninhos (ambos são patrocinados pela Adidas).

Pela primeira vez em 64 anos de história, as três linhas de negócios da companhia — originals, performance e style — juntaram-se numa mesma campanha, batizada All in (ou “Todos nessa”, numa tradução livre).

A agressividade nas telas foi vista como um sinal daquilo que a Adidas transformou em seu maior objetivo de negócio: tornar-se a maior empresa de material esportivo do mundo até 2015. (A meta, aliás, foi escrita em letras garrafais nas paredes dos escritórios de todas as subsidiárias da companhia.)


“Nunca tivemos uma estratégia mundial dedicada a um único objetivo”, diz Rodrigo Messias, diretor de marketing da Adidas no Brasil. “Agora temos. E, para atingi-lo, teremos de crescer cerca de 40%.”

O consumidor é quem manda

A ideia de unir os diferentes segmentos de negócios numa única campanha não partiu dos executivos da Adidas — mas de seus consumidores. Uma pesquisa mundial realizada ao longo de 2009 com mais de 1 000 pessoas mostrou que, para o cliente final, não fazia a menor diferença se determinado produto pertencia a uma ou outra linha.

Para ele, bastava saber que se tratava da Adidas. “Percebemos que os consumidores se moviam naturalmente entre um segmento e outro. Era comum que um jovem usasse produtos da Adidas para praticar esportes e sair à noite”, diz Lu­kas Derksen, vice-presidente e sócio da agência canadense Sid Lee, responsável pela campanha.

Em outras palavras, a tal “departamentalização” só fazia sentido dentro da cabeça dos executivos da empresa. Com base nos depoimentos, a equipe da agência percorreu 12 cidades ao redor do mundo para captar imagens de jovens praticantes de esporte que pudessem exibir a marca em todas as suas dimensões — as cenas despojadas de garotos se divertindo com skates, por exemplo, foram gravadas em São Paulo e no Rio de Janeiro.

O passo seguinte foi testar a aceitação de astros patrocinados pela marca em todos os principais mercados. No Brasil, a preocupação recaiu sobre o craque argentino de futebol Lionel Messi. “Surpreendentemente, os brasileiros são simpáticos ao jogador”, diz Márcio Oliveira, vice-presidente de atendimento e operações da Lew’Lara/TBWA, agência de publicidade da Adidas no Brasil.


Apesar de se tratar de uma campanha mundial, não há dúvidas de que a maior intenção da Adidas é atingir o público americano — o rapper BoB e a cantora Katy Perry fazem muito mais sucesso nos Estados Unidos do que fora dele, por exemplo. Maior mercado esportivo do mundo, movimentando 33 bilhões de dólares por ano, o país é um reduto natural da Nike, que conta com 36% de participação de mercado (a fatia da Adidas, segunda colocada, é de 21%).

Em 2006, numa tentativa de conquistar o público americano, a Adidas substituiu os tênis dos jogadores de basquete da NBA com a marca Reebok, adquirida no ano anterior, por calçados de sua marca. Os resultados foram pífios.

“Em qualquer pesquisa de marca, a Nike sempre aparece como a mais lembrada”, diz Amir Somoggi, diretor da área de esportes da consultoria BDO. A recente mudança de postura da Adidas já conseguiu, pelo menos, uma coisa: gerou um tremendo “buzz”.

Estima-se que, entre mídia tradicional e internet, mais de 100 milhões de pessoas tenham tido acesso à campanha. Mas nem todo mundo gostou. Tão logo o novo comercial foi ao ar, uma série de comentários negativos começou a pipocar nas redes sociais.

Muitos consideraram o filme violento demais para o público juvenil — a cena com os lutadores de boxe sangrando foi uma das mais criticadas. “Mesmo na matriz houve quem fosse contra a campanha justamente por temer possíveis opiniões desfavoráveis, mas era um risco que precisávamos correr”, diz um executivo da empresa no Brasil que pediu para não ter seu nome revelado.

A campanha na TV é o carro-chefe no esforço de marketing da Adidas, mas não o único. A empresa vem trabalhando para atingir um público mais jovem, na faixa dos 14 aos 18 anos de idade. (Tradicionalmente, seu cliente mais fiel está na faixa dos 30 anos.)

Para isso, remodelou sua linha de produtos, introduzindo cores mais berrantes em roupas e tênis, e elevou a produção nacional de alguns itens, de modo a deixá-los mais baratos. Além disso, inaugurou sua primeira loja exclusiva para mulheres em fevereiro, em Seul, na Coreia do Sul. Afinal, para vencer a Nike também é preciso não perder a ternura jamais.

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